AGRICULTURA e comércio serão os assuntos dominantes da visita que o presidente George W. Bush inicia na quinta-feira ao Brasil. Biocombustíveis são o tema preferencial dos presidentes norte-americano e brasileiro, pois lhes permite aparentar engajamento na questão do aquecimento global. Sobre a mesa -ou então debaixo dos panos- estará também o contencioso comercial que ainda turva essa diplomacia movida a álcool.
Até o final da semana não estava fechada a agenda oficial do encontro entre os chefes de Estado. Apesar disso, dá-se como certo que o álcool dominará a pauta. Bush e Lula devem anunciar protocolos de intenção e talvez algum passo concreto em matéria de pesquisas com o álcool produzido a partir de celulose, ainda mais promissor.
Hoje o combustível renovável é fornecido por duas lavouras, cana no Brasil e milho nos Estados Unidos. Juntas, as duas nações respondem por cerca de 70% da produção mundial. Um processo industrial para extrair álcool de celulose -ou seja, de qualquer resíduo vegetal- ampliaria de modo considerável o potencial produtivo. Ao mesmo tempo, diminuiria o risco de alta nos preços de alimentos por escassez de terras (que afetaria mais os EUA).
Unir esforços de pesquisa, assim, prepara o terreno para que as duas nações mantenham seu predomínio sobre o setor. Em paralelo, ensaiam-se ainda medidas concertadas para padronizar o produto, de maneira a transformá-lo em uma verdadeira commodity internacional. Mais do que a produção, é do interesse de ambos liderar também a venda de tecnologia e o investimento para produção em outros países, como na América Central e na África.
Os interesses comuns de futuro, no entanto, esbarram em divergências presentes. O álcool nacional é mais competitivo que o americano, e por aqui há mais terras para expandir a produção do que por lá. Mesmo pagando tarifa de 14 centavos de dólar por litro, produtores brasileiros despejaram 1,8 bilhão de litros nos EUA em 2006, onde se concedem outros 13 centavos de subsídio por litro de álcool de milho.
A Bush interessa que tais medidas protecionistas não sejam postas sobre a mesa do encontro com Lula. Não só porque destoam da cartilha de livre comércio que apregoa para o restante do mundo mas também porque elas decorrem de legislação ditada pelo Congresso de seu país e válida até 2009. Em seu próprio partido, contudo, o senador Richard Lugar já defende eliminar a sobretaxa, segundo revelou Sérgio Dávila nesta Folha.
Permanece a obrigação do governo brasileiro, porém, de manter o assunto em pauta. Mesmo competitivo apesar da tarifa e do subsídio, e ainda que não seja capaz de aumentar rapidamente seus excedentes exportáveis, o Brasil tem interesse estratégico no tema.
Se parceria e cooperação estão de fato no centro da visita de Bush ao Brasil, essa unilateralidade não passará em branco.