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Eletricidade em carros exigiria cinco mega usinas

Dependendo da velocidade com que ocorrer, a substituição da frota brasileira por carros elétricos pode comprometer o planejamento energético do país, o que exigirá a antecipação de investimentos em grandes usinas.

Estudo feito pela consultoria Andrade & Canellas demonstra que a substituição dos veículos leves hoje em circulação no Brasil por modelos elétricos exigiria a produção adicional de 190.108 gigawatts-hora (GWh) por ano. Para gerar energia suficiente para abastecer esses veículos, atualmente movidos a gasolina ou a etanol, seria necessário construir cinco usinas hidrelétricas de porte semelhante à de Belo Monte.

“Em princípio, os veículos elétricos são opções interessantes para a descarbonização da matriz de transportes. Mas é preciso atenção, porque a eletricidade para abastecê-los terá de ser produzida de alguma forma, o que demandará investimentos significativos no parque gerador e na infraestrutura de transmissão e distribuição”, afirma Mônica Rodrigues de Souza, uma das autoras do levantamento.

O estudo leva em conta a frota de 39 milhões de veículos leves emplacados, conforme dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Não inclui ônibus e caminhões. Cada veículo consome, em média, 1,4 tonelada equivalente de petróleo (tep) por ano. Para toda a frota, são 54 milhões de tep anuais. Com a conversão dos motores a combustão em elétricos, esse consumo cairia para 16 milhões de tep por ano. Isso porque o nível médio de eficiência dos motores a combustão interna é de 27% – perde-se o restante da energia em calor -, enquanto a eficiência dos elétricos é de 90%.

Mesmo assim, essa substituição pode não gerar reduções tão óbvias na emissão de gases causadores do efeito estufa. “O Brasil deve ampliar de maneira muito consistente a produção de petróleo nos próximos anos. Diante desse fato e da disponibilidade de etanol a custo competitivo, a questão do carro elétrico precisa ser avaliada de maneira ampla, não como uma panaceia que resolverá todo o problema de mudanças climáticas”, diz Mônica.

Mesmo na hipótese de que 20% da frota atual de veículos leves passe a ter motores elétricos, em um prazo de dez anos o impacto é substancial. Seria preciso ter 38 mil GWh por ano em produção de energia elétrica, o equivalente a uma usina de Belo Monte. Resultado: possivelmente a oferta de energia viria de usinas térmicas, movidas a gás ou a óleo, que também são poluentes e emitem gases-estufa.

Giovanni Benini Rocha, também da Andrade & Canellas, conclui: “Talvez seja interessante ter carros elétricos nos grandes centros urbanos, como forma de reduzir a poluição onde esse problema é maior, mas é conveniente também o país investir em maior eficiência dos motores a combustão no uso do etanol e de combustíveis fósseis.”

Para a Ecofrotas, empresa que faz a gestão de frotas corporativas, vale a pena apostar mais no etanol. Até mesmo a relação conhecida como “70/30” – ou seja, há vantagem em abastecer com etanol apenas quando o preço do litro é de 70% o preço da gasolina, no máximo – deve ser contestada. A gerente de relacionamento em sustentabilidade da Ecofrotas, Amanda Kardosh, avalia que essa relação pode continuar vantajosa até quando o álcool chega a 85% do valor da gasolina, dependendo da técnica utilizada.

Para a executiva, isso não deve desestimular a implantação dos carros elétricos, mas “a moral da história é: não dá para apostar em um único ovo, até porque o etanol de segunda geração, com aproveitamento do bagaço, traz muitos avanços”, diz Amanda. (DR)