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Dedini começa de novo

Após acumular uma dívida de R$ 1,8 bilhão e entrar em recuperação judicial, uma das principais fabricantes nacionais de equipamentos para usinas de açúcar e etanol traça a sua reconstrução

Foto: João Castellano/ Istoé
Após acumular uma dívida de R$ 1,8 bilhão e entrar em recuperação judicial, uma das principais fabricantes nacionais de equipamentos para usinas de açúcar e etanol traça a sua reconstrução Foto: João Castellano/ Istoé

O ano de 2008 é um marco na trajetória da Dedini. Naquele ano, a pequena oficina de reparos de carroças, fundada em 1920 pelo italiano Mário Dedini, se consolidou como uma das principais fabricantes nacionais de equipamentos para usinas sucroalcooleiras. Instalada em Piracicaba, interior de São Paulo, a companhia aproveitou a alta dos investimentos em açúcar e etanol no País para faturar R$ 2,1 bilhões, um salto de 38% sobre 2007 e o melhor resultado da sua história.

As políticas de controle de preços da gasolina, instituídas pelos governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, no entanto, estrangularam o setor de etanol, que não conseguia repassar as altas de custos ao preço do combustível. O resultado foi uma quebradeira geral no setor, interrompendo a trilha favorável da Dedini. Nos anos seguintes, o grupo assistiu a uma deterioração progressiva de seus negócios. Com os clientes suspendendo contratos e aportes em novas usinas, a Dedini chegou a operar com uma capacidade ociosa de 60%.

Sem saída, a empresa pediu recuperação judicial em agosto de 2015, com um passivo estimado em R$ 177 milhões, além de uma dívida ativa com a União de R$ 1,7 bilhão. Na quarta-feira 15, a Dedini ganhou a chance de um recomeço. O juiz Marcos Douglas Balbino da Silva, da 2ª Vara Cível de Piracicaba, homologou o plano de recuperação judicial da empresa, aprovado em setembro de 2015. A decisão permite que a companhia implante as medidas traçadas para a sua reestruturação. “Desde o início, nossa estratégia foi a transparência e o enfrentamento aberto de todos os problemas”, diz Giuliano Dedini Ometto, 49 anos, CEO e presidente do conselho de administração da Dedini.

Membro da quarta geração da família e primo de segundo grau do empresário Rubens Ometto, do Grupo Cosan, ele é o responsável por liderar essa reconstrução. “A homologação vai acelerar esse processo.” Disposta a ir além do discurso, a Dedini colocou à venda, na semana passada, 36 lotes residenciais em Piracicaba, com valor estimado em R$ 2 milhões. Antes, o grupo já havia se desfeito de um terreno na cidade, por R$ 21 milhões, dinheiro que havia sido depositado em juízo para o pagamento de dívidas e que, com a homologação, foi desbloqueado.

O próximo passo é a venda da unidade de serviços Dedini Refratários, em Piracicaba, e da fábrica de Maceió, que produz peças para reposição. A soma dos dois bens é de R$ 85 milhões. A empresa possui outras sete unidades fabris, em Piracicaba e Sertãozinho (SP). O destino prioritário desse montante é a quitação dos R$ 36,5 milhões de dívidas trabalhistas. “A ideia é liquidar essas pendências em 12 meses”, diz Dedini Ometto. Nos últimos dois anos, o grupo demitiu 1,6 mil profissionais, segundo o Sindicato dos Metalúrgicos de Piracicaba. Nos tempos áureos de 2008, a empresa chegou a empregar 6,5 mil funcionários.

Hoje, o quadro compreende 2 mil profissionais. Os demais credores serão pagos em um prazo de 11 anos, com um abatimento de 50% da cifra devida a cada um deles. O processo fixou ainda uma carência de um ano para o início desses pagamentos. “Muitos fornecedores da região nasceram e cresceram em função do grupo”, diz Felipe Franchi, advogado de alguns desses credores. “Essas empresas deram um voto de confiança para a companhia.” Para manter suas operações rodando, a Dedini também está acrescendo 0,5% no valor pago em cada novo contrato com esses fornecedores. A cifra adicional é aplicada para abater parte da dívida que a companhia tem com esses parceiros.

No médio prazo, a Dedini vai focar em frentes como a diversificação para áreas como energia, mineração e alimentos e bebidas. A expectativa, porém, é de melhoras em seu mercado tradicional. Para Aparecido Luiz, presidente do Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis, o aumento da demanda pelo açúcar e a previsão de preços mais competitivos para a commodity e o etanol trazem um alento. “Esse cenário reaquece a demanda por manutenção e reformas nas usinas”, diz. “E é um passo para a volta das encomendas de máquinas.” O RenovaBio, programa federal que estuda medidas para ampliar a produção de etanol até 2030, é outro fator positivo.

“Isso pode dar maior previsibilidade para os aportes no setor”, afirma Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro. A Dedini também espera reduzir, gradativamente, sua dívida com a União. “A empresa passa a ter fôlego para recuperar sua receita e pagar esse passivo”, avalia Julio Mandel, advogado do grupo. Nos primeiros doze meses após a homologação, o grupo prevê faturar R$ 306 milhões. Nos anos seguintes, a projeção é crescer 1,5%. “Assim como meus antepassados, sigo otimista, mesmo empreendendo em um País que hostiliza quem produz”, diz Giuliano Dedini Ometto, que não vê espaço para grandes saltos nesse ano. “Mas vamos arrumar a casa para voltar a crescer em 2018.”