Mais além da polêmica sobre a redução das tarifas impostas pelos EUA ao etanol brasileiro, o principal resultado da visita do do ex-governador da Flórida Jeb Bush ao país foi uma clara mudança no ânimo do governo brasileiro em relação à parceria com os americanos na transformação do etanol em uma commodity internacional.
Antes vista com desconfiança no Palácio do Planalto, a parceria simbolizada pela Comissão Interamericana do Etanol (CIE) foi recebida de forma entusiasmada em Brasília. O presidente da República em exercício, José Alencar, e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, se mostraram ontem bastante favoráveis à iniciativa durante reunião com o irmão do presidente americano George W. Bush e o ex-ministro Roberto Rodrigues, também co-presidente da CIE.
“Houve uma mudança significativa. Antes, a Dilma não queria nem ouvir falar dos americanos nesta área. Agora, o tom foi outro”, afirmou uma fonte da comitiva de Bush. A inflexão ocorreu após as recentes visitas de George Bush ao Brasil e do presidente Lula aos EUA.
Como havia feito em reunião no Departamento de Estado dos EUA, em Washington, Bush pediu ontem o reconhecimento da CIE como “parceira estratégica” do governo brasileiro no tema. E obteve um sinal positivo de Alencar e de Dilma. Mas nem todas as resistências parecem vencidas. O Itamaraty, por exemplo, insiste na assinatura de um acordo bilateral entre os governos, sem a intermediação da CIE. A comissão de Bush e Rodrigues, também co-presidida pelo titular do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luís Alberto Moreno, ganhou um reforço de peso com a inclusão do ex-premiê japonês Junichiro Koizumi.
Agora, a CIE também deve incorporar um representante da Europa em sua direção. Como ONG, a comissão já arrecadou US$ 800 mil e deve chegar a US$ 2 milhões para financiar sua burocracia interna. Um projeto-piloto em El Salvador servirá como vitrine para a CIE mostrar seu papel no auxílio à elaboração de legislação para garantir investimentos, na realização de diagnósticos locais sobre o mercado e no aconselhamento sobre potencial de produção e exportação mundiais aos países.
Em visita ao ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, os co-presidentes da CIE concluíram que a redução da tarifa sobre as exportações brasileiras de etanol não é o mais importante neste momento. A sobretaxa, aliás, auxiliaria a estratégia do governo para frear uma onda descontrolada de exportações. Além disso, ajudaria a política agrícola ao estender os benefícios dos efeitos da “febre do etanol” aos produtores rurais sem problemas com endividamento e localizados fora do eixo produtivo de São Paulo diretamente nos preços de outras commodities como milho, soja e algodão.
Mesmo assim, o ministro Stephanes deu um duro recado aos produtores de etanol ao admitir a eventual adoção de cotas para exportação para garantir o abastecimento interno. “Evidentemente, nós temos de dar segurança ao abastecimento interno e quanto a isso não há dúvida. Aí [em caso de desabastecimento interno], os mecanismos serão adotados. E o mais radical deles seria a imposição de cotas”, afirmou. E tentou tranqüilizar produtores e consumidores. “O mercado brasileiro pode ficar tranqüilo que essa questão será fundamental em relação a qualquer política do álcool”, disse.