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Ex-cavalheiros

Se alguma dúvida havia, não há mais. O usineiro de álcool acaba de comprovar que, se cavalheiro há, não há o que resista à coceira provocada pelo dinheiro, especialmente se está apoiada nos fundamentos do mercado.

E foram os fundamentos do mercado do açúcar e do álcool que atropelaram o acordo de cavalheiros celebrado em janeiro entre governo e usineiros, que pretendeu estancar a alta de preços do álcool combustível.

O gráfico ao lado mostra o que se passa com os preços do irmão gêmeo do álcool. Há um ano, as cotações em Nova York oscilavam pelos 9 cents de dólar por libra-peso (453 gramas). Hoje, estão em torno dos 19 cents.

A alta acumulada é de 100%.

Sobre os preços do álcool, o impacto é maior ainda. Lá por agosto e setembro do ano passado, o metro cúbico (mil litros) de álcool posto em Santos estava sendo negociado no mercado internacional por US$ 270. Em dezembro, já havia saltado para os US$ 380 e agora está nos US$ 580. Isso aí dá um esticão de 115% em apenas sete meses.

No momento, a disparada dos preços do açúcar pouco interfere na oferta de álcool porque a fase é de entressafra no Centro-Sul. Ou seja, não há produção nem de açúcar nem de álcool. O álcool que vai agora para os tanques dos veículos provém dos estoques. A forte demanda está levando o Centro-Sul a antecipar de abril para março a safra deste ano para tentar normalizar o abastecimento.

A União da Agroindústria Canavieira (Única) prevê que, neste ano-safra, a colheita de matéria-prima (cana-de-açúcar) no Centro Sul (85% da produção nacional) seja de 336 milhões de toneladas – 10% maior do que em 2005. Isto é uma produção de 15,5 bilhões a 16,0 bilhões de litros de álcool e 22 milhões a 24 milhões de toneladas de açúcar.

O problema é que mesmo essa boa produção não está dando conta do aumento da demanda.

Graças à grande aceitação dos veículos flex-fuel, cuja frota ultrapassa o 1,2 milhão e deve alcançar 5 milhões em cinco anos, o consumo de álcool no mercado interno tem aumentado a um ritmo próximo dos 10% ao ano.

Mas há uma nova pressão, desta vez internacional. O mundo está descobrindo o álcool como substitutivo ideal da gasolina, tanto porque seus preços já são competitivos, como porque reduz a poluição atmosférica.

Nos dois últimos anos, as exportações ficaram estáveis em torno dos 2,4 bilhões de litros.

Mas as encomendas do exterior estão crescendo. A escalada dos preços internacionais do álcool apenas reflete a novidade.

A resposta do governo à quebra do acordo de cavalheiros foi reduzir a participação de álcool anidro na mistura com a gasolina de 25% para 20%. Se for estendida pelos próximos 12 meses sobrará 1,2 bilhão de litros, calcula o economista Eduardo de Carvalho, presidente da Única. Esse volume será transformado em álcool hidratado e, assim, vai para os carros a álcool.

Mas a ameaça de escassez só está temporariamente afastada. Como a coceira do usineiro não acabará com essas providências, os preços internos podem voltar a empinar. Se isso acontecer, para garantir abastecimento interno, o governo não poderá mais recorrer a acordo de cavalheiros. Talvez tenha de limitar as exportações ou reduzir ainda mais a participação de álcool na mistura carburante.

Os preços da gasolina estão ainda mais altos do que os do álcool. Isso significa que mais gasolina na mistura deve aumentar os preços da gasolina.

As primeiras avaliações mostram que esse aumento de preços pode ser de até 2%. Mas o governo pode impedir que esse avanço aconteça se reduzir o tributo que incide sobre os preços dos combustíveis, que é a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).

Se é para garantir normalidade da oferta será preciso formar estoques reguladores. Como o usineiro está proibido pelo Cade (órgão de defesa da concorrência) de fazer esses estoques, a tarefa é do governo federal.

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