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Álcool combutível: COISA SÉRIA

Foi criado com o apoio do Banco Mundial (Bird) numa época em que o Brasil importava 80% do petróleo consumido e a conta em dólares havia triplicado em dois anos. O segundo choque do petróleo de 1979/80 acabou precipitando a chegada do carro a álcool, que tomou conta do mercado de forma prematura. Dez anos depois, uma crise de escassez causada por equívocos do governo, a leniência da Petrobrás e os próprios usineiros quase liquidaram com o mais bem-sucedido programa de combustível renovável do mundo.

Hoje, sem nenhum subsídio e preço fixado apenas por forças de mercado, o álcool amadureceu como alternativa energética e, principalmente, ecológica. Já atrai investimentos estrangeiros no campo, abre ótimas expectativas de exportação e, graças à tecnologia dos motores flex, compete diretamente com a gasolina e indiretamente com o gás natural. O Brasil, nos próximos cinco anos, aumentará a produção de álcool em no mínimo 30%, podendo chegar a 50% se mais países passarem a usá-lo como aditivo.

Jaime Rotstein, autoridade no assunto, defende que o governo trate o álcool como energético, estimule a desvinculação do açúcar e até crie uma agência reguladora. “Temos que tomar cuidado porque a África inclui países, como Moçambique, que podem se tornar grandes produtores de álcool”, alerta o engenheiro. Vem aí o comércio de seqüestro de carbono (CO2) para controlar o efeito-estufa na atmosfera do planeta e o Brasil pode se beneficiar muito se conseguir atrair novos investidores.

A experiência de três décadas em combustível alternativo, no entanto, não está impedindo que alguns erros se repitam em relação ao biodiesel. Ele é obtido a partir de óleos vegetais (a maioria comestíveis) e 15% de álcool em fábricas de grande porte que retiram a glicerina (ainda por aproveitar) num processo chamado de transesterificação. O biodiesel, a exemplo do álcool, pode ser usado como aditivo (a partir de 2%) ou até substituir o diesel fóssil, além de também controlar o efeito-estufa na fase agrícola.

O programa vem se implantando sem planejamento suficiente. O problema imediato é o da escolha da matéria-prima. Há uma profusão de plantas nativas cogitadas sem a devida pesquisa sobre custos, logística e, em especial, efeitos nos motores e ambientais. No Amapá, o governo estadual acha que pode dispor de oleaginosas como buriti, piquiá, inajá, pracaxi e andiroba. Pouco se estudou, até agora, sobre as especificações físico-químicas finais do biodiesel, obrigatoriamente rígidas, e como se comporta em motores de diferentes concepções e níveis tecnológicos, principalmente os antigos. Órgãos ambientais sérios começam a despertar e podem levar o programa a um indesejável impasse.

A obtenção de óleos vegetais apoiada, em boa parte, na agricultura familiar é considerado outro sério erro estratégico pela unanimidade dos estudiosos independentes. Apenas pesquisadores “oficiais” fazem vista grossa e preferem se render às tais “políticas de governo”. Biodiesel é coisa séria e merece que aspectos técnicos não se misturem com objetivos políticos e voluntarismos já bem conhecidos pelo mal que causam ao País.