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Canadá, as lições que ficam

Poucas vezes e tão rapidamente se formou uma corrente unânime a favor do Brasil e contra um país, como com a crise da “vaca louca”, provocada pelo embargo às nossas exportações por parte do Canadá. Em questão de horas, enquanto nossos pecuaristas acumulavam já seus primeiros prejuízos, a opinião pública mundial – incluindo os próprios canadenses – tinha conhecimento de que interesses econômicos e não sanitários, estavam por detrás da manobra encetada pelo primeiro-ministro, Jean Chrétien.

Todos sabemos que a atitude do governo do Canadá buscou proteger a Bombardier, que vem sendo sistematicamente bombardeada nos mercados pela nossa verde-amarela Embraer. 0 primeiro-ministro canadense fez o papel que mais lhe pareceu conveniente, até porque foi a Bombardier a principal financiadora da campanha do Partido Liberal que elegeu Chrétien, sogro da filha do ex-presidente da mesma companhia e por aí afora.

É claro que a “visita” oficial dos técnicos do Nafta ao nosso País também não passou de jogo de cena já que os canadenses não dispunham de nenhuma prova ou evidência da existência da doença da “vaca louca” nos rebanhos brasileiros. Faltou ao nosso governo a determinação de falar duro e não mandar recados que pareciam “duros” mas que eram na verdade “moles”, já que nada resolviam.

Muitos trabalhadores perderam seus empregos, já que alguns frigoríficos aproveitaram a crise da “louca vaca” para fazer uma “limpeza de curral” em seus quadros de trabalhadores. Por fim, como sempre, quem mais perdeu foram justamente os nossos trabalhadores, que pagaram o pato pela vaca que não era louca mas que foi para o brejo…

Isto nos leva a refletir sobre algumas questões que nos incomodam. Dentre elas, se há de fato a necessidade de importarmos mais de 800 mil toneladas de trigo ao ano do Canadá (equivalentes a cerca de 20% do trigo importado). Não seria mais inteligente investirmos estes milhões de dólares para incentivar, inclusive via Embrapa, o desenvolvimento de sementes adequadas para o plantio de trigo em solo brasileiro, e prestigiarmos a produção nacional?

Já somos os maiores e os melhores produtores – o que inclui produtividade e custos – mundiais de cana-de-açúcar, laranja e soja. Por que não apostar firmemente no trigo verde amarelo? E por que, também, não investir parte dos recursos que enviamos ao governo e aos agricultores canadenses, no desenvolvimento e ampliação do mercado interno de farinha de mandioca e de milho?

0s jornais acabam de informar que o presidente Jacques Chirac declarou que a França se nega a mudar a política agrícola da União Européia antes de 2006. Com isto, os brasileiros que aplaudiram as andanças do “líder” José Bové por nossas terras, podem acreditar que os agricultores ultra-conservadores de direita, que defendem com unhas, “bigodes” e dentes seus subsídios, vão continuar impedindo que os nossos produtos cheguem aos seus mercados. Mesmo custando menos, muito menos!

Derrubar o muro protecionista que os europeus e os norte-americanos construíram em torno de sua agricultura, deveria ser prioridade máxima para todos nós brasileiros, que temos o compromisso com o futuro do nosso País. Até porque é na área agrícola que somos mais competitivos. As dificuldades que o suco de laranja produzido aqui no interior de São Paulo tem para entrar nos Estados Unidos são imensas. E os argumentos que os americanos usam são tão inconsistentes como os usados pelo Canadá com a “vaca louca”.

0 mesmo vale para o açúcar brasileiro que não entra nem nos Estados Unidos e nem na União Européia. 0 ministro Alcides Tápias, do Desenvolvimento, está aparentemente empenhado em criar mercado para o álcool brasileiro lá fora. Nenhum outro país produz álcool ao preço do nosso. Só que isto tudo não muda nada, se nós não trabalharmos por uma agenda, que reúna produtores, trabalhadores e governo, com o objetivo de dar visibilidade ao jogo de interesses dos países desenvolvidos que fecham seus mercados para os nossos produtos.

Não é uma questão ideológica – José Bové, radical de direita, conseguiu “encantar” e trazer para o seu lado algumas lideranças do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), da esquerda. É uma questão econômica que só será resolvida com ações políticas concretas. A rápida articulação dos vários segmentos da sociedade civil em demonstrar seu descontentamento com o Canadá, aponta um caminho que pode ser seguido em defesa de outros segmentos agroindustriais que são prejudicados pelas nações mais desenvolvidas.

Francisco Pereira de Souza Filho é presidente da

Força Sindical do Estado de São Paulo

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