Mercado

Gestão do conhecimento agrega valor ao setor

Ex-professor de economia da Universidade Federal de Pernambuco, Pedro Toscano de Britto tem 82 anos de idade, há 52 trabalha com a família Queiroz Monteiro e é personagem de uma das mais novas tecnologias de Recursos Humanos: a gestão do conhecimento. “Seo” Toscano detém o chamado conhecimento tácito, referente à experiência, ao poder de inovação e à habilidade de realizar as tarefas do dia-a-dia. Por dotar esse perfil, releva sua importância dentro do conceito da companhia com visão baseada no conhecimento, cujo principal pressuposto é o entendimento de que empresas são comunidades sociais e o seu principal papel é administrar o conhecimento de forma mais eficiente que seus competidores.

A gestão do conhecimento é considerada uma das mais novas tecnologias de gestão profissional a chegar ao mercado. Mas por que o empresário do setor, envolto em um ano repleto de incertezas econômicas internacionais, e com uma safra 2003/04 às vésperas de ser iniciada no Centro-Sul, dedicará parte de seu tempo – e do bolso – em “mais uma” inovação, dessas que vez por outra surge como salvadora da Pátria? Em uníssono, os consultores dizem que há motivos de sobra para ater-se a essa ferramenta administrativa.

Apesar da recente formalização e de surgir com esse nome no mercado nacional há apenas quatro anos, a gestão do conhecimento, assim como outras ferramentas, dependem de tecnologias como a Internet. “Até por isso ela é nova”, diz Marcelo Corrêa, presidente da Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento – SBGC -, lembrando que a web popularizou-se no Brasil a partir da segunda metade da década de 1990. Segundo ele, a difusão das técnicas do conceito requer intranets ou portais com acesso via senhas.

Para Martiniano Cunha Lopes, consultor da área de serviços da IBM, a globalização e seu impacto no setor sucroalcooleiro são motivos estratégicos para o investimento em gestão profissional, seja qual ferramenta for. “Temos novos players (fabricantes) e nos últimos dez anos o controle de uma dezena de fábricas do interior paulista mudou de mãos”, diz. “A tendência deve continuar até porque os próximos dois anos prometem ser promissores para os fabricantes”.

Paulo de Tarso, também executivo da IBM, reforça outro motivo para se investir em técnicas de motivação: “Quem ficar administrando de forma antiga em pouco tempo fará parte das listas de empresas adquiridas ou das que deixarão de existir”.

Intranet é exemplo de boa tecnologia mal usada

Atentos a um mercado capitalizado, como o sucroalcooleiro, os fornecedores de ferramentas tecnológicas de gerenciamento se voltam mais e mais para as pouco mais de 300 fábricas de açúcar e de álcool. “Menos da metade do setor é dotada desse tipo de ferramenta”, afirma Martiniano Cunha Lopes, consultor da área de serviços da IBM, multinacional reconhecida na área de informática e que tem ampliado sua atuação no ramo de consultorias.

As opções de tecnologias disponíveis são vastas e, mesmo que fossem especialistas em informática, os gestores de recursos humanos (RH) das fábricas poderiam correr o risco de adquirir produtos sem previsão de longevidade da vida útil. É nesse meio que entram os consultores. A idéia é evitar a aquisição de softwares caríssimos ou que não sejam bem utilizados.

Disponibilizada via Internet e que serve para reuniões virtuais entre funcionários localizados fora ou dentro da fábrica, a intranet é um exemplo de tecnologia que anda na contra-mão. “Hoje ela chega a ser pessimamente usada”, atesta Marcelo Correa, presidente da SBGC. “Usam-na para estampar menu de cardápios, listas de aniversariantes ou comunicados que nem sempre são renovados”.

Assim como a intranet, existem tecnologias apropriadas para o RH de custos variáveis ao sabor do cliente. O Grupo Carlos Lyra conclui a implantação da ferramenta de gestão Corpore Recursos Humanos, da RM Sistemas. Ela consome boa parte dos R$ 400 mil investidos na reformulação de cada um dos processos do departamento de recursos humanos.

