Mercado

Direito, necessidade e justiça

Em 1995, o Rio de Janeiro respondia por 15,9% do total das receitas administradas pela Secretaria da Receita Federal (SRF), número que aumentou para 18,9% em 2004. O Estado é a segunda maior fonte de arrecadação da federação brasileira. No entanto, os investimentos federais caíram de 6,52% para 5,75% no mesmo período, deixando o Rio em penúltimo lugar na lista dos beneficiados. Há um verdadeiro descaso da União em relação ao estado fluminense, que se verifica não só na falta de repasse de verbas, como também na legislação fiscal – especialmente aquela que regula o comércio e a produção petrolífera.

Em 2005, o Rio produziu mais de 470 milhões de barris de petróleo, o equivalente a mais de 83% de toda a produção nacional. A auto-suficiência alcançada no último ano deve-se, em grande parte, ao desempenho das bacias fluminenses. Porém, uma injustiça constitucional faz com que o Rio deixe de receber mais de R$3 bilhões por ano, desde 1988.

A Constituição prevê que o estado beneficiado pelo ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) é aquele que compra o combustível, não o que produz. Ou seja, o Rio, produtor de quase todo o petróleo nacional, não pode recolher o imposto. No primeiro ano do governo Lula, o Presidente promoveu uma minirreforma tributária, unificando as alíquotas de ICMS dos estados e estabelecendo que a cobrança da taxa passaria a ser efetuada onde as mercadorias são produzidas. Acendeu-se uma esperança para os fluminenses. O problema é que a nova regra abriu uma exceção que não resolveu a injustiça histórica: na produção de petróleo, combustíveis e derivados, o recolhimento do ICMS é feito no destino, não na origem.

Em muitos estados da Federação, a arrecadação de ICMS sobre combustíveis é uma das principais fontes de recursos. É o caso de São Paulo, que tira proveito das alíquotas do ICMS relativas à produção do álcool combustível. Em 2003, o governo paulista sancionou uma lei reduzindo o ICMS do álcool hidratado de 25% para 12%, dando vantagens aos produtores, distribuidores e revendedores.

Neste mesmo ano, o Brasil produziu 14.809 m3 de etanol, dos quais 59% originários do estado paulista. São Paulo é o maior produtor nacional de álcool, assim como o Rio é o estado que mais produz petróleo no país. Porém, a discrepância fiscal permite que a posição de liderança apenas beneficie São Paulo. O argumento de que o álcool é um produto nacional e ecologicamente correto é facilmente refutável. Se o petróleo apresenta mais riscos ambientais e sociais, nada mais justo do que dar condições de amenizá-los através de recursos que podem ser obtidos com o recolhimento de ICMS.

No entanto, na fila das inúmeras propostas que aguardam apreciação da Câmara, a Proposta de Emenda Constitucional que suprime essa falta de justiça com o Rio de Janeiro continua na espera. E, assim, a saúde, a segurança e os outros inúmeros setores que carecem de investimentos, continuam na precariedade, quando poderiam ser beneficiados com cerca de R$ 3 bilhões que seriam arrecadados caso o estado recolhesse o ICMS do petróleo a que deveria ter acesso.

O momento é de definir prioridades. Modificar a lei para que o Rio se beneficie com o imposto da produção petrolífera não é uma questão de privilégio, mas de direito, necessidade e justiça.