Para cada objetivo, um tipo de indústria. Se o objetivo for a produção de alimentos ou de energia, de plásticos biodegradáveis ou de produtos têxteis, uma diferente indústria de transformação é necessária. Porém, a matéria-prima é a mesma: cana-de-açúcar.
No agronegócio é assim: investe-se muito no processo industrial, e a matéria-prima que faz a diferença fica em segundo plano. Essa negligência com a coluna dorsal do agronegócio se estende dos acadêmicos aos industriais, das políticas públicas às privadas.
Ninguém se lembra da cana-de-açúcar e nem do seu fornecedor a não ser na hora de renovar os contratos de arrendamento de terra e de fixar o seu preço para a próxima safra.
Gabriel Palma, da Universidade de Cambridge, com propriedade diz que o Brasil só romperá o ciclo da estagnação econômica quando encontrar seu espaço no mundo globalizado. Pensando no longo prazo, a China resolveu ser a fábrica do mundo e a Índia, em seu planejamento estratégico, optou por ser o escritório do mundo, enquanto o Brasil ainda procura o seu espaço, diz ele. Empresas brasileiras de calçados estão produzindo na China para não perder suas conquistas junto ao mercado americano que, por sua vez, administra seus estoques e presta serviços a seus clientes a partir de call centers fisicamente instalados na Índia.
O Brasil demonstrou na última década do século XX que tem condições de ser competitivo no agronegócio, e o mundo reconheceu nosso talento empresarial na agricultura e na pecuária. São segmentos da economia que nos permitirão manter os espaços conquistados e ampliá-los, se aprofundarmos nossos conhecimentos na cadeia produtiva e construirmos uma política fiscal que privilegie a exportação de produtos primários processados sobre a exportação de commodities .
O conhecimento gera a especialização e esta demanda tempo, sendo o tempo estratégico, pois não se desenvolvem tecnologias sem ele. Não se alcança a excelência da noite para o dia e cada vez mais se exigem metodologias certificadas que auxiliem na busca dos resultados, definições de prioridades, parâmetros para garantir a qualidade dos processos e referências para avaliá-los. Este diferencial requer capital intensivo e é esta a questão central e a desvantagem comparativa e competitiva da economia brasileira.
Investimento em infra-estrutura de irrigação, questionada por muitos acadêmicos e usineiros, é o hardware necessário e indispensável para que o moderno conceito de agricultura tecnificada se instale no celeiro do mundo — mais um dos ufanismos brasileiros. O software são os programas nutricionais que avaliam a umidade do solo, suas carências em nutrientes, durante o ciclo vital da cultura.
A chamada “fertirrigação” não só elimina os riscos de escassez de açúcar e álcool como permite administrar todos os fatores de produção, tais como energia, água, fertilizantes, defensivos e mão-de-obra, razões de sobra para assegurar o reembolso do capital investido. Se à eficiência operacional acrescentarmos o rendimento agrícola, assim como a longevidade da cultura, estaremos dando garantias de abastecimento aos mercados internacionais e ao doméstico.
Enquanto a cana-de-açúcar não deixar de ser coadjuvante e passar a ser protagonista no cenário das energias renováveis, perde o Brasil a oportunidade de contribuir para a reestruturação por que passa a matriz energética do mundo.