Luiz Gonzaga Bertelli
Bastou que houvesse um aumento no preço do álcool, na entressafra agrícola, para que os críticos da produção alcooleira retomassem as suas decantadas restrições à atividade do setor produtivo do combustível limpo. O Governo Federal, em decorrência, já ameaça reduzir a mistura do álcool anidro, adicionado à gasolina (23%).
A deliberação seria um verdadeiro desastre de planejamento estratégico econômico, eis que o primeiro reflexo dessa postura seria o aumento do preço da gasolina, extraída do petróleo, gerando mais inflação. Em face da legislação federal, a mistura do álcool anidro à gasolina pode variar de 20% a 25%, em consonância com os estoques existentes. Desde o início do Proálcool, em 1975, a economia de divisas com a substituição da gasolina pelo álcool alcançou cerca de 125 bilhões de dólares, considerando os juros sobre a dívida externa.
Conforme os analistas, o abastecimento do álcool tão-somente seria compensador caso o preço do álcool hidratado, empregado nos veículos bicombustíveis, permaneça em até 70% do valor da gasolina nos postos. Essa relação encontra-se, hoje, em torno de 60%.
Para o Ministério da Agricultura, o preço do álcool deverá estabilizar-se em breve, não devendo subir muito mais do que o verificado.
Outro entrave logístico da produção alcooleira é a alíquota de Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS), que varia de estado para estado. No Estado do Pará, por exemplo, a alíquota é de 30%, enquanto no Estado de São Paulo é de 12%.
Ponderam os analistas do Cepea que, se o preço do álcool ficar inviável, novamente, ao consumidor, poderá o proprietário do veículo migrar para a gasolina.
Até o início da próxima safra, prevista para a segunda quinzena de abril, quando estará completamente regularizada a questão do preço, ficará clara a inexistência de uma consistente política de abastecimento para o álcool, como já ocorreu em outras ocasiões. Embora exista legislação, disciplinando a exigência de compra governamental dos estoques estratégicos e reguladores para o álcool, isto ainda não ocorre. Não há hoje incentivos à produção e comercialização do álcool, consoante sucede nas nações mais evoluídas.
Desta forma, o industrial da produção alcooleira é o único responsável pela reserva técnica do mercado. Cabe ao empresário a responsabilidade de financiamento da produção e guarda do volume de álcool estocado. Na falta do combustível, toda a responsabilidade recai na figura do industrial do açúcar e do álcool.
Ademais, quando se contabiliza o custo-benefício do álcool, quase sempre esquecem os analistas de ponderar sobre as efetivas vantagens à população das metrópoles da queima do álcool nos veículos automotores. Com efeito, o álcool polui menos que a gasolina. A identificação desses benefícios não é simples, eis que não há parâmetro único para se qualificar e medir a poluição atmosférica, gerada pelos veículos automotores. Comprova a Cetesb que, independentemente das evoluções tecnológicas, implementadas pela indústria automobilística, os veículos a álcool apresentaram reduções maiores na emissão de CO, HC e NOX que os similares movidos a gasolina.
No que tange à saúde da população, é inquestionável que a maior circulação dos veículos a gasolina irá acentuar a incidência de enfermidades respiratórias e cardiovasculares, consoante o Laboratório de Poluição Atmosférica da Universidade de São Paulo (USP). É comum observarmos um considerável aumento de pacientes com infarto e dor no peito nos dias mais poluídos.
O governo necessita, desta forma, montar um marco regulatório, que forneça estabilidade e alento à atividade produtora, garantindo a expansão da lavoura canavieira e das indústrias. Com 850 Mha, o Brasil tem condições de sustentar economicamente a produção agrícola.
Os empreendedores nacionais e estrangeiros continuam desejosos de investimentos na produção do álcool, inclusive para exportações. A União Européia anuncia que obrigará todos os países a contar com pelo menos 10% de sua frota de carros movida a álcool até 2020.
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