Mesmo em plena safra de cana-de-açúcar, o preço do álcool combustível está subindo e já faz com que a gasolina, em muitos casos, seja mais vantajosa para o bolso do motorista brasileiro. Segundo coleta de preços da Agência Nacional do Petróleo (ANP), na primeira semana de setembro valia mais a pena optar pela gasolina em 14 estados do país.
Como o etanol rende menos nos veículos flex, seu preço deve chegar a, no máximo, 70% do da gasolina para valer a pena.
O avanço dos preços do etanol também pôde ser visto no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE.
Segundo o indicador, o litro do etanol ficou 4,21% mais caro em agosto, num período em que, normalmente, seus custos ficam comportados. Pelas informações da ANP, o carioca ainda economiza ao preferir o álcool combustível, já que os preços médios do etanol no Rio equivalem a 66% do custo da gasolina. Mas, em pesquisa feita pelo GLOBO em dez postos do Rio, dois já apresentavam a gasolina como mais vantajosa.
É o caso do Posto Portuário, da BR, na Gamboa, onde o litro do etanol ontem era vendido a R$ 1,999 e a gasolina, a R$ 2,799. Mesmos valores encontrados no Posto Feirense, em São Cristóvão, da Ale.
Os motoristas têm percebido que a vantagem do álcool sobre a gasolina não é mais a mesma. Nas últimas semanas, a estudante de biologia Gabrielle Viana, de 19 anos, tem ouvido reclamações dos pais sobre o que ela tem gasto com seu automóvel. Gabrielle mora na Zona Norte do Rio, frequenta a universidade na Ilha do Fundão e faz estágio no Centro. Além disso, quase todo fim de semana viaja a Arraial do Cabo, na Região dos Lagos. Todo esse percurso é feito no carro flex abastecido com álcool, mas os R$ 60 que costuma gastar semanalmente já não rendem tanto quanto antes: — Para abastecer, estou tendo que completar com o meu salário o dinheiro que meu pai me dá. O álcool está muito caro e, de fato, a gasolina parece estar mais atraente.
Distribuidoras culpam preços dos usineiros O comerciante Marcelo Isao, de 49 anos, ainda não desistiu do etanol, mas não está gostando de ver o preço do seu combustível de preferência subir.
— É possível, sim, que eu passe a encher o tanque com gasolina — afirmou Isao.
O levantamento da ANP mostra que Roraima tem o valor do álcool menos competitivo, custando 83% do preço da gasolina. Já o motorista paulista encontra a melhor relação custo/benefício: tem o etanol mais barato do país, R$ 1,38 por litro — o que equivale a 57% do valor da gasolina.
Isso porque São Paulo concentra a produção nacional de álcool combustível.
As distribuidoras de combustíveis atribuíram a alta nas bombas aos reajustes de preços de venda do produto feito pelos usineiros. Segundo Alísio Vaz, vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), as distribuidoras estão apenas repassando os reajustes feitos pelos produtores de álcool.
Para Vaz, os preços estariam subindo, apesar de este ser o período de safra, porque há uma previsão de colheita abaixo das expectativas iniciais.
Além disso, outro fator que estaria influenciando a alta nos preços do álcool seria o fato de o mercado de açúcar estar aquecido.
— Mas a tendência não é de os preços continuarem subindo, e sim de ficarem estabilizados num patamar um pouco alto — diz Vaz.
Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica, entidade que reúne os produtores de açúcar e álcool da Região Centro-Sul do país, diz que os preços maiores refletem um cenário mais equilibrado para o setor do que em 2009.
— O setor foi afetado pela crise mundial no ano passado, que fez subir o custo do crédito e forçou os produtores a venderem o etanol a qualquer preço para se capitalizarem — lembra Rodrigues.
Usinas dizem que, passada a crise, subiram as margens Hoje, com suas dívidas equalizadas e os preços do açúcar nos níveis mais altos dos últimos anos, observa ele, as usinas têm mais condições de controlar a oferta do produto e obter margens melhores na venda do etanol.
— Mesmo produzindo um pouco mais de açúcar (este ano, 44% da cana moída no país será para a produção de açúcar, contra 43% em 2009) não quer dizer que tem menos álcool. Ao contrário, a oferta está ainda maior — diz o executivo da Unica, explicando que, além de a produção de etanol ter crescido, o país vai exportar menos este ano: 1,5 bilhão de litros contra 2,7 bilhões no ano passado.
O patamar de preços mais altos, admite ele, faz com que o etanol não fique competitivo em relação à gasolina em muitos estados. As exceções seriam São Paulo, Paraná, Goiás e Mato Grosso, que tem regimes tributários mais brandos para o produto. O Rio, além dos custos logísticos, tributa o etanol com alíquota de ICMS acima de 25%, enquanto em São Paulo o ICMS é de 12%, e no Paraná, de 18%.
De acordo com a Unica, o volume de álcool combustível vendido este ano está igual ao de 2009, mesmo com a frota de carros flex tendo crescido, e muito, de lá para cá. Isso significa que há um número maior de carros biocombustíveis rodando com gasolina.
— O mercado este ano não terá a mesma volatilidade do ano passado, quando o preço nas usinas chegou a oscilar 120% durante a safra. O que está acontecendo hoje é que o mercado está mais atraente ao produtor em geral — conclui Rodrigues.