Quase 30 anos após a criação do maior programa de combustível renovável do mundo, o Proálcool, o Brasil volta a apostar num novo projeto de energia limpa: o biodiesel, uma alternativa para reduzir a dependência do petróleo, melhorar a qualidade do ar e contribuir para a inclusão social. Se a regulamentação sair em novembro, como previsto, a partir de 2005 os veículos brasileiros movidos a óleo diesel (caminhões, locomotivas e ônibus) já estão circulando com um percentual de biodiesel. A ministra de Minas de Energia, Dilma Roussef, tem afirmado que o combustível renovável deverá ser um dos principais focos do governo Lula.
Segundo o secretário-executivo do ministério, Maurício Tolmasquim, a intenção é começar o Programa de Biodiesel com o chamado B2, ou seja misturar 2% o combustível renovável no diesel, o que significará cerca de 800 milhões de litros de biodiesel na frota brasileira. O aumento deverá ser gradual, podendo chegar a 5% em 2010.
O combustível renovável é produzido com óleos vegetais, novos ou usados, gorduras animais, resíduos industriais e esgoto sanitário reagidos com um percentual de metanol ou etanol (álcool extraído da cana-de-açúcar). O processo resulta em biodiesel e glicerina – mat-éria-prima empregada na indústria de cosméticos e explosivos.
Mas, no Brasil o foco está, especialmente, nos óleos vegetais, obtidos a partir da soja, mamona, dendê, milho, girassol, babaçu, palma, algodão e colza reagidos com álcool etílico. “Assim, teremos um combustível 100% renovável”, afirma o professor da USP (Universidade de São Paulo), Miguel Dabdoub, responsável pela fórmula do biodiesel com álcool de cana-de-açúcar.
Mas além da questão ambiental, o uso do biodiesel – que praticamente não emite enxofre – também deve ser estratégico do ponto de vista econômico. Segundo Tolmasquim, o diesel representa um grande gargalo para o Brasil, que tem de importar 15% do combustível consumido (6 bilhões de litros, que custam cerca de US$ 1,2 milhão). Mesmo que o Brasil alcance a auto-suficiência em petróleo, haverá necessidade de importar diesel comum. Isso porque o óleo extraído não tem qualidade para produção daquele combustível.
A plantação, cultivo e colheita de mamona são intensivos em mão-de-obra, construindo para a criação de empregos e distribuição de renda para milhares de excluídos nas regiões mais carentes. Além disso, a mamona é facilmente adaptável ao semi-árido do Nordeste.
USP interrompe com McDonald’s
Durante certo tempo, a USP manteve parceria com a rede McDonald’s, que fornecia óleo queimado. A interrupção ocorreu no último final de semana, quando em uma das retiradas do óleo, um funcionário da empresa, ao colocar a substância dentro de um tambor, sofreu uma reação química provocada por algum outro resíduo depositado no tambor.
Aconteceu um princípio de intoxicação do funcionário envolvido na tarefa, mas no mesmo instante o problema foi contornado.
Com a relação à parceria, o McDonald’s informa, por meio da assessoria, que possui todo interesse em retomar a coleta com a Universidade e um plano de sistematização de retirada e transporte do óleo foi apresentado pelo Departamento de Química da USP, para o projeto prosseguir. A proposta foi entregue na sexta-feira à rede de lanchonetes e, com isso, dentro de uma semana a volta da coleta do óleo poderá acontecer.
Ainda pelo lado do McDonald’s, “uma empresa focada em processos e que preza pela qualidade em todos os aspectos desde o atendimento ao cliente até cada detalhe do relacionamento com sua equipe”, finalizou um colaborador da rede de lanchonetes.
Por enquanto o óleo usado pela rede de lanchonetes está sendo comercializado com uma empresa de Campinas, interior de São Paulo, a R$ 50 a tonelada.
Câmara busca estratégias
Instalada no último dia 30 de junho, a Câmara Setorial Especial de Biocombustíveis, tem a finalidade de consolidar as propostas de projetos estratégicos para o álcool combustível e o biodiesel. A câmara foi criada por meio de resolução do secretário de Agricultura e Abastecimento, Duarte Nogueira, no início deste ano. É formada por representantes de todos os elos da cadeia de produção dos biocombustíveis. Seu presidente é o professor Miguel Dabdoub do Ladetel (Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas), do Departamento de Química da USP de Ribeirão Preto. Esta é a 26ª Câmara Setorial criada em São Paulo.
A Secretaria de Agricultura e Abastecimento reorganizou a formação das câmaras setoriais em 1997 e estão criadas, além da Câmara Especial de Biocombustíveis: agricultura ecológica, algodão, aves, batata, borracha natural, café, carne bovina, carne suína, flores e plantas ornamentais, frutas, hortaliças, cebola e alho, lazer e turismo regional, leite e derivados, mandioca, milho, trigo, produtos florestais, açúcar e álcool, arroz, citros, feijão, ovos, pescados e produtos apícolas.