Composto por módulos, o software engloba desde a automação do ponto até a folha de pagamento, passando pelos processos de recrutamento e seleção, judiciais, pesquisa e avaliação, acompanhamento do contencioso trabalhista, política de cargos e salários e treinamento em medicina e segurança do trabalho. O principal objetivo é aperfeiçoar o processo de gestão de pessoal, uma tarefa com grandes proporções levando em conta o número total de funcionários (São Miguel dos Campos, Maceió e Igreja Nova, em Alagoas); 40% nas usinas do Sudeste (Delta e Conceição das Alagoas, em Minas Gerais); e 10% nas unidades têxteis e de fertilizantes.

Grupo Nova América unifica gestão de negócios

O Grupo Nova América, com sede em Tarumã, SP, uniformiza as informações de desempenho profissional por meio da administração dos negócios divididas em Sistemas de Agronegócio (SAG). São três: um que envolve a cadeia da cana-de-açúcar, do plantio, processamento e comercialização do açúcar e do álcool; outro para o processo de produção da laranja e de sucos e o terceiro abrangendo o processo de comercialização com trading e embarque de produtos por meio do terminal no porto de Santos.

“Esta forma de trabalho integra as áreas em um objetivo comum, pois os indicadores são analisados por SAG e não individualmente”, explica Ana Rosa Girardi, gerente de comunicação social da holding. “Os resultados também fazem parte do Programa de Participação nos Resultados, que envolve tanto áreas agrícolas como industriais”.

Dentre outras ferramentas, o Grupo utiliza pesquisa de clima organizacional com posterior plano de ação para superação de problemas; há ainda um código de conduta para orientar a atuação do profissional na empresa, realização de programas de desenvolvimento pessoal e profissional e a chamada avaliação 360°, em que a linha de comando é avaliada por seu superior, seus colaboradores, quatro clientes – parceiros além de sua auto-avaliação.

O Grupo Nova América optou pela definição corporativa de várias políticas, como de qualidade, meio ambiente, responsabilidade social e recursos humanos.

Conforme Ana Rosa Girardi, o Grupo também emprega ferramentas para gestão do conhecimento como a caixa de soluções, grupos participativos e repasses de treinamento realizados. O saldo é partilhado por outros investimentos da companhia, como o sistema de gestão integrada da Oracle do Brasil, que em 1º de maio próximo chega ao primeiro ano de funcionamento.

Segundo o gerente administrativo e financeiro da holding do Grupo Nova América, Edison Andrade de Souza, os principais ganhos com o sistema referem-se à racionalização do trabalho, confiabilidade dos resultados, unificação da linguagem e agilidade da informação – tempo real. “Por exemplo: a contabilização e controles são automáticos, havendo uma redução do processo de digitação de quase 100 %”.

Outro ganho, diz, está em um processo de solicitação de compras. “O pedido é feito e aprovado através do sistema e, após efetuada a compra, o pedido é resgatado para direcionamento das informações – para qual área o custo será debitado, se é material de estoque, se é despesa, indo diretamente para o contas a pagar”. Ao entrar no sistema, um pedido de vendas inicia todo o processo de emissão de notas, contabilização de vendas, baixa estoque e de contas a receber. “Ainda não foi possível mensurar toda a economia gerada, mas os ganhos principais estão ligados à economia de tempo e eliminação do retrabalho”.

Pioneiro tem projeto-piloto de gestão do conhecimento

Localizada no município de Sud Menucci, no extremo noroeste do estado de São Paulo, a Destilaria Pioneiros convive há um ano com projeto-piloto de gestão do conhecimento. Conduzido pela Conceito Intelligence, de Ribeirão Preto – SP, o projeto, segundo Marcelo Correa, presidente da ABGC e diretor da Conceito, só foi implantado graças à concessão, pela Pioneiros, de requisitos como envolvimento e comprometimento da alta direção; cultura organizacional favorável e relação de confiança para a aceitação de um projeto em aberto.

“O momento financeiro porque passa a fábrica, como outras do setor, também é favorável”, diz ele, cuja empresa presta serviços de informática há mais de uma década para a companhia, comprometimento que ajudou na introdução do projeto de Gestão do Conhecimento.

