Mercado

Análise do Mercado de Açúcar

O mercado de açúcar em NY fechou a semana com altas entre 7 e 11 dólares por tonelada. Traders fundamentalistas sofrem nesses dias em que a irracionalidade avança com três corpos de vantagem sobre aqueles que fazem a lição de casa, e é potencializada por uma chamada de margem que nas últimas duas semanas foi de nada menos que 50 dólares por tonelada. Mercados assim criam um paradoxo curioso. Hoje, as tradings estão restringindo as fixações por parte das usinas aos embarques imediatos, porque carregam pesadas posições vendidas e isso aumenta o risco de chamada de margem. Ao limitarem o volume de fixações, no entanto, tiram a contraparte vendedora do mercado, injetando mais força para a subida, acarretando em mais chamada de margem. E assim vai. Parece loucura, mas é verdade.

Estimativas da Archer Consulting dão conta que as usinas estão fixadas entre 75% e 90% para a safra 2008/2009, com futuros, opções ou OTC. Para a safra 2009/2010 não houve muita variação desde a última vez em que publicamos a estimativa, ou seja, entre 14 e 17%. Nas últimas 4 semanas o total de dinheiro remetido para pagamento de chamada de margem do Brasil é estimado em US$ 280 milhões. Somam-se a eles os US$ 100 milhões que já estão lá. Isso afeta não apenas o fluxo de caixa das empresas, mas alimenta também a irracionalidade dos preços, pois impele as empresas a recomprar a posição a contragosto e conseqüentemente manter a alta do mercado. Para piorar, comenta-se que muitas estruturas de OTC com níveis de aparecimento e desaparecimento, os famosos knock-ins e knock-outs, foram ativadas, fazendo com que ajustes com prejuízo tivessem que ser feito, implicando em novas compras em NY. Faça seu estoque de Lexotan.

Alguns bancos aproveitam o período de seca das tradings e oferecem às usinas um produto paliativo para a fixação, que pode ser atraente. Imagine que o maio 2008 esteja negociando 14.50. O banco oferece fixação para a usina a 14.47 (ele fica com 3 pontos) e no vencimento da operação, em geral 10 dias antes da expiração do contrato futuro, a liquidação é financeira. Se o mercado fechar a 14 centavos de dólar por libra-peso, por exemplo, o banco paga a usina 0.47 centavos de dólar por libra-peso pela Ptax do dia anterior. O descasamento da operação e, portanto o risco para a usina é a diferença entre o valor para efeito de liquidação e a fixação da usina com a trading. O risco para o banco é se o mercado explodir e o custo financeiro da chamada de margem eliminar a margem estimada na operação, ou seja, no exemplo acima, os 3 pontos. De qualquer forma, é um produto interessante para quem não quer ser assombrado com o fantasma da chamada de margem. O desconto de 3 pontos é meramente ilustrativo.

Eu estava em NY a trabalho no dia em que o índice Nasdaq bateu o recorde de pontos, em março de 2000. Naqueles dias não se falava noutra coisa a não ser a pujança do mercado acionário e a perenidade de cotações cada vez mais altas sob sabe-se lá quais argumentos. Parece até o açúcar de hoje. As principais livrarias da cidade mostravam como best-seller um livro chamado “Dow 40,000 – Estratégias para Lucrar no Maior Mercado Altista da História”, capa dura, custando US$ 85.00 o exemplar, que conjecturava sobre o caminho inexorável das cotações no maior mercado altista de todos os tempos e que o índice Dow estaria caminhando para os 40,000 pontos, blá, blá, blá. Bem, o resto da história todo mundo sabe. A crise das pontocom fez ambos o Nasdaq e o Dow Jones derreterem. Por curiosidade, entrei no site da Amazon esta semana para checar se a tal peça de comédia ainda estava à venda. Sim, está. Por US$ 0,01 mais o frete. Poxa, eu ainda tenho que pagar o frete? O que isso tem a ver com o mercado de açúcar? Bem, acreditar em gurus ou em discursos de arrogantes gestores de fundos convidados para seminários ao redor do mundo, que nunca viram um pé de cana na vida, e pouco se lixam para os fundamentos, pode custar caro, mas na verdade valem menos de US$ 0,01 mais o frete.

Conta-me um amigo do mercado de commodities que estava vendo na semana passada um programa matinal na TV americana sobre investimentos. Nisso, aparece um desses gurus dizendo que a bola da vez, ou seja, o investimento do ano seriam as commodities. Particularmente o cacau, a platina e o açúcar. No meio da conversa o entrevistador perguntou quais os fundamentos que embasavam a sua sugestão, ao que prontamente o guru replicou: “esqueça os fundamentos”. No dia seguinte, em consulta de rotina com o dentista, esse mesmo amigo, sentado na cadeira com a boca escancarada e a saliva escorrendo, ouviu do profissional a pergunta: “Você está no mercado de commodities, não é? O que acha de comprar açúcar?” Por isso, vimos na semana um fundo comprar 10.000 (eu disse DEZ MIL) lotes de calls (opções de compra), preço de exercício de 40 centavos de dólar por libra-peso, com vencimento em Março de 2009, pagando 8 pontos. Quase 900 mil de dólares numa operação de alavancagem de retorno duvidoso. Nada como gastar o dinheiro dos outros.

A correlação do açúcar com petróleo ou gasolina é menor que 0,11 considerados os 300 últimos pregões. Isso significa dizer que se alguém precificar um produto com o outro vai errar 89% das vezes.