O comportamento do dólar em relação às principais moedas internacionais não é, no longo prazo, um fator determinante para a formação dos preços das commodities. A afirmação, feita na semana passada pelos analistas do banco de investimento Barclays Capital, contraria uma tese popular e cada vez mais repetida no mercado internacional para explicar as variações de preço das matérias-primas – a de que dólar e commodities oscilam em tendências opostas, ou seja, possuem uma correlação negativa.
Muitos analistas atribuem a explosão das commodities nos últimos anos, em grande parte, ao constante enfraquecimento do dólar em relação a divisas como euro e iene. Essa tese parte da premissa que o valor das mercadorias negociadas em bolsa sobem quando o dólar perde valor e caem quando a moeda ganha força. Isso porque os preços, em dólar, tenderiam a se ajudar ao poder de compra de consumidores que usam outras moedas.
O discurso de que dólar e commodities seguem caminhos inversos voltou a ganhar força nos últimos dois meses, quando um movimento de recuperação da moeda foi acompanhado de uma expressiva desvalorização das matérias-primas. E na semana passada, quando o dólar voltou a se enfraquecer e as commodities reagiram. Mesmo assim, o Barclays Capital tratou de desqualificar a tese. “Não há uma correção inversa consistente entre dólar e commodities, ao contrário do que é assumido por muitos participantes do mercado”, sentenciou.
Em sua análise, o Barclays compara a oscilação dos preços de produtos como petróleo, cobre e milho em diferentes moedas em 2008. “O dólar encontra-se agora praticamente no mesmo nível em que estava no início do ano em relação a uma cesta de moedas importantes. Apesar desse cenário de “neutralidade”, desde o começo do ano, os preços das commodities subiram (ou caíram) em percentuais semelhantes em moedas diferentes”.
Outros exercícios de comparação podem ser feitos, colocando-se frente à frente o índice de commodities CRB e o Índice Dólar (dollar índex), que mede o comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de divisas. No curto prazo, a correlação negativa parece evidente. Em agosto, o índice dólar acumula alta de 4,7%, enquanto o índice CRB recuou 5,2%. Desde o começo do ano, contudo, as commodities como um todo subiram 10%, enquanto o dólar aparece praticamente estável.
Quando os produtos são analisados individualmente, a correlação desaparece. Apesar do “dólar neutro”, a soja subiu 18,4%, o milho, 28,1% e o açúcar, 21,2% desde o começo do ano. O petróleo avançou 25%, em média.
“Até mesmo o ouro (com queda de 3,9% em 2008), que é uma das poucas commodities que deriva do dólar sua variação de preço, caiu na mesma magnitude em todas as moedas”, afirma o relatório do Barclays. “Essa divergência dos movimentos de preço por todas as commodities reflete os diferentes fundamentos desses mercados, e usar a fraqueza da moeda para explicar o risco de oscilação das commodities compromete a compreensão dos fatores reais”.
Analistas ouvidos pela Agência Estado concordam que, no longo prazo, são os fundamentos – isto é, o equilíbrio entre oferta e demanda – que determinam o nível de preços do mercado. Contudo, eles afirmam que a responsabilidade do dólar na escalada das commodities nos últimos anos não pode ser desprezada, ainda que com ressalvas.