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Biocombustível pressiona preços dos grãos

Uma questão polêmica, lançada no ano passado pelo presidente da Venezuela, Hugo Cháves, começa agora a surtir seus primeiros efeitos. A influência da demanda por biocombustíveis sobre os preços dos alimentos já tem sido verificada: recentemente a Nestlé anunciou a necessidade de incremento dos preços em função do aumento das matérias-primas agrícolas destinadas à produção de combustíveis, como a soja e o milho.

A tendência tem sido motivada por iniciativas como a dos Estados Unidos, que aumentou a produção do milho para destiná-lo à elaboração de etanol, em detrimento à produção de ração e alimentação humana. “Sobe o milho, sobem os insumos para alimentação dos animais e também das pessoas. Essa pressão nos preços do cereal poderá se manter nos próximos anos”, constata o pesquisador do Instituto de Economia Agrícola (IEA) Sérgio Torquato.

O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho) e União Brasileira do Biodiesel (Ubrabio), Odacir Klein, acrescenta que ao contrário da soja, o resíduo do milho, após a extração do álcool, não pode ser usado na alimentação. “Não é um resíduo bom, como o farelo de soja, por isso se destinado à produção do álcool o milho fica inviável para consumo alimentar.”

Apesar de o cereal ser considerado como um dos principais “vilões” no que tange ao aumento dos preços dos alimentos, a soja também tem participação nesse processo. A disputa ocorre devido à concorrência que se estabelece entre alimento e energia pela mesma matéria-prima. “A soja está muito bem cotada internacionalmente, contribuindo muito para elevação dos preços, além da alta demanda chinesa”, afirma.

Klein discorda do fato de que o direcionamento da soja para a produção de biocombustíveis esteja refletindo no preço dos alimentos, pois apenas 18% da oleaginosa é usada para a fabricação de combustível, sendo que 70% ficam para a produção de farelo – produto prioritário para o setor alimentício, especialmente carne e lácteos. Na opinião dele, o que tem realmente influenciado nos preços é o aumento da demanda mundial por alimentos. Outro aspecto que, segundo o especialista do IEA tem impactado os valores dos alimentos, é o preço do barril de petróleo, largamente utilizado na agricultura (fertilizantes, diesel para os tratores e colhedoras etc) que sempre refletem nos custos de produção.

A expansão da produção de biocombustíveis de forma descontrolada e sem critérios poderá levar no longo prazo um encarecimento dos produtos agrícolas, assim como o petróleo, que contribui com uma grande parcela no aumento dos preços de produtos alimentares. Isso porque o insumo é muito utilizado na agricultura convencional de larga escala. Na opinião dele, é impossível estimar por quanto tempo a demanda por biocombustíveis estará aquecida. Sabe-se apenas que há um espaço aberto que deve ser preenchido até que outras alternativas sejam viáveis economicamente. Para Torquato, entre as saídas que possibilitariam a redução do impacto é o aumento da produtividade e o uso da tecnologia da hidrólise.