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Energia alternativa volta apenas em tempo de crise de investimento

Sempre que o País vive uma nova ameaça de desabastecimento de energia elétrica, a questão das fontes alternativas vem à tona. Foi assim durante a crise de 2001, levando o Governo a instituir o Programa de Incentivo a Fontes Alternativas (Proinfa) através da Lei nº 10.438, de abril de 2002. Um ano e oito meses depois, nada foi feito. Agora, o Brasil está tentando compensar o baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas do Nordeste com o acionamento das térmicas a gás, altamente poluentes. Foram autorizados 370 megawatts (MW), enquanto que somente o bagaço da cana-de-açúcar poderia gerar 1,2 mil MW na Região. Fora o potencial eólico e das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs).

Tamanho contra-senso não se justifica. Além de cara por ser dolarizada, em torno de R$ 150,00 por megawatt-hora (MWh), a energia termelétrica a gás agrava os problemas ambientais já existentes. Se for necessário acionar as térmicas emergenciais, a situação piora. Essas usinas são movidas a óleo diesel ou a óleo combustível, com preço estimado em R$ 300,00 o MWh. Já a biomassa, produzida a partir do reaproveitamento de materiais orgânicos, como bagaço de cana, casca de arroz, lenha, carvão vegetal ou óleo vegetal, é uma energia limpa, renovável e abundante. E ninguém se dá conta disso.

Estima-se que, somente da biomassa gerada a partir do bagaço da cana-de-açúcar, o Brasil possa produzir entre 5 mil MW e 8 mil MW. Para efeito de comparação, a potência instalada das usinas da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), é de 10,7 mil MW. O Proinfa, que não saiu do papel, prevê a contratação de apenas 1,1 mil MW dessa fonte de energia. “Se brincar, o estado de São Paulo leva sozinho esses contratos”, comenta o presidente do Sindicato das Indústrias do Açúcar e do Álcool de Pernambuco (Sindaçúcar-PE), Renato Cunha.

O entendimento do executivo é de que o Proinfa subestima o potencial de co-geração do País. Além disso, as regras ainda não foram definidas. “O Governo precisa definir o valor normativo das energias renováveispara estimular os investimentos”, avalia Cunha. Segundo ele, Pernambuco tem potencial para gerar cerca de 300 MW no prazo de cinco anos, a partir das usinas de açúcar e destilarias de álcool. Essa energia, que hoje está hibernando, seria suficiente para abastecer 700 mil residências com faixa de consumo de 100 kilowatts-hora (kWh) mensais. “Com pequenos investimentos, metade disso (150 MW) poderia ser viabilizado no curto prazo”, afirma.

Atualmente, 15 usinas e destilarias pernambucanas fornecem entre 15 MW e 40 MW à Companhia Energética de Pernambuco (Celpe). O contrato, de três anos, foi firmado no auge da crise de energia, em maio de 2001. Esse modelo, no entanto, não serve mais. “O ideal seria vender em bloco à Chesf e ou à própria Eletrobrás. Para isso poderiam ser realizados leilões ou chamadas públicas independentemente do Proinfa, para que o Nordeste tenha sempre uma reserva nas situações de risco”, diz. Para Renato Cunha, o setor sucroalcooleiro é a alternativa mais viável para a diversificação da matriz energética brasileira.

Sobra da cana poderia ser aproveitada

Desde sempre, a indústria sucroalcooleira é auto-suficiente. Mais: dá-se ao luxo de possuir excedentes energéticos. É justamente essa sobra que poderia ser utilizada para aliviar o nível dos reservatórios num momento de crise iminente como este. Pelos dados do Sindaçúcar-PE, Pernambuco produz atualmente 16 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, por safra, resultando em 2,4 milhões de toneladas de bagaço a mais do que as usinas precisam. Um exemplo. A Usina Trapiche, localizada em Sirinhaém, a 99 quilômetros do Recife, produz cerca de 15 MWh e consome algo em torno de 8,5 MWh. Sobram 6,5 MWh a cada safra.

Numa proporção de 50% para bagaço e 50% para água, o combustível vai para a caldeira onde é queimado e transformado em vapor. Tecnologia e insumos 100% nacionais. O vapor é que faz girar as turbinas que movimentam os geradores. Cada 320 quilos de bagaço gera 640 quilos de vapor. Uma parte é utilizada para fazer funcionar as moendas e a outra pode ser transformada em energia elétrica. Para poder disponibilizar os 320 quilos de bagaço, é preciso processar uma tonelada de cana-de-açúcar, o que dá, em média, 30 kW de potência.

Se as fontes alternativas tivessem sido desenvolvidas a tempo, certamente o País não teria amargado um racionamento em 2001 nem estaria prestes a atingir a curva de aversão ao risco fixada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que fixa um nível mínimo de 10%. Há algumas semanas, os lagos que abastecem as principais hidrelétricas da Região estão operando com níveis entre 13% e 14%.

Além da biomassa, o Nordeste dispõe de um enorme potencial eólico, estimado em 6 mil MW, que poderia muito bem ser utilizado. Instaladas perto de grandes espelhos de água, como o reservatório de Sobradinho, as turbinas poderiam gerar muito mais energia e ainda contar com uma rede de transmissão pronta. Ou funcionar em sistemas híbridos, que combinam fontes de energia renovável com geradores convencionais. No Brasil, as jazidas de vento podem produzir até 20 mil MW. A capacidade instalada, no entanto, é de apenas 20,3 MW.

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