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Bóia-fria ganha bem, diz usineiro

Empresários afirmam que trabalho nos canaviais oferece oportunidade de bom salário a pessoas com pouca instrução

A situação de trabalho dos cortadores de cana-de-açúcar está longe da escravidão e o salário da categoria está acima da média brasileira de remuneração, por isso atrai tanta gente. Essa é a opinião de produtores rurais de cana de pequeno e médio porte e usineiros ouvidos ontem pela Folha.

A maioria foi entrevistada na Agrishow (Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação) de Ribeirão Preto (314 km de São Paulo), que tem no setor canavieiro o maior potencial de lucros -20% do faturamento total, que pode chegar a R$ 900 milhões neste ano.

O cortador ganha em média R$ 2,40 por tonelada de cana cortada, o que rende um salário mensal de R$ 700 a R$ 1.200.

Segundo estimativa da socióloga Maria Aparecida de Moraes Silva, da Unesp (Universidade Estadual Paulista), em reportagem publicada pela Folha no último domingo, a vida útil de um cortador de cana hoje é de cerca de 12 anos, parecida com a do escravo no final da escravidão no Brasil.

A busca por maior produtividade é apontada como uma das responsáveis pelas mortes de 19 bóias-frias desde abril de 2004 no interior paulista, supostamente por causa do excesso de esforço físico no corte da cana. O trabalhador chega a cortar 15 toneladas de cana num único dia.

“O salário está muito acima da média brasileira de remuneração. Por isso é que atrai tanta gente”, disse o usineiro Maurilio Biagi Filho.

“[Os cortadores] são pessoas sem referência de vida na roça. Têm vivência urbana e uma constituição física completamente diferente da do lavrador. Muitos não encontram trabalho na cidade e vêm tentar nos canaviais o último reduto para sobreviver”, disse o usineiro Menezis Balbo. “Garanto que boa parte deles, mesmo assim, ganha mais do que os fiscais que hoje denunciam usinas e fornecedores por trabalho escravo”, afirmou Balbo.

Escolha

Já o professor de agronomia da Unesp Ulisses Rocha Antoniassi, 42, disse que o trabalhador impõe o ritmo de trabalho que quer. “Ele não é obrigado a trabalhar muito, trabalha para ganhar mais porque ganha por produtividade”, afirmou.

“Não é escravo, é um assalariado. Mas todos pegam no pé do produtor. Se contrata é porque o trabalho é escravo, se mecaniza vai causar desemprego”, disse Leonardo Moreira Cunha, 20, filho de produtor de cana em Quirinópolis (GO).

“Estamos transitando entre um modelo que de fato possuía alguns elementos francamente desfavoráveis ao trabalhador rural para um modelo em que as tarefas mais pesadas vão ser feitas pela mecanização”, afirmou o secretário de Estado da Agricultura, Pecuária, Pesca e Abastecimento do Rio de Janeiro, Christino Áureo.

Segundo ele, ao trabalhador rural será reservado um pedaço importante que vai ser mais relacionado a plantio e cultivo. “O empresário novo, mais consciente, vai vencer o empresário que tem uma outra postura.”

Fernando Costacurta, 32, de Ribeirão Preto, que planta cana e arrenda terras em Jardinópolis, Batatais e São José do Rio Pardo, afirmou que, apesar das dificuldades, o trabalho na cana é uma das únicas formas de os bóias-frias ganharem dinheiro.

“Tem o problema do desemprego. Essa mão-de-obra não-especializada vai ganhar dinheiro onde?”, pergunta. “Muitas dessas pessoas saem [da safra] com carro e moto novos. As usinas geram muita renda.”

O fornecedor Luís Carlos Lourenço Batista, 42, de Araçatuba, vai na contramão dos colegas. Ele afirmou que “ainda há muito a melhorar” quando se fala em condições de trabalho dos bóias-frias.

“São só algumas [usinas] que oferecem condições ruins para o trabalhador, é uma exceção. Mas é preciso dar mais dinheiro e uma assistência melhor para essas pessoas”, disse.

Sérgio Prado, chefe do escritório da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) em Ribeirão Preto, disse que a mecanização resolverá o problema trabalhista, mas que é preciso que os trabalhadores sejam qualificados para outras atividades. O diretor-técnico da entidade, Antonio de Padua Rodrigues, limitou-se a afirmar, por nota, que discorda da opinião da socióloga da Unesp.

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