JornalCana

Etanol. Depois da tempestade

O ano de 2012 começa para o etanol brasileiro com uma luzinha ligada lá no fim do túnel, ou melhor, no fim do tanque. Entre as últimas semanas de dezembro e as primeiras de janeiro, foram três boas notícias. Primeiro os Estados Unidos colocaram fim a mais de três décadas de subsídios ao etanol norte-americano, o que inviabilizava o produto brasileiro no maior mercado automobilístico do mundo. Depois o governo federal editou uma medida provisória liberando subsídios de até R$ 500 milhões para estimular a formação de estoques.

Por último, o anúncio foi feito na semana passada, veio a medida mais importante. O Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) criou uma linha de financiamento (BNDES Prorenova) de R$ 4 bilhões para incentivar a produção de cana-de-açúcar pela via da renovação de canaviais antigos e ampliação da área plantada. O programa vai vigorar até o final de 2012 e pretende atingir pelo menos 1 milhão de hectares de cana plantada. Com o aumento da disponibilidade de matéria-prima, a expectativa é que a produção de etanol aumente de 2 bilhões a 4 bilhões de litros entre 2013 e 2014, crescimento de mais de 10% em relação à safra atual de 25 bilhões de litros.

Os problemas

Desde a crise econômica mundial de 2008, que secou as fontes de crédito em todo o mundo, a produção nacional do combustível renovável anda claudicante. Sem dinheiro e com um apoio governamental abaixo do esperado, a lavoura de cana-de-açúcar não foi renovada e muito menos ampliada. Resultado: a produtividade foi lá embaixo, assim como a produção e as vendas.

Em junho de 2009, na média nacional, um litro de álcool valia 56% do litro da gasolina, ou seja, para o motorista era mais negócio abastecer com etanol. Hoje, na média dos postos de Vitória, o etanol sai por R$ 2,46 e a gasolina por R$ 2,81. Para valer a pena, o combustível verde não poderia custar mais do que 70% do valor da gasolina ou R$ 1,96.

A falta de investimentos na lavoura fez com que a safra 2011/2012 fosse 8,4% menor do que a de 2010/2011. Com menos cana, caiu também a produção de álcool, ainda mais com os usineiros optando por produzir açúcar, mais rentável que o etanol, para exportação. Diante disso, nem a redução da mistura de álcool na gasolina, de 25% para 20%, diminuiu a pressão sobre os preços e o etanol disparou nas bombas. É importante destacar que de 2006 para cá os carros flex são os mais negociados do Brasil, com 85% das vendas. Só em 2010, 2,6 milhões de automóveis bicombustíveis deixaram as concessionárias. Ou seja, ao mesmo tempo em que a demanda disparava, a oferta patinava.

Para suprir a falta de etanol no mercado doméstico, o Brasil precisou importar 1,1 bilhão de litros do combustível dos Estados Unidos em 2011. O volume foi recorde e muito superior aos 74,084 milhões de litros importados em 2010.

O que esperar de 2012

As novidades dos últimos dias fizeram com que os especialistas do setor, que andavam meio céticos quanto ao etanol brasileiro, voltassem a se animar. Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), que em artigo recente afirmou que “enquanto o governo americano caminha na direção de incentivar o consumo de combustíveis limpos, o Brasil parece dar uma marcha a ré, optando por sujar a sua matriz de combustíveis”, apesar das ressalvas, elogiou a linha de financiamento aberta pelo BNDES.

“É uma medida positiva, dado que o problema mais grave do setor é a falta de novos canaviais e a renovação dos existentes. Entretanto, o aumento da produção de etanol vai demorar algo em torno de três anos. Isso porque entre a decisão de plantar e o aumento da produção leva tempo. A própria renovação dos canaviais, num primeiro momento, reduz a produção”. Quer dizer, para evitar que o preço do combustível da cana fique ainda mais salgado, as importações de etanol devem crescer em 2012.