Correa concordou em revelar o teor do projeto aplicado na Pioneiros. A primeira etapa deve estar concluída em maio próximo, com o preparo da infra-estrutura tecnológica. A segunda etapa, que inclui o mapeamento, tem previsão de ser terminada em dezembro de 2004. Segundo Correa, a opção foi de sinergizar várias empresas de consultoria que já atuavam com a Pioneiros, voltadas a qualidade, RH, sistemas, comunicação e custos, que passaram a ter atuação focada no Projeto Global de Gestão do Conhecimento. Optou-se também por uma solução tecnológica baseada em portais corporativos, ou intranets sofisticadas.

Dentre as etapas do projeto, a primeira foi a de sensibilização: explicar a importância do processo, obtendo comprometimento do grupo. A segunda – planejamento estratégico – baseia-se na análise de cenários, chegando ao plano de ação com prazos, metas e responsabilidades. Nesse caso, utilizam-se continuamente técnicas de inteligência competitiva. O próximo passo são os mapeamentos de processos – até o nível tal que uma só pessoa ou grupo com o mesmo nível de competência execute o processo – e de competências, identificando as competências existentes nos colaboradores.

Memórias organizacionais são outra etapa: criam mecanismos que permitam a fácil memória – arquivo – de todos os documentos importantes da organização, integrando as fontes disponíveis em um portal corporativo. Em seguida virão as Comunidades de Práticas – virtuais e presenciais: estimulando a troca de experiências, a explicitação das melhores práticas etc, interna e externamente. Outra etapa é a dos Estímulos Culturais: sensibilização e adoção de recompensas baseadas no compartilhamento e explicitação do conhecimento tácito, aquele exemplificado pelo veterano funcionário da família Queiroz Monteiro.

O projeto também prevê contratos individuais de gestões com os funcionários da Pioneiros. Esse contrato reúne individualmente metas, plano de aquisição de competências, participação nos resultados, mas sem esquecer a avaliação do compartilhamento pelo grupo – podendo-se usar programas de milhagem pela disseminação de conhecimento no portal.

Investir em criatividade alavanca novos negócios

Os gestores das fábricas podem não dominar a fundo sobre as novas tecnologias disponíveis, mas sabem que, sem dotar os funcionários de conhecimentos, dificilmente obterão 100% de aproveitamento dessas ferramentas. Fora esse know-how, geralmente conseguido por meio de treinamentos, cursos à distância e palestras, os consultores em recursos humanos têm identificado potenciais humanos pouco explorados.

É o caso da criatividade. “Ela favorece observar, enxergar o que todos estão vendo, mas visualizando coisas diferentes”, diz Maria Inês Felippe, consultora de RH e vice-presidente da Associação Paulista dos Administradores de Recursos Humanos – APARH . “Muitos problemas que percebíamos sem solução, com criatividade começamos a perceber novas saídas”.

Segundo ela, outro aspecto interessante é que não basta somente criar ou gerar idéias, mas é necessário analisá-las e implementá-las. A criatividade, assim, não pode ser percebida apenas como um instrumento de soluções de problemas, mas também como alavancagem de negócios e surgimento de novos serviços. Pesquisa realizada pela Pricewaterhouse Coopers ratifica as posições de Maria Inês ao revelar que os profissionais mais valorizados são os realizadores éticos e criativos.

“Muitas vezes é com criatividade que solucionamos problemas internos”, atesta Simone Barbosa, gerente de RH da Usina Santo Ângelo, de Pirajuba – MG. Ela ajuda a administrar o dia-a-dia de cerca de 500 funcionários da empresa e, para manter a serenidade das relações, recorre a métodos simples como campeonatos internos de futebol. “É uma estratégia para unir os mais variados setores da companhia e que tem gerado excelentes resultados”.

Conforme a vice-presidente da APARH, é preciso capacitar e potencializar os funcionários no pensar criativo. “Mas tais pessoas precisam estar comprometidas e envolvidas com o negócio da organização, serem autônomas, formar times de trabalho, ter visão do futuro, estar em contínuo aperfeiçoamento e abertas para um novo pensar, novas idéias”.

SERVIÇO

Marcelo Correa, presidente da Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento – SBGC: [email protected] ou (16) 618.0090 e (11) 5573.7433

Martiniano Cunha Lopes, consultor da IBM Global Services: (11) 3674.3108

Débora Pratali, assessora de imprensa do Grupo Nova América: (11) 3065.956, ramal 425

Maria Inês Felippe, vice-presidente da Associação Paulista dos Administradores de Recursos Humanos: [email protected] ou (11) 3992.7219