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Infravermelho ajuda a prever safra de cana

Informações obtidas por satélites em órbita da Terra podem se tornar cruciais para entender o que acontece no meio de um canavial cerrado. É o que promete o trabalho de pesquisadores paulistas, que usaram esses dados para estimar, com margem de erro de apenas 2%, qual seria a safra de cana num determinado local.

O modelo, criado por cientistas da USP, do Instituto Agronômico de Campinas e da Unicamp, correlaciona o comportamento do canavial sob a luz solar com a produtividade, mas ainda precisa ser aperfeiçoado. O geólogo Teodoro Isnard Ribeiro de Almeida, pesquisador do IGC (Instituto de Geociências da USP) e coordenador do estudo, diz estar confiante no potencial da técnica.

“Isso permitiria ao proprietário otimizar seus custos. É uma informação barata -ele gastaria cerca de mil reais para comprar uma imagem de uma área de 185 por 185 quilômetros”, avalia.

Em conjunto com a agrônoma Raffaella Rossetto, do Instituto Agronômico, e o geólogo Carlos Roberto Souza Filho, do IG (Instituto de Geociências da Unicamp), Almeida testou o sistema na Usina da Barra, em Dois Córregos (interior de São Paulo). Foram analisados 108 hectares, divididos em 11 talhões (como são denominados os “canteiros” de cana).

Assinatura óptica

O geólogo da USP explica que, em princípio, esse tipo de medição é possível graças às próprias características ópticas peculiares da vegetação. Embora as pessoas enxerguem apenas parte da radiação que vem do Sol (a chamada luz visível, do vermelho ao azul), ondas luminosas com outros comprimentos, como o infravermelho, são muito mais ricas em informação sobre as plantas.

A maior parte da radiação visível é absorvida pelos pigmentos da planta, como a clorofila. Mas a coisa muda de figura quando o comprimento das ondas aumenta um pouco, e o observador chega ao infravermelho. “As plantas chegam a refletir entre 40% e 70% da faixa do infravermelho próximo”, diz Almeida.

“Red edge”

O efeito é tão gritante que ganhou até o apelido de “red edge” (borda do vermelho, em inglês). Usando essa propriedade e um cálculo simples, uma divisão entre imagens no infravermelho próximo (comprimento de 700 a 1.300 nanômetros, ou bilionésimos de metro) e no vermelho (600 nm a 700 nm) deixa as plantas aparecendo em branco e o solo nu em preto, diz o geólogo.

Além desse traço comum a qualquer planta, há detalhes menores que também dão as caras nas imagens orbitais, de acordo com Almeida. A presença de água nas células das folhas e das clorofilas A e B, que são as responsáveis pela fotossíntese, deixa “assinaturas” em alguns comprimentos de onda específicos, do chamado infravermelho de ondas curtas (de 1.300 nm a 2.500 nm).

Nessa mesma faixa, é possível detectar a presença de açúcar, celulose, lignina (a principal molécula “estrutural” dos vegetais, que lhes dá sustentação) e proteínas, embora essas substâncias sejam um pouco menos evidentes. Além disso, os pesquisadores também estimam o quanto as plantas estão transpirando. “Como nós, elas fazem isso para regular sua temperatura. Se não estiverem transpirando, quer dizer que estão com problemas”, diz Almeida.

Esse conjunto de comportamentos espectrais diz muito sobre o estado de saúde de um talhão de cana. “Ao olhar a clorofila, a água, a temperatura da superfície e outras características menores, você passa a ver a vegetação como sistema”, diz o pesquisador da USP.

O teste no campo confirmou o potencial do método. A safra prevista para 2001 pela usina, por exemplo, era de 110 toneladas por hectare, enquanto o resultado real foi de 120,97 -uma margem de erro de 9%. Usando dois satélites e dados de produtividade do ano anterior, os pesquisadores previram 124 toneladas e 127 toneladas, conforme o satélite empregado -redução substancial do erro.

Fugindo do prejuízo

“Isso é importante porque, na lavoura de cana, os contratos de venda são feitos bem antes da colheita, e o produtor fica sujeito a prejuízos se colher menos do que o previsto”, diz Almeida.

Outra vantagem é que, em geral, os agrônomos não adentram os talhões de cana, limitando-se às bordas. Os talhões costumam ficar muito fechados depois que a cana cresce, e não se vê nada além da sua fachada externa. Caso haja uma infestação por pragas, formando um “buraco” no meio da plantação (uma reboleira, como dizem os agrônomos), ela não seria percebida sem as imagens. “Você passa a obter a informação intratalhão [dentro de cada área]”, diz o geólogo.

Ainda há muito trabalho pela frente antes que o modelo se torne operacional. A equipe quer refiná-lo usando dados como a chuva que caiu na plantação e testar a correlação do comportamento espectral com os graus de maturação da planta. Esse último trabalho será feito em parceria com Frédéric Baret, do Inra (Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica, na sigla em francês), em Avignon, na França.

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