Mercado

Cosan sente o gosto amargo da sabatina

Na primeira vez em que os executivos da Cosan falam em público depois da polêmica abertura de capital da Cosan Limited na Bolsa de Valores de Nova York (Nyse), sentiram de perto o peso da desaprovação de alguns de seus investidores. Na sexta-feira, a companhia fez uma reunião com analistas para comentar seus números e projetos, mas em meio a perguntas técnicas dos profissionais, os executivos tiveram de enfrentar questões de minoritários a respeito da operação. Alguns deles tinham dúvidas sobre a oferta e as conseqüências para as ações, enquanto que outros, em suas observações demonstravam o quanto estão insatisfeitos com o negócio.

Ação cai 30% e o Ibovespa sobe 6,51%

O questionamento do consultor financeiro e assíduo freqüentador de reuniões com analistas Marco Antônio Müller é um bom exemplo. Após a apresentação, ele fez questão de sanar suas dúvidas. De fala mansa, Müller perguntou ao diretor de Relações com Investidores, Paulo Diniz, se a empresa tinha planos de continuar no Novo Mercado e seguindo as regras de governança corporativa mesmo depois da listagem da Cosan Limited na Nyse. Diniz respondeu que dependeria do nível de adesão dos acionistas à migração das ações da Cosan para os Brazilian Depositary Receipts (BDRs, recibos das ações negociadas nos EUA) da Cosan Limited. Mas fez questão de ressaltar que não há problema continuar no Novo Mercado, uma vez que a empresa já atende aos requisitos de governança. Müller foi categórico ao retrucar: “não é o que parece e nem o que o mercado acha.”

Na opinião do consultor, com a operação, a Cosan está descumprindo várias das boas práticas. Mas o maior pecado é o tratamento diferente dado ao controlador, Rubens Ometto, e aos minoritários, criando dois tipos de ações na Cosan Limited. “Essa não é uma atitude que se preze de uma companhia do Novo Mercado”, disse Müller após a reunião. “Se ela tinha planos de fazer essa operação, deveria estar no pregão tradicional, assim não esperaríamos mundos e fundos em termos de governança”, completa ele.

Para o mercado, o calcanhar-de-aquiles da operação é a criação de dois tipos de ações ordinárias (ON, com voto). Uma em que uma ação corresponde a um voto. A outra, muito mais poderosa, em que cada ação tem dez votos, sendo que apenas Ometto teria esse papel. A repercussão foi tão negativa que, um mês depois do anúncio, a companhia resolveu estender as ações vitaminadas aos minoritários. No entanto, o estrago já estava feito. Desde a divulgação da oferta, no fim de junho, as ONs da Cosan amargam queda de 30%, ante uma alta de 6,51% do Ibovespa. Diniz pondera que outros fatores contribuíram para a queda. Entre eles, a baixa nos preços do açúcar e do álcool, a venda de 6% das ações pela francesa Tereos, o rumor de compra pela americana ADM, sem contar o fato do lançamento das ações ter ocorrido no meio de uma crise.

Os BDRs da Cosan estrearam na Bovespa em 16 de agosto, no pior dia da crise, quando o Ibovespa chegou a cair mais de 9%. Diniz ressalva que o investidor precisa entender que não perdeu os seus direitos e depois da oferta pública a empresa ficou muito maior, em condições de fazer novas aquisições tanto no Brasil quanto no exterior. O período para os investidores migrarem das ações da Cosan para os BDRs da Cosan Limited deve começar em dezembro e o diretor acredita que a adesão será grande. Um dos motivos é que, pelo fato de sua sede ser nas Bermudas, um paraíso fiscal com uma carga tributária irrisória, o lucro da empresa será maior e os dividendos também, completa Diniz.