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Cenário adverso faz receita agrícola cair

O cenário desfavorável para o campo brasileiro, decorrente da combinação de fatores como quebra da safra, retração de cotações, aumento de custos, câmbio menos atraente para as exportações e crédito escasso, resultará em queda da receita agrícola (“da porteira para dentro”) proveniente das lavouras de grãos do país em 2005.

Conforme a última projeção da MSConsult, a renda dos grãos (algodão, arroz, feijão, milho, soja, trigo e outros menos importantes) alcançará R$ 58,5 bilhões em 2005. Levando-se em consideração o dólar médio anual de R$ 2,75 previsto pela consultoria, a receita em moeda americana chegaria a US$ 21,3 bilhões, 11,6% a menos que em 2004 (US$ 24,1 bilhões), quando o dólar médio foi de R$ 2,9257, segundo cálculos do Valor Data.

De acordo com previsão da MB Associados – também atualizada após a divulgação da nova estimativa de safra divulgada pela Conab na segunda-feira -, a receita agrícola dos grãos (algodão, arroz, feijão, milho, soja e trigo), será de US$ 20,4 bilhões neste ano, considerando-se dólar médio de R$ 2,78, 16,4% menos que em 2004 (US$ 24,4 bilhões).

Nos casos das duas consultorias, não são as primeiras revisões para baixo. A MSConsult, por exemplo, previa em julho de 2004 receita agrícola dos grãos de R$ 75,3 bilhões, 28,7% acima da estimativa atual. Mas cada novo ajuste traz consigo um novo problema. Nas últimas previsões, a novidade é a envergadura da quebra da produção considerada pela Conab.

O órgão diminuiu sua estimativa para a produção total de grãos na safra 2004/05 de 131, 9 milhões de toneladas, projetadas em dezembro, para 123,4 milhões – ainda assim superior às 119,2 milhões do ciclo 2003/04. Os maiores recuos foram para soja e milho.

No caso da soja, a queda foi de 61,4 milhões (dezembro) para 57 milhões de toneladas, ante 49,8 milhões em 2003/04; no do milho, de 43,1 milhões para 39 milhões, ante as 42,2 milhões de toneladas colhidas na safra passada.

Com essas revisões, que refletem os danos causados pela estiagem no Sul do país, a MB baixou a receita agrícola da soja para US$ 10,37 bilhões em 2005, ante US$ 12,93 bilhões em 2004; já a MSConsult prevê US$ 10,76 bilhões (R$ 29,6 bilhões), com queda de 15,8%. Em julho de 2004, a MS projetava R$ 42 bilhões para a soja em 2005.

Para o milho, a MB estima receita de US$ 4,45 bilhões em 2005, 7,1% menos que em 2004, e a MSConsult trabalha com R$ 12,3 bilhões (US$ 4,47 bilhões). “A queda na estimativa da produção de milho faz muita diferença. Em receita, a cultura perderá a segunda posição para a cana, que deverá render R$ 14,4 bilhões este ano”, afirma Fabio Silveira, economista da MSConsult.

A MB também reviu as previsões para as rentabilidades operacionais dos grãos (relação entre preço e custo de produção). Para a soja produzida em Primavera do Leste (MT), o recuo deve ser de 46%, na safra 2003/04, para uma rentabilidade negativa de 11% em 2004/05. Para o milho de Rio Verde (GO), a rentabilidade também segue negativa (25%, ante 5% no ciclo passado).

Tanto soja quanto milho enfrentam cotações internacionais em declínio desde o segundo semestre de 2004, e tiveram custos de produção cerca de 30% mais elevados, conforme cálculos disseminados.

O mesmo raciocínio vale para o algodão, cuja rentabilidade em Londrina (PR) deverá ser 23% negativa em 2004/05, e para o trigo, que na praça paranaense deverá ter rentabilidade negativa de 15%. Nos dois casos não há estimativas de forte queda da produção no país. Arroz e feijão, produtos típicos de mercado interno, também serão menos rentáveis, de acordo com a MB Associados.

“É um ano complicado. O produtor tem de saber exatamente seus custos para vender na hora certa. Dependendo da estratégia, ele conseguirá minimizar perdas ou obter um pequeno lucro”, afirma Glauco rodrigues, economista da MB.

Paradoxalmente, a situação para os principais grãos ficou tão complicada que, especificamente no caso da soja, já há alento no horizonte. Ele vem das previsões de relativa recuperação dos preços internacionais e domésticos do produto – justamente por conta da quebra brasileira – e do decorrente efeito positivo sobre a receita com as exportações. Uma eventual recuperação também já está contemplada nos cálculos de faturamento “da porteira para dentro”.

No segundo semestre de 2004, as estimativas para as exportações deste ano tornaram-se sombrias em função da gorda oferta mundial. Em dezembro, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) previa que a receita com os embarques do complexo soja (grão, farelo e óleo) alcançaria US$ 8,976 bilhões em 2005, 11% menos que em 2004.

No início deste mês de março, o número foi ajustado para US$ 9,099 bilhões, levando-se em conta produção de 58,3 milhões de toneladas, volume superior ao estimado pela Conab. De qualquer forma, afirmam especialistas, quanto menor a produção brasileira, menor também a pressão sobre as cotações. “Mas esse efeito será limitado pelos elevados estoques globais”, ressalva Rodrigues.

Para as exportações totais do agronegócio, conforme critério do Ministério da Agricultura – que inclui produtos como calçados e celulose -, as projeções mantêm-se estáveis. Levantamento preliminar da MB aponta para US$ 39,1 bilhões neste ano, ante US$ 30 bilhões em 2004. Pesam para isso os bons desempenhos previstos para açúcar, álcool e café, com cotações em alta no exterior – e das carnes, cuja demanda continua aquecida.

Esse efeito já foi sentido no primeiro bimestre. Conforme levantamento divulgado ontem pelo Ministério da Agricultura, as exportações brasileiras do agronegócios alcançaram o recorde de US$ 5,364 bilhões no acumulado de janeiro e fevereiro e garantiram um superávit comercial recorde para o setor de US$ 4,596 bilhões. Para a cana, a MSConsult prevê receita agrícola de R$ 14,4 bilhões em 2005, 17% mais que em 2004; para o café, a renda projetada é de R$ 9,3 bilhões, 17,7% maior.

E, também sob a influência dessas previsões, mas, principalmente da possível recuperação de preços de soja e milho, o campo volta a entrar na lista das preocupações com os índices inflacionários em 2005. No fim do ano passado, as perspectivas dos economistas não incluíam, de uma maneira geral, os produtos agrícolas nesse rol. Mas a situação começou a mudar.

“O que mais preocupa é uma eventual valorização do milho, mas esta dependerá em grande parte do plantio da safra de inverno. Seria uma péssima notícia, pelos reflexos nos custos das rações e, consequentemente, nos preços das carnes”, afirma Fabio Silveira.

Conforme Rodrigues, da MB Associados, como a produção de milho deve cair, os estoques seguirão na mesma direção. Segundo seus cálculos, a relação entre estoque e consumo foi de 12,5% em 2004, e tende a cair para cerca de 3% em 2005. “Dependendo da safrinha de inverno, o percentual zera e teremos de importar”, afirma.

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