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Acidente da BP no Golfo do México chama atenção para biocombustíveis

O vazamento de petróleo da BP no Golfo do México – considerado a pior catástrofe ambiental da história dos Estados Unidos – trouxe à tona a discussão sobre a necessidade de se reduzir a dependência global por óleo a partir do maior uso das fontes de energia renováveis. O momento favorece o potencial brasileiro para a exportação de etanol. A capacidade produtiva do Brasil é de 7 mil litros por hectare, 2.300 litros a mais que nos EUA, de 4.700 litros por hectare.

Além disso, o etanol brasileiro, à base de cana-de-açúcar, inibe a emissão de 61% de gases do efeito estufa em relação à gasolina, enquanto o álcool americano, feito de milho, emite só 21% menos de CO². Mas de todo o biocombustível produzido no mundo, apenas 10% é negociado no exterior, devido às barreiras tarifárias.

– Os EUA reconhecem que o petróleo é uma energia suja, mas por outro lado há um lobby das petroleiras – destaca Henrique Chaves, professor Universidade de Brasília (UnB).

O governo brasileiro está pressionando os EUA para não renovarem o tributo adicional cobrado na importação de etanol, que vence em dezembro. Mas ainda há resistência no Congresso americano, porque a taxa de US$ 0,54 por galão (US$ 0,14 por litro) foi adotada desde 1980 para compensar a isenção fiscal concedida às empresas (nacionais e estrangeiras) que adicionam o biocombustível à gasolina. O governo americano gasta US$ 5 bilhões por ano para manter este incentivo.

– Os EUA deverão manter artificialmente a competitividade do seu álcool, que tem características inferiores ao etanol brasileiro – aponta o coordenador do Instituto de Energia da USP, Célio Bermann.

A tarifa extra forma de 30% a 40% o preço do etanol importado pelos Estados Unidos. Apesar da taxa ser classificada como temporária, já dura três décadas.

– Como a tarifa de importação é mais alta que os incentivos, fica muito difícil para o Brasil escoar sua produção nos EUA, que tem o maior consumo mundial de etanol – ressalta a representante da Divisão de Agricultura e Produtos de Base do Itamaraty, Paula Aguiar Barbosa. – Estamos com várias ações para que esta barreira seja derrubada. Nós tínhamos uma tarifa (de importação), derrubada no início do ano.

Paula lembra que, além da taxa extra, há a tarifa aduaneira para a importação de etanol nos EUA, que varia de 1,9% a 2,5%. Dentre as iniciativas brasileiras para incentivar a compra do álcool pelos americanos está o patrocínio à Fórmula Indi, que usa o biocombustível produzido no Brasil.

Os EUA consomem cerca de 50 bilhões de litros de etanol por ano, quase o dobro do consumido em solo brasileiro (27 bilhões por ano) e esperam alcançar a marca de 136 bilhões até 2022, segundo o diretor-executivo da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Eduardo Leão. “Apenas 3 bilhões de litros de etanol vendidos nos EUA são importados.”

– Deste montante, os EUA pretendem consumir cerca de 80 bilhões de litros (21 bilhões de galões) de combustível não celulósico avançado (como é classificado o etanol de cana-de-açúcar feito no Brasil) – declara Leão. – Por questões ambientais, eles não podem plantar cana com a nossa eficiência.

Apenas 1,5% das terras aráveis são de cana

O Brasil investiu cerca de US$ 20 bilhões nos últimos cinco anos para construir 115 usinas de cana-de-açúcar, chegando hoje a um total de 430, informa Eduardo Leão, diretor-executivo da Unica. Cerca de 15% da cana moída produz etanol, o restante é direcionado para açúcar refinado e bioeletricidade. Segundo ele, o plantio de cana ocupa, em média, 1,5% das terras aráveis do país, o equivalente a 4 milhões de hectares, sem prejudicar a produção alimentícia.

– Só de pastagens, temos 160 milhões de hectares, que são subutilizados – defende Leão. – O país tem, em média, uma cabeça por hectare. Se a proporção fosse 1,5 cabeça por hectare (como acontece em São Paulo), poderíamos liberar 60 milhões de hectares para o cultivo de cana.

Leão explica que toda a cana é usada. “A partir do bagaço, geramos 1,5 vez a energia elétrica de Itaipu, quase 15 mil megawatts por ano, o equivalente a 15% da demanda nacional”, explica.

Leão conta que mais de 40% da frota brasileira são flex fluel (bicombustíveis), quase 11 milhões de veículos. Além disso, a gasolina no Brasil leva 25% de etanol em sua composição.

– Quando o preço do etanol está alto, os consumidores optam pela gasolina e normalmente os preços se ajustam – cita Leão.

Cerca de 30% do álcool consumido no Brasil deixa de pagar uma parte dos impostos, uma perda de R$ 1 bilhão por ano na arrecadação do governo, de acordo com o vice-presidente executivo do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras (Sindicom), Alísio Vaz.

– Podemos ter o álcool definitivamente no mercado interno, mas esta prática ilícita atrapalha.