Não é de hoje que venho criticando a falta de reconhecimento do Agro do Brasil como protagonista na mitigação de desafios globais, como mudança climática, transição energética e segurança alimentar.
O recente imbróglio envolvendo a Danone e os produtores de soja brasileiros nos alerta sobre quão frágil e equivocada está a imagem do agronegócio brasileiro fora da sua bolha.
Motivos para esse protagonismo não faltam.
Recentemente li uma entrevista do ex-ministro Roberto Rodrigues, a quem tenho uma admiração imensa, que exprime exatamente o que penso. Nele me inspirei e selecionei alguns dados para analisar neste texto. Não é uma questão de narrativa, é fato.
Desde os anos 1990 até hoje, a área cultivada com grãos no Brasil aumentou 111%, enquanto a produção cresceu expressivamente, alcançando 445%. Nesse processo, poupamos cerca de 115 milhões de hