Mercado

A economia pode perder um motor

Um dos motores da economia dá sinais de que poderá fraquejar no próximo ano. É bom o governo começar a se preocupar, se é que não começou, com os maus presságios sobre os ganhos dos agricultores em 2005. Outros setores da economia serão afetados, se os produtores agrícolas, depois de anos de prosperidade, tiverem de cortar investimentos e outros gastos. Um novo recorde poderá ser alcançado na produção de grãos e oleaginosas, mas os custos estão em alta e alguns preços, como os da soja e do algodão, tendem a ser menores que os deste ano.

Por enquanto, o governo estima que as lavouras de grãos e oleaginosas, na temporada 2004-2005, deverão produzir entre 128,9 milhões e 130,9 milhões de toneladas, com aumento entre 8,1% e 9,8% em relação ao total deste ano. É uma previsão ainda precária, principalmente porque o levantamento só se refere às intenções de plantio das culturas de verão. O aumento da área para essas lavouras deverá ficar entre 0,8% e 2,2%, segundo a pesquisa divulgada ontem pelo Ministério da Agricultura. Esse aumento dependerá essencialmente da soja e do algodão.

As terras destinadas a arroz, feijão da primeira safra e milho da primeira safra deverão diminuir. Além disso, a estimativa da produção total do próximo ano, com o possível novo recorde, envolve uma porção de pressupostos.

Mesmo que outras classes de lavouras, como as do café e da cana, e a produção animal proporcionem ganhos melhores, a contribuição da agropecuária para o crescimento econômico poderá ser menor do que foi nos últimos cinco ou seis anos. Isto é uma hipótese, por enquanto, mas vale alguma preocupação.

Entre 1999 e 2003, a agropecuária só não cresceu mais do que a indústria de transformação em 2002. Durante cinco anos, a produção do campo acumulou expansão de 29,7%, enquanto a das fábricas aumentou só 7,6% e o Produto Interno Bruto (PIB) total, 6,68%.

A agropecuária contribuiu diretamente com pouco mais de um terço desse crescimento do PIB, uma participação notável. Se for considerado o empuxo dado a outras atividades pela produção agrícola e pela pecuária, a contribuição terá sido certamente bem maior.

Esse crescimento, estimulado em parte pelos bons preços internacionais, impulsionou investimentos no campo. De 2002 para 2003, os projetos da agropecuária aprovados pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passaram de 4.423 para 6.096, com aumento de 37,8%. No mesmo intervalo os projetos da indústria de transformação aprovados pelo banco diminuíram 9,5%, de 16.911 para 16.157.

Neste ano, até setembro, o valor dos desembolsos do BNDES para a agropecuária foi 68% maior que o de igual período de 2003. No caso da indústria, incluída a extrativa mineral, a diferença para mais foi de 29%, mas parte dessa melhora foi recuperação do atraso.

O aumento dos preços do petróleo, dos fertilizantes e do aço pode mudar esse panorama, induzindo muitos agricultores a adiar investimentos e a reduzir o uso de agroquímicos.

De janeiro a setembro, foram vendidas no atacado, no mercado interno, 30,2 mil máquinas agrícolas, 0,8% mais que no mesmo período de 2003, segundo a indústria. A expectativa, de acordo com oMinistério da Agricultura, é que as vendas até o fim do ano fiquem na casa de 32 mil unidades. No ano passado, as vendas haviam chegado a 38 mil e esse número foi 10% menor que o de 2002, mas em 2003, afinal, o País pagou a conta da mudança de governo.

Se fraquejar a agricultura, será bom que o outro grande motor, a indústria, possa funcionar com maior potência. Isso dependerá em parte da exportação, mas principalmente do consumo interno e da motivação dos empresários para investir em máquinas e equipamentos.

Noventa e dois por cento das grandes indústrias e 82% das pequenas e médias planejam investir em 2005, segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria. O principal fator que poderá impedir o investimento, de acordo com a pesquisa, será a incerteza quanto à evolução demanda. Se o governo não reforçar a segurança dos industriais, também esse motor poderá ratear. É um bom assunto para discussão em Brasília – com urgência.