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Energia para crescer

Há generalizado consenso de que a economia brasileira, considerada a conjuntura mundial, tem crescido aquém das possibilidades. Os principais obstáculos pontuais, como se sabe, são os juros e impostos exagerados, além do câmbio sobrevalorizado. No entanto, toda vez que os setores produtivos, as empresas e os trabalhadores, num esforço de superação, “ameaçam” vencer essas barreiras e promover evolução mais substantiva do PIB, como parece estar ocorrendo neste segundo semestre de 2007, uma nefasta ameaça volta a pairar: o risco de apagão.

Para o Brasil crescer a taxas de pelo menos 5% ao ano, índice mínimo ante o passivo social e a necessidade de atender à expansão demográfica vegetativa, é imprescindível acrescentar cerca de 10 mil megawatts por ano ao sistema gerador de eletricidade. Isto significa que, nos próximos dez anos, o país precisa duplicar a sua capacidade instalada, de aproximadamente 100 mil megawatts.

Na verdade, deveríamos produzir 20 milhões de quilowatts, mas estamos construindo usinas com capacidade somada de apenas dois milhões. Portanto, a defasagem é imensa. Assim, se o quadro não for alterado, com rápida reação, há sério risco de nova crise de energia, revivendo-se os penosos momentos do racionamento de 2001, quando as autoridades, alertadas por nós, ignoravam que tal fato pudesse ocorrer.

Há cerca de 50 barragens hidrelétricas em construção no Brasil, mas não serão suficientes para evitar o risco do apagão, e as previsões de geração de energia para os próximos anos são negativas. Caso não se registrem índices pluviométricos em nível adequado, a crise de oferta de eletricidade pode ocorrer até mesmo em 2008 ou daqui a dois anos. Ou seja, em termos hidrelétricos, não temos o volume que o país precisa para responder aos anseios de crescimento econômico dos setores produtivos. Continuamos na dependência da chuva.

Segundo relatório de fiscalização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), há 23 usinas licitadas desde 2002, significando capacidade instalada que soma 5.157 megawatts. Dessas, 12 ainda esperam a liberação ambiental prévia e cinco aguardam a licença de instalação. É lamentável constatar que, na prática, nada está acontecendo. Parece que o Brasil está fazendo usinas apenas no papel. É nítido o descompasso entre o discurso oficial do governo e a realidade.

Assim, respeitando-se os preceitos ecológicos e a sustentabilidade dos projetos, é necessário agilizar todo esse processo de licenciamento ambiental. Da mesma forma, é impreterível “acelerar” o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), pois a morosidade de alguns investimentos está comprometendo o seu cronograma, e infra-estrutura é uma prioridade nacional! O mais grave é que a ameaça de oferta de energia soma-se a outros problemas sérios, em especial no tocante ao setor de transportes, configurando-se uma equação preocupante.

Recente estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sob o título “Projeto Brasil Competitivo”, mostra que o país perde quase US$ 100 bilhões (precisamente US$ 99,2 bilhões) por ano devido à deficiência de logística. Isso representa 12,4% do Produto Interno Bruto, de US$ 800 bilhões. Segundo a UFRJ, é possível reduzir a perda em 36%, ou seja, US$ 36 bilhões. Economia de US$ 16 bilhões viria do transporte de carga; US$ 16,4 bilhões seriam cortados em estoque; US$ 2 bilhões em armazenagem e US$ 1,6 bilhão em administração.

Além de cobrar as autoridades competentes, é preciso buscar alternativas práticas, como fez a Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp), que firmou convênio com o governo do estado, visando ao lançamento do Programa Paulista de Co-geração de Energia. Esta iniciativa inclui alternativas de biomassa e biogás, fontes renováveis, cuja ampliação na matriz energética brasileira é bastante viável. Esse projeto tem como objetivos desburocratizar o setor e buscar, perante a Aneel, uma regulamentação adequada e linhas de crédito que possibilitem dar sustentação financeira ao crescimento da co-geração.

É intolerável qualquer gesto de resignação diante da deficiência da infra-estrutura, em especial no tocante à geração de eletricidade no país com a mais volumosa reserva hídrica do mundo e a maior área disponível para o cultivo de cana-de-açúcar e oleaginosas, as grandes promessas da matriz energética deste século. Empresários e trabalhadores já têm feito “milagres” para vencer os equívocos dos impostos, dos juros, do câmbio e do “Custo Brasil”. Parece, contudo, que terão de aprender a dança da chuva para conseguir a energia elétrica de que a Nação precisa para o seu desenvolvimento…

* Antonio Carlos dos Reis “Salim” é presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo (Stieesp) e da Federaluz e vice-presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT). Artigo publicado no jornal A Tribuna (AC), em 12/01/2008.

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