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Impacto da política de etanol dos EUA no Brasil

O subsídio dos Estados Unidos ao etanol, juntamente com a tarifa específica de importacão originalmente criada para compensar esse subsídio, termina em 31 de dezembro deste ano. Há uma crescente hesitação entre os membros do Congresso no sentido de estende-lo, até porque custam aos contribuintes mais de US$ 6 bilhões por ano. Além disso, uma série de estudos tem mostrado que o término dessas políticas terá pouco ou nenhum impacto sobre as indústrias de etanol americana ou brasileira. Uma das razões é que o mandato federal americano para produção e uso de combustíveis renováveis, conhecido como Renewable Fuel Standard – RFS, exige que os americanos consumam uma quantidade crescente de biocombustíveis a cada ano, até 2022. Portanto, a demanda por etanol não cairá significativamente, mesmo quando os 45 centavos de dólar por galão de subsídio e os 54 centavos por galão da tarifa protecionista forem eliminados. Como uma ordem, o mandato atua como um mantenedor de mercado para os produtores de etanol dos EUA.

O Brasil argumenta que se a racionalidade econômica para a tarifa de importação de etanol é compensar o subsídio, os produtores de etanol brasileiros são da opinião que, com o fim do subsídio a tarifa também deverá ser eliminada. Permitir que a tarifa expire pode ter importantes benefícios de longo prazo para a economia brasileira, pois o setor tem amplo potencial para expansão das exportações.

É muito importante que o Brasil aproveite o arrefecer do apoio público americano no que diz respeito ao subsídio aos biocombustíveis. Redundância e custos orçamentais elevados (além do fato de que o subsídio aumenta o consumo da gasolina com o mandato) não são os únicos fatores para que os políticos hesitem em estender o crédito fiscal; outras razões incluem a crescente incerteza sobre os proclamados benefícios ambientais e a publicidade negat iva, pois os biocombustíveis são vistos como os primeiros culpados da alta de preço das commodities em 2008. Com o preço recorde do milho e preocupações com a inflação gerada pelo custo dos alimentos, os melhores dias do etanol de milho em receber subsídios e proteção podem ter ficado para trás.

Um subsídio ao produtor custando mais de US$ 6 bilhões por ano permitiria ao Brasil agir como no caso do algodão

A fim de reforçar o seu propósito, o Brasil deve enfatizar que o seu etanol de cana de açucar é muito mais benéfico ao meio ambiente e tem menor impacto nos preços dos alimentos. A principal razão de o etanol de cana ser de longe o biocombustível que menos emite carbono ao ser produzido é porque se obtém o dobro da quantidade de etanol por unidade de terra quando comparado ao etanol de milho. Além disso, a cana de açucar não é um alimento básico e, ao contrário do milho, tem apenas efeito indireto sobre os preços dos alimentos. É melhor para o Brasil produzir etano l e os EUA produzirem milho .

Os EUA e o Brasil esperam benefícios econômicos, ambientais e agrícolas caso a política de etanol de 30 anos seja modificada. Contudo, o Brasil precisa ser vigilante tendo em vista que o cenário político encontra-se salpicado de obstáculos para que ocorra uma reforma significativa no curto prazo. Por exemplo, a administração do presidente Obama indicou apoio para extensão do subsídio, mesmo que sua prorrogação por um ano nas bases atuais custe aos contribuintes mais de US$ 6 bilhões e resulte em pouco ou nenhum adicional de produção interna de etanol de milho acima ou além do atualmente obrigatório.

Enquanto isso há claras controvérsias no lobby do etanol dos EUA, onde alguns argumentam que o subsídios não são mais necessários, enquanto outros estão propondo uma mudança para um subsídio na producão, pago diretamente aos produtores de etanol e não aos misturadores ou blenders (como é o caso do subsídio atual) e baseado nas emissões de carbono.

Apesar de um subsídio à produção destinado apenas a produtores domésticos ser problemática, isso acabaria com a tarifa de importação protecionista. As opções para o Brasil atuar contra os subsídios propostos são várias incluindo lobby ativo, diplomacia, concessões industriais nas negociações de Doha e apelos à Organização Mundial do Comercio (OMC). Um subsídio ao produtor custando mais de US$ 6 bilhões por ano certamente entrará em conflito com o que previsto nas regras de subsídios da OMC, o que permitiria ao Brasil agir como no caso do algodão. De acordo com o Acordo sobre a Agricultura e ao fato de o etanol, segundo o código de tarifas ser classificado como produto agrícola, um subsídio de US$ 6 bi colocaria o EUA acima de seus limites do programa de apoio doméstico.

O Brasil deixou de subsidiar o etanol há mais de dez anos e eliminou a sua tarifa no início deste ano; princípios de justo e livre comércio sugerem que os EUA ajam no mesmo sentido. Send o os maiores produtores mundiais de etanol, esses dois países deveriam colaborar na construção de um mercado de biocombustíveis aberto e global, para prover energia limpa e renovável. Como a tendência parece voltar-se ao subsídio e tarifas dos EUA, é importante que o Brasil mantenha a pressão utilizando todos os canais, incluindo possíveis ações junto a OMC. Com outras questões e disputas comerciais no governo Obama, a melhor coisa que o presidente e o Congresso podem fazer é omitir-se nessa questão, ou seja, deixar a vigência do subsídio e tarifa expirarem nas próximas semanas.

Erika Madeira Kliauga é pesquisadora associada do Departamento de Economia Aplicada na Universidade de Cornell.

Harry de Gorter é professor do Departamento de Economia Aplicada na Universidade de Cornell.

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