O que está errado? O preço do álcool ou o preço da gasolina? O desequilíbrio entre os dois combustíveis exibe uma distorção da economia brasileira que é o enorme subsídio ao preço da gasolina. O preço da gasolina vendida às refinarias em 12 de setembro de 2005 era o mesmo R$ 1,54 cobrado ontem, e o preço do petróleo já oscilou espantosamente neste período.

Isso segura a inflação, mas por outro lado cria um artificialismo no mercado. O preço não cai quando o petróleo desce, nem sobe quando acontece o contrário. Mas outros produtos que não são vendidos ao público como o nafta e querosene de aviação sobem constantemente, mostrando a hipocrisia dessa política de preços.

Neste momento, o governo vive o seguinte dilema. Ontem, o ministro Guido Mantega anunciou novas medidas para tentar evitar a queda do dólar, m as é exatamente essa queda que tem evitado que a inflação suba mais. A valorização do real cria várias distorções na economia, mas se ela não acontecesse, a inflação subiria. Quando os juros sobem para combater a inflação aí é que o dólar cai mais. Como resposta, o governo fica subindo IOF para deter a queda do dólar. Ou seja, a política econômica está numa armadilha e não sabe como sair.

É neste contexto complexo, de dilemas e do preço artificial da gasolina, que o governo ficou ´agastado` com o preço do álcool e ameaçou interferência direta no setor. A União Nacional da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) disse que não tem nada contra a Agência Nacional do Petróleo (ANP) buscar mais informações sobre o setor e defende inclusive que ela se torne menos uma agência de petróleo e mais de combustíveis mesmo. Isso é diferente de medidas intervencionistas de controle de preço.

– É bom que o governo entenda sim o que se passa no setor e que procure dar os incentivos certos . Por exemplo, nós achamos que com o IPI o governo pode incentivar as indústrias a produzirem motores mais eficientes para o etanol. Isso é bom para o consumidor, porque ficará mais econômico, e bom para o meio ambiente, diz Marcos Jank, presidente da Unica.

Ele disse que o setor foi atingido por uma série de eventos. Primeiro, a crise de 2008 acertou em cheio as empresas produtores de álcool, no meio de um processo de endividamento para expansão; depois, fortes chuvas provocaram uma quebra de safra; em seguida, uma grande seca reduziu em 10% a nova safra.

– Esta semana começamos a colheita da safra e a tendência em três semanas é a queda do preço do etanol. No centro-sul o preço ficará bem competitivo. Mas o mais importante será o setor voltar a crescer. Ele vinha crescendo a 10% ao ano, mas parou para fazer uma consolidação, disse Jank.

Em 2006, houve um aumento muito grande do investimento no setor sucroalcooleiro. Empresas novas entraram no mercado, se endividaram para implantar suas unidades. Quando o dólar subiu e o crédito secou, elas ainda estavam maturando o investimento. Algumas quebraram, outras foram compradas. Grandes empresas entraram no setor comprando as que estavam em dificuldade. É isso que eles chamam de consolidação. A recuperação foidificultada por duas quebras de safra, uma por excesso de chuva, outra por seca.

Um grande complicador do etanol é que ele é comparado ao preço da gasolina congelado pela Petrobras. A última grande alteração no preço da gasolina vendida pelas refinarias às distribuidoras – descontados impostos e bem antes de chegar aos postos de gasolina – aconteceu em setembro de 2005, quando o preço médio semanal, segundo a ANP, subiu de R$ 1,42, do dia 5 de setembro, para R$ 1,54, no dia 12 de setembro. Para se ter uma ideia, o preço médio do último dado disponível, do final de janeiro deste ano, apon tava os mesmos R$ 1,54. A única exceção ocorre entre 8 de fevereiro e 3 de maio de 2010, quando os preços recuaram para a faixa de R$ 1,47, mas voltaram logo ao patamar de R$ 1,54.

Já com o querosene de aviação, a situação é completamente diferente. Somente este ano, os preços já foram reajustados quatro vezes, com alta acumulada de 28%, segundo o Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias. Em 2009, houve redução de 18%; em 2008, queda de 3,71%. Em 2007, alta de 12,6%; em 2006, aumento de 7%; em 2005, alta de 8,9%. A mesma coisa aconteceu com o óleo combustível, usado para a produção de energia em usinas termelétricas. Em janeiro de 2005, ele era vendido por R$ 0,50. No mesmo mês de 2006, foi para R$ 0,80. Alta de 60%. Em janeiro de 2007, caiu para R$ 0,61; depois subiu para R$ 1,00, em 2008; caiu para R$ 0,61, em 2009; subiu para R$ 0,87, em 2010, e chegou a R$ 0,96 em janeiro deste ano. Por serem preços ´invisíveis`, que não são vistos pelo consumidor, a política é outra, s eguindo flutuações de mercado.

O vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes, Sindicom, Alísio Vaz, também acredita que os preços do álcool começarão a cair, mas lembra que a alta foi mesmo forte.

– O álcool hidratado já subiu 31% neste ano, o álcool anidro, que é misturado à gasolina, já subiu 61%. Este ano houve condições atípicas de oferta e demanda. Em março sentimos na bomba uma queda de 60% do consumo de álcool hidratado, afirmou.

Ele é a favor de que a ANP se envolva cada vez mais com o mercado de biocombustíveis, mas lembra que nunca houve um período tão prolongado de gasolina congelada.

Se o governo quiser aumentar o imposto para reduzir a exportação de açúcar, pode ter outro efeito indesejado. Açúcar é o quinto produto da pauta de exportação brasileira, com uma receita de US$ 13 bilhões.