Mesmo assim, é um passo adiante. “Poderia ter sido antes, mas pelo menos o passo foi dado. Antes tarde do que nunca”, assinala o consultor em agroenergia Nelson Élio Zanotti. “Desde 2008 o setor não investe em produtividade. Os preços estão altos agora por conta dos erros do passado. Como cana não nasce do dia para a noite, o etanol nacional só deve voltar a ter um preço atrativo para o motorista em 2014 ou 2015”, prevê o especialista.

A abertura do mercado norte-americano e o incentivo do governo à estocagem também foram comemorados, mas os analistas lembram que não adianta pensar em guardar ou exportar se a produção não atender a demanda existente. “Sem sombra de dúvida são ótimas notícias. Com capacidade de estocagem, por exemplo, os preços serão menos voláteis, diminuirá aquela história de valores muito baixos na safra e muito altos na entressafra. Mas para estocarmos ou para exportarmos para o mercado norte-americano temos de ter uma boa produção e boa produtividade. Renovar e ampliar o canavial tem de ser prioridade zero, por isso essa linha do BNDES é tão importante”, argumenta Sérgio Prado, representante da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) em Ribeirão Preto.

Desoneração

Apesar dos avanços, o governo insiste em não desonerar o setor. Uma antiga reivindicação dos produtores de etanol, que é a redução de PIS e Cofins, não foi efetivada. Hoje, a cobrança de PIS/Cofins no etanol, limpo e renovável, totaliza R$ 0,46, enquanto na gasolina, escassa e poluente, é de R$ 0,26.

“Não desejamos mais impostos sobre a gasolina, mas queremos uma carga menor sobre o nosso produto. É preciso construir uma política pública que privilegie o biocombustível. É difícil competir com a gasolina. O governo, via Petrobras, não deixa o preço flutuar, acabamos prejudicados”, sublinha Prado.

Zanotti também defende uma política tributária diferenciada para o etanol. Segundo ele, 70% da movimentação de recursos da cadeia vai para o governo. “A cadeia é longa, estamos falando de um produto agrícola, e os impostos são altos. A falta de um planejamento voltado para o setor tira a nossa competitividade. Veja o caso do Espírito Santo, enquanto que em boa parte dos Estados o ICMS é de 12%, aqui o governo estadual cobra 27%”, critica o consultor.

Análise

Sem efeitos no curto prazo

Enio Bergoli, secretário de agricultura do Estado

O ano de 2012 se inicia com o mercado dos EUA aberto ao etanol brasileiro. Uma oportunidade para o país que chegou num momento de crise no setor: as últimas safras de cana foram reduzidas por problemas climáticos e houve redução de investimentos. Além disso, a produção de açúcar para o exterior tem sido mais estimulante do que a de álcool. A capacidade ociosa das usinas está em 30%, e estima-se que no Brasil a quantidade de veículos abastecidos com etanol caiu de 65% para 35%, em dois anos. A idade média de nossos canaviais é de 3,7 anos, quando deveria ser 2,7. Medidas do governo federal, como financiamento de estoque de etanol e linha de crédito de R$ 4 bilhões para incentivar o plantio de cana, são importantes, mas não geram efeitos no curto prazo. Resultados, somente a partir de 2013 ou 2014. É uma questão de ciclo da cultura. A sinalização de uma política pública foi dada, mas o Brasil precisa avançar mais. Os custos de financiamento do BNDES estão abaixo do mercado, mas acima das expectativas dos produtores. O crédito para 2012 deve ser repetido até 2014, para que as lavouras possam ser renovadas. A desoneração do PIS-COFINS, que é uma realidade para outros produtos do agronegócio, seria estimulante para produzirmos mais álcool com menos custo. Precisamos investir em tecnologias para a obtenção de álcool celulósico, a partir do bagaço e da palha, e não só do caldo (sacarose). Com isso, vamos passar a produtividade de 7 mil para 12 mil litros por hectare de cana.

Inscreva-se e receba notificações de novas notícias!

você pode gostar também
Visit Us On FacebookVisit Us On YoutubeVisit Us On LinkedinVisit Us On Instagram