O presidente Vladimir Putin sancionou ontem a adesão da Rússia ao Protocolo de Kyoto. Agora já há condições para que as cláusulas deste acordo entremem vigor e 55 países industrializados tenham de reduzir suas emissões de gases causadores do efeito estufa. O setor brasileiro do álcool, que vai fechando um ano de boas notícias, agora tem um motivo adicional para comemorar.

O Brasil vai bater neste ano seu recorde histórico de exportação de álcool.

Serão 2,2 bilhões de litros, aumento de 200% sobre as exportações de 2003, conforme apontam as estatísticas da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica).

Esse total inclui álcool destinado à indústria química e à indústria de bebidas. Apenas de álcool carburante (para motores de veículos), serão 900 milhões de litros, ante 170 milhões de litros em 2003. Os Estados Unidos responderam por 55% do total, ou 500 milhões de litros.Orestante foi para a Índia (150 milhões de litros), a Suécia (100 milhões de litros) e os demais países da União Européia (150 milhões de litros). Seja por causa do endurecimento da legislação ambiental, que vai exigindo a substituição pelo álcool doMTBE– umderivado de petróleo altamente tóxico usado como aditivo na gasolina –, seja emconseqüência da alta do petróleo, cujos preços teimam em ficar em torno dos US$ 50 o barril, o fato é que a utilização do álcool tem aumentado nos Estados Unidos.

As estatísticas da Associação de Combustíveis Renováveis (RFA, na sigla em inglês) mostram que, neste ano, a frota americana de veículos flex-fuel deverá passar de 3 milhões para 5 milhões de unidades. E a demanda por álcool nos três primeiros Estados que estabeleceram o uso do produto em substituição ao MTBE( Califórnia,Nova York e Connecticut) deverá alcançar 5,3 bilhões de litros, o equivalente a 40% da produção brasileira. Odiretor técnico da Unica, Antonio de Pádua Rodrigues, lembra que, no início deste ano, havia no País estoques altos demais, de 1,1 bilhão de litros, e a previsão de safra para este ano era de 330 milhões de toneladas de cana-de-açúcar – 11% amais do que no período anterior. Esses números encarregaram- se de derrubar os preços do álcool ao produtor, que chegaram a R$ 0,39 o litro (anidro) em março, 61% abaixo dos vigentes no mesmo período de 2003. Como os preços do petróleo já vinham galopando, o álcool brasileiro a tão baixos preços acabou atraindo compradores americanos que se dispuseram até mesmo a pagar tarifas de importação de US$140 por metro cúbico.OeconomistaGlauco Carvalho, da consultoria MB Associados, lembra que o custo de produção do álcool brasileiro a partir da cana-de-açúcar é de US$ 0,15 por litro, enquanto o do álcool de milho produzido nos Estados Unidos é de US$ 0,33 por litro. A perspectiva de que houvesse uma quebra de safra em agosto e setembro, aliada ao aumento das exportações, vai embicando para umperíodo de entressafra com estoques perigosamente baixos que, em abril, não deverão passar dos 700milhões de litros, o equivalente a somente 20 dias de consumo. Essa perspectiva de relativa escassez é o que explica a alta de 67% nos preços do álcool (anidro) em comparação com as cotações de abril deste ano. Fica fácil entender que os bons resultados obtidos com as exportações deste ano dificilmente se repetirão no ano que vem, como adverte Pádua. Mas, no longo prazo, as perspectivas são excelentes por dois motivos. Primeiro, porque os preços internacionais do petróleo não deverão cair muito abaixo dos US$ 40 por barril de 159 litros, fator que deverá continuar empurrando muitos governos a apostar no desenvolvimento de fontes renováveis de energia; e, segundo, porque a ratificação do Protocolo de Kyoto pela Rússia deverá criar um mercado adicional para o álcool. AUnica estima que o consumo mundial de álcool, hoje de 30 bilhões de litros anuais, deverá dobrar nos próximos 10 anos, quando as exportações brasileiras deverão atingir os 6 bilhões de litros. Faltou dizer que, para não perder oportunidades, o setor terá de superar, de uma vez por todas, os prejuízos com a imagem negativa que ficou da crise de 1989, quando o abastecimento interno ficou comprometido. “Os contratos de exportação terão de ser de longo prazo e isso exigirá de garantias de que o produto será entregue”, adverte o diretor de Sustentabilidade da PricewaterhouseCoopers, Marco Antonio Fujihara.