JornalCana

Brasil endurece diante de Chávez

O governo brasileiro conseguiu evitar os maiores danos que poderiam resultar da reunião de presidentes sul-americanos na Ilha Margarita, na Venezuela. Pôs em banho-maria o projeto do Banco do Sul, proposto há meses pelos presidentes venezuelano e argentino, Hugo Chávez e Néstor Kirchner, e apoiado com preocupantes manifestações de entusiasmo pelos colegas equatoriano, boliviano e paraguaio. Nenhum compromisso a respeito do assunto foi assinado e a idéia será totalmente reexaminada, por exigência brasileira. O Brasil não quer comer um prato pronto e faz questão de ir para a cozinha, disse o assessor do Planalto para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia. Além disso, o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, deu um basta à pretensão venezuelana e boliviana de incluir na declaração final do encontro uma referência negativa aos programas de produção de etanol, classificados por Chávez e por seu líder cubano Fidel Castro como nocivos à produção de alimentos e aos pobres de todo o mundo.

Mais uma vez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu contemporizar, diante de uma proposta inconveniente para o País, evitando dizer um rotundo não aos companheiros sul-americanos. A idéia do banco regional continua na agenda, mas a proposta de uma versão boazinha do FMI, com programas de ajuda sem exigências de desempenho, parece ter sido enterrada. O presidente equatoriano, Rafael Correa, era um de seus mais animados defensores. As autoridades brasileiras, nesse caso, parecem ter tido um lampejo de bom senso. Objetivamente, a criação do Banco do Sul não interessa ao Brasil, mas o governo preferiu manter o assunto na pauta, embora para solução em prazo indeterminado. Pode ter preferido esse caminho para evitar um confronto mais duro ou porque tem simpatia pela idéia de um novo banco de desenvolvimento. Este detalhe não ficou suficientemente claro.

Na conversa sobre o etanol o governo brasileiro teve de ser mais decidido. Não podia admitir a inclusão, no comunicado final da reunião, de uma advertência ou de uma recomendação sobre as políticas de produção de cana e de álcool. A rigor, não podia sequer aceitar a discussão do assunto, uma desastrada tentativa de interferência em questões internas do País. A mera sugestão de pôr o assunto em debate, numa reunião de cúpula, foi mais um desaforo dos presidentes Hugo Chávez e Evo Morales, ao qual o governo brasileiro preferiu não responder ostensivamente. Mas liquidou a conversa num encontro ministerial, sem maiores atritos.

Não se evitou, no entanto, que o encontro servisse de palco, ou de picadeiro, para mais um espetáculo do presidente Hugo Chávez. De tanto insistir, ele conseguiu a mudança do nome da Comunidade Sul-Americana de Nações, também conhecida até aquele momento pela sigla Casa, inventada pela diplomacia brasileira. A associação, ou seja lá o que for, foi rebatizada como União Sul-Americana, ou Unasur.

Isso não teria a menor importância prática, se não houvesse um ostensivo esforço do presidente venezuelano para assumir a liderança do bloco – por enquanto mais carnavalesco do que econômico ou político.

Os presidentes concordaram com a criação de um conselho e de uma secretaria-executiva para a Unasur, com sede no Equador. O presidente Chávez propôs para o cargo o secretário-executivo do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, principal porta-bandeira do neoterceiro-mundismo brasileiro. Seria um casamento perfeito, mas nada ficou acertado.

Chávez aproveitou a ocasião para apresentar uma pauta de integração energética, projetada segundo os interesses venezuelanos. Cada participante recebeu uma cartilha com a explicação do plano. Chávez anunciou que a Venezuela retomará a importação de etanol do Brasil, interrompida em outubro, e declarou a intenção de comprar da Argentina uma central nuclear, de que os argentinos por enquanto não dispõem.

Mas esse é um detalhe prático de pouca importância, pois o interesse do presidente venezuelano era mesmo vender seu programa de integração. Entre as sugestões se inclui, também previsivelmente, o aumento do consumo de gás, que a Venezuela terá prazer em ofertar. Por enquanto, a Unasur é isso.

Inscreva-se e receba notificações de novas notícias!

você pode gostar também
Visit Us On FacebookVisit Us On YoutubeVisit Us On LinkedinVisit Us On Instagram