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Energia do povo

Quando o Banco Mundial instituiu uma revisão em sua política de apoio a projetos de combustíveis fósseis, o alerta do estudo de três anos foi direto: parem de financiar projetos de petróleo, gás natural, carvão e outros na área de mineração até 2008 e direcionem os investimentos para o setor de energia renovável.

Apesar disto, o maior financiador dos programas de combate à pobreza no mundo em desenvolvimento teima em ignorar seu próprio relatório de 2003. Um estudo mais recente do Institute for Policy Studies (IPS), de Washington, acusou os programas de energia do banco de “falharam completamente no controle da mudança climática e alívio aos mais pobres. Emil Salim, ex-ministro de Meio Ambiente da Indonésia e chefe do grupo de revisão do Banco Mundial, argumenta que os países que confiam muito nas chamadas “indústrias extrativas tendem a ter os níveis mais altos de pobreza, doenças e mortalidade infantis, guerras civis, corrupção e totalitarismo do que aqueles com economias mais diversificadas.

Salim, que já comandou a maior empresa de carvão do seu país, recentemente escreveu no Financial Times: “O banco é uma instituição com apoio público cujo objetivo é combater a pobreza. Além dos setores de petróleo, gás e mineração não terem ajudado os mais pobres nos países em desenvolvimento, eles muitas vezes tornaram a situação ainda pior. Entretanto, o Banco Mundial distribuiu US$11 bilhões entre 128 projetos de combustíveis fósseis desde a Eco-92, realizada no Rio, segundo o relatório da IPS intitulado “A Wrong Turn from Rio. Destes financiamentos, cerca de US$2 bilhões foram para 31 projetos na América Latina, incluindo gás natural na Bolívia, Brasil e Chile, extração de petróleo na Venezuela e uma mina de carvão na Colômbia operada pela Drummond, empresa americana acusada em cinco processos nos tribunais dos EUA de contratar paramilitares para assassinar líderes sindicais.

“Estamos acompanhando muitos projetos extrativos em andamento na Amazônia e nos países andinos, diz Nadia Martínez, coordenadora para América Latina da Sustainable Energy and Economy Network, um projeto da IPS. “Poderemos ver mais envolvimento do Banco Mundial nesses projetos.

É claro que na realidade do nosso mundo, particularmente nas economias desenvolvidas, contamos diariamente com os combustíveis fósseis para os automóveis e fornecimento de eletricidade. A economia americana de US$11,7 trilhões precisa de energia para crescer e conta com descoberta, processamento e venda desta energia para garantir parte de sua produção econômica.

Mas não há razão para esperar que o mundo em desenvolvimento copie este modelo falido. Muitos economistas acreditam que a tecnologia para poupar energia pode criar mais empregos do que quase qualquer outro setor econômico nos países em desenvolvimento. O investimento mundial em energias renováveis foi de US$20 bilhões em 2003, um mercado que deve alcançar US$85 bilhões anuais em poucos anos, de acordo como o World Watch Institute, de Washington.

Energia renovável também é mais barata e pode ter projetos instalados com facilidade em áreas remotas. Na América Latina, onde cerca de 43% dos 511 milhões de habitantes são pobres, 15% ainda usam lenha e carvão para suas necessidades de energia, conforme a Agência de Desenvolvimento Internacional Canadense.

Distorcido. Dirigentes do banco disseram que a suspensão do apoio aos projetos de combustíveis fósseis penalizaria países pobres que contam com poucos recursos para estimular o crescimento econômico. Rashad Kaldany, diretor da divisão de petróleo, gás e mineração do Banco Mundial, diz que os projetos de combustíveis fósseis atendem rígidos padrões ambientais e sociais.

Já Hilary Benn, secretária de Desenvolvimento Internacional da Grã Bretanha, observa corretamente que o objetivo do banco de gastar apenas US$440 milhões em energia renovável até 2010 é “desproporcionalmente distorcido em relação aos combustíveis fósseis. Pior, o apoio do Banco Mundial a qualquer projeto de combustível fóssil pode puxar milhões em investimentos do setor privado.

Cientistas e especialistas do setor discordam sobre quanto tempo durará o suprimento de petróleo e gás natural do mundo, mas que vai acabar não há dúvidas e muito provavelmente neste século. Combustível fóssil provoca poluição nas cidades, aquecimento global e custos de energia mais altos. Energia renovável produz energia mais barata, mais limpa e reduz a pobreza.