Dentre as rotas para a descarbonização da matriz energética brasileira, a contribuição do setor sucroenergético tem crescido e diversificado a oferta de renováveis.
Além do etanol e da bioeletricidade, desponta no setor a produção de biogás, que por sua vez é fonte para o biometano, combustível equivalente ao gás natural, mas com uma pegada de carbono bastante inferior.
Segundo levantamento da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), nos próximos cinco anos, 65 novas plantas de biometano devem entrar em operação no país, juntando-se às mais de 750 plantas de biogás já em funcionamento.
“O biogás já foi a tecnologia do futuro, mas hoje é uma realidade e está sendo produzida. Há diversos investidores focados nessa indústria, que está pronta para operar”, afirma a gerente executiva da Abiogás, Tamar Roitman.
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Nos próximos anos, inúmeros projetos de biogás devem sair do papel no setor sucroenergético. Entre as usinas que já iniciaram operação de biogás estão a Adecoagro, Cocal, Tereos e Raízen. Em junho, a unidade da Cocal em Narandiba – SP recebeu a certificação do RenovaBio pela produção sustentável de biometano, derivado do biogás, a partir do processamento de resíduos da cana e de atividades agropecuárias (orgânicos agrossilvopastoris). É a primeira planta da categoria a ser certificada no programa brasileiro, segundo registro da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Economia circular
No setor sucroenergético, o biogás segue uma rota diferente da bioeletricidade. Ambos usam como insumos os resíduos do processamento, mas enquanto a bioeletricidade é gerada a partir do bagaço da cana, o biogás é produzido a partir da palha, da vinhaça e da torta de filtro. Cada litro de etanol gera cerca de 12 litros de vinhaça. A partir da biodigestão da vinhaça obtém-se o biogás.
O biogás é fonte de energia elétrica limpa, 100% renovável, além de ser uma alternativa aos combustíveis fósseis, por meio da geração do biometano. Esse biocombustível pode atuar como substituto do diesel e do gás natural, reduzindo as emissões de CO2 em até 95% se comparado aos combustíveis fósseis.
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“Mais de 5% de todo o diesel consumido no Brasil é utilizado no setor sucroenergético, então há um potencial enorme de substituição por biometano na frota da própria usina, consolidando assim a lógica da economia circular”, afirma o diretor de Economia e Inteligência Setorial da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (UNICA), Luciano Rodrigues.
Ele explica que a substituição de parte do diesel utilizado na frota de uma usina por biometano também melhora a pegada de carbono do etanol em quatro vezes, deixando-a em patamares mínimos quando se analisa o ciclo de vida. “Além de ter um novo produto no setor, poderemos melhorar de forma absurda a eficiência ambiental do etanol”, acrescenta o diretor da UNICA.
“A produção de biogás e biometano permite que o setor intensifique o uso da energia solar capturada na lavoura. Passamos a extrair mais energia útil para a sociedade de um mesmo hectare plantado, e ainda mantemos a geração de biofertilizantes que retornam para o campo após a biodigestão”, concluiu Rodrigues.
Expansão energética
De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE 2032), da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, a produção de biometano da vinhaça e torta de filtro seria suficiente para suprir cerca de 20% da demanda de diesel puro do setor agropecuário. Caso se considerem as palhas e pontas, o estudo da EPE avalia que o segmento seria autossuficiente.
No Brasil, o potencial de biogás no setor sucroenergético é de aproximadamente 10,8 milhões de metros cúbicos por ano. Já o de biometano é 7,2 milhões de metros cúbicos por ano, segundo dados do Programa de Energia para o Brasil (BEP), do governo britânico e executado por um consórcio de organizações, entre elas a Fundação Getúlio Vargas (FGV).
O presidente da UNICA, Evandro Gussi, reforça que o setor sucroenergético brasileiro possui experiência e potencial para fornecimento de energia renovável e sustentável, como o biogás e o biometano, em nível escalonável. “Acreditamos que a indústria canavieira será vetor para outros sistemas produtivos que não têm escala para alavancar o aproveitamento de resíduos, em uma dinâmica extremamente orientada a mercado”, destaca Gussi.
Para se ter ideia do incremento nessa indústria sustentável, dados da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), a capacidade mundial de geração de energia elétrica com a fonte biogás no ano 2000 era de 2.455 MW. Durante as últimas duas décadas, houve uma expansão do número de plantas de biogás para geração elétrica, atingindo em 2022 a capacidade instalada de 21.574 MW. Sete países (Alemanha, EUA, Reino Unido, Itália, China, França e Brasil) possuem mais de 70% das plantas de produção de energia elétrica com biogás, no mundo.