O biometano é um biocombustível muito próximo do hidrogênio verde. Ele é prático de ser capturado, armazenado e distribuído. Mas, diferentemente do hidrogênio, o biometano – assim como o etanol – pode ser distribuído em tanques de baixa pressão.
O biometano é interessante porque substitui o diesel, enquanto o etanol substitui a gasolina. É muito interessante do ponto de vista de segurança energética. É uma energia que está disponível, tem um potencial enorme, e a tendência é que cresça cada vez mais.
Essa tendência está próxima de se consolidar, através das recentes medidas de incentivo do programa metano zero, recentemente anunciadas pelo Governo Federal, para impulsionar a produção e o uso sustentável do biometano.
As medidas anunciadas pelos Ministérios de Minas e Energia (MME) e do Meio Ambiente (MMA), vão no mesmo caminho dos compromissos assumidos pelo país durante a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), entre eles, o Acordo do Metano. O documento, assinado pelo Brasil e mais de cem países, prevê um esforço global para reduzir em 30% as emissões de metano até 2030 em relação aos níveis de 2020. Trata-se de uma grande oportunidade para o Brasil, no contexto de uma nova economia verde global.
Entre as diretrizes do decreto, destacam-se o incentivo ao mercado de carbono, em especial o crédito de metano, a promoção da implantação de biodigestores e sistemas de purificação de biogás e de produção e compressão de biometano. Além disso, a estratégia prevê o fomento ao desenvolvimento de pesquisas científico-tecnológicas sobre biogás e biometano e o incentivo à cooperação nacional e internacional para a implementação de ações de redução das emissões de metano, entre outros.
Ainda na celebração ocorrida no Palácio do Planalto, os ministros de Minas e Energia e do Meio Ambiente assinaram duas portarias no contexto da Estratégia Federal de Incentivo ao Uso Sustentável de Biogás e Biometano.
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A Portaria MMA nº 71, de 21 de março de 2022, institui o Programa Nacional de Redução de Emissões de Metano.
A iniciativa diz respeito ao biogás gerado a partir do correto tratamento de resíduos orgânicos urbanos e rurais, oriundos, por exemplo, de aves, suínos, cana e aterros sanitários. Esse biogás se transforma em energia ou, se purificado, vira biometano, que se apresenta como uma alternativa mais barata para abastecer veículos pesados, como caminhões, tratores e ônibus. O biometano pode ainda ser usado como biofertilizante, tão importante neste momento.
No âmbito do MME, foi realizada assinatura de alteração da Portaria Normativa n° 19/MME/2021, incluindo os investimentos em biometano no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI). Demanda do setor desde 2016, os projetos inseridos no REIDI têm suspensa a cobrança de PIS/COFINS para aquisição de máquinas, materiais de construção, equipamentos, dentre outros componentes.
A inserção do biometano no REIDI irá proporcionar a construção de novas plantas para produção do biometano, aumentando a oferta do produto e a instalação de corredores verdes para abastecimento de veículos pesados, com impactos na redução de emissões de Gases do Efeito Estufa. O total de investimento previsto é superior a R$ 7 bilhões, com geração de 6500 empregos na construção e operação das novas unidades.
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Com a medida, serão construídas 25 novas plantas distribuídas em São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A produção deve saltar de 400 mil metros cúbicos por dia para 2,3 milhões de metros cúbicos por dia em 2027, suficiente para abastecer mais de 900 mil veículos leves por ano. Além disso, serão evitadas as emissões de quase 2 milhões de toneladas de carbono na atmosfera, o que corresponde ao plantio de 14 milhões de árvores em termos de captura de carbono.
Repercussão no setor
Segundo o presidente da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), Alessandro Gardemann, é essencial o Brasil olhar e aproveitar esse momento. “Tem bastante coisa acontecendo nesse sentido e acho que o governo está entendendo. Essa é a grande oportunidade de transformar resíduo em hidrogênio verde”, disse. Segundo Gardemann, são 100 milhões de metros cúbicos ou mais por dia, que o Brasil desperdiça de gás. Isso é equivalente a mais de 100% do consumo de gás natural no país, duas vezes a importação de gás, quase cinco vezes o consumo de GLP, 70% diesel ou 40% energia elétrica, ou seja, é muito volume de gás.
Para o executivo, deixar essa matéria orgânica apodrecer sem aproveitar esse potencial energético equivale a 700 mil barris de petróleo por dia, renovável evaporando no campo. “No fundo, biogás é uma grande ferramenta de eficiência adicional de todo agro, de nutriente, de fertilizante e de energia. O biometano desponta como uma das alternativas economicamente viáveis para assegurar ao Brasil segurança energética”, afirmou, lembrando ainda que “para quem participa da ABiogás, as medidas de incentivo, não foram surpresa, já que temos trabalhado há meses com o MMA E MME, inclusive com a participação de vários associados”, disse.
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Para Leonardo Caio Filho, diretor de Tecnologia e Regulação da Associação da Indústria da Cogeração de Energia (Cogen), o biogás passa a ser agora o quarto produto nas usinas de cana-de-açúcar e etanol, além da bioeletricidade, que foi o terceiro produto.
“Hoje nós temos no Brasil próximo de 380 usinas de açúcar e etanol e desse montante, em torno de 225 usinas exportam energia para o sistema. O biogás produzido através dos resíduos sucroenergético tem diversas utilidades. Ele pode servir para alimentar a frota de caminhões e tratores que vem se adaptando a utilizar o combustível; ele pode ser utilizado para gerar energia elétrica também ele pode passar pelo tratamento, transformando em biometano e colocado na rede nos gasodutos, a exemplo do que vem sendo realizado pela Usina Cocal, localizada em Narandiba, no oeste paulista”, disse.
“Hoje quando a gente fala de energia elétrica nós temos ainda um número muito pequeno de biogás, cerca de 400 MW. Se considerarmos só o programa RenovaBio, que vai elevar de 35 bilhões de litros de etanol para 50 milhões de litros por safra até 2030, nós precisaríamos de mais 200 milhões de toneladas de cana. Com esse incremento de cana, teríamos um potencial teórico de elevar esse biogás para 4GB, ou seja, a gente poderia implementar de uma forma conservadora em mais 3,6 GW de biogás”, explicou Leonardo.
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Zilmar José de Souza, gerente de Bioeletricidade da UNICA, destacou que segundo o MME, o potencial de produção de biometano no país, é equivalente a quatro vezes a capacidade do gasoduto Brasil-Bolívia. “O setor sucroenergético responde por quase metade desse potencial, ou seja, temos a capacidade potencial de dois gasodutos Brasil-Bolívia nos canaviais em termos de produção de biometano. Que seja um início das medidas que precisamos para avançar em escala com o biogás e o biometano e tirar do papel esse enorme potencial do setor sucroenergético, com um combustível local, renovável e que agrega segurança energética, econômica e ambiental para o consumidor de energia no país”, finalizou.
Biometano na prática
Empresas e poder público já vem investindo no biometano para movimentar suas frotas seja no transporte de cargas e equipamentos agrícolas, como também no transporte coletivo. Na solenidade de lançamento do programa Metano Zero, o presidente Jair Bolsonaro dirigiu um trator movido a biometano do Palácio da Alvorada até o Palácio do Planalto, assim como outros participantes, que se descolaram no trajeto em ônibus e caminhões movidos a biometano. “É um exemplo prático de como o Brasil poderá se beneficiar das políticas de incentivo ao biogás e biometano”, disse o ministro de Meio Ambiente, Joaquim Leite, na ocasião.
Já em Ribeirão Preto – SP, a abertura do evento Santander DATAGRO Abertura de Safra Cana, Açúcar e Etanol 2022/23 no dia 9 de março, foi o destino da viagem inaugural do ônibus para transporte coletivo urbano da Scania, movido a biometano e/ou gás natural.
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O ônibus com ar-condicionado e Wi-Fi iniciou o primeiro trajeto do teste em um deslocamento entre o Palácio Rio Branco e o Centro de Eventos Taiwan (no distrito de Bonfim Paulista), com a presença do prefeito Duarte Nogueira, do superintendente da Transerp, Marcelo Galli, entre outras autoridades e representantes da Scania, fabricante do ônibus movido a gás.
O veículo da Scania é o modelo urbano K 280 4×2, que poderá ser abastecido tanto com biometano e/ou gás natural. Esse é o primeiro ônibus urbano com tração 4×2 a gás que a Scania fábrica no país e se mostra uma opção sustentável e viável para o transporte de passageiros nos grandes centros.
A Scania lidera no Brasil, de forma comercialmente viável, o mercado de caminhões movidos à gás biometano e, na última DATAGRO, ela apresentou novos modelos para o segmento do agronegócio e de coleta de resíduos. Pioneiros no Brasil, considerando a produção em série, eles também podem funcionar com GNV (Gás Natural Veicular, tipo de gás produzido por fontes fósseis) caso o proprietário não consiga produzir ou acesso a um fornecedor de biometano, ainda raros.
O caminhão pesado canavieiro G 410 XT 6×4, movido a biometano, está em demonstração na Usina Cocal, desde 2020. É o primeiro caminhão pesado off road movido a gás do mundo. No início, era adquirido o combustível de um fornecedor. Mas, recentemente, a própria Cocal passou a produzir seu biometano para abastecer o modelo. Neste período, já foram rodados cerca de 80 mil km e nenhuma falha operacional foi apontada. O biometano reduz em até 90% as emissões de CO2 em comparação ao diesel.
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Em junho do ano passado, a TransMaroni, do Grupo Maroni Transportes, chegava à marca de 50 unidades movidos a gás (natural e/ou biometano) da Scania, entrando para a história do transporte nacional com a maior frota já adquirida desta solução alternativa ao diesel. Os veículos serão usados nos segmentos alimentício, varejo, higiene e limpeza, cosméticos e e-commerce em diversos estados brasileiros. Parte já tem contratos com B2W, Carrefour, Grupo Big, JBS, L´Oréal, Nestlé e Unilever.
A evolução da agenda da sustentabilidade no setor de transportes segue em foco para a Scania, que já superou os 600 caminhões a gás comercializados e acabou de anunciar a venda dos primeiros veículos movidos 100% a GNL (gás natural liquefeito) da história do Brasil para a Morada Logística (SP).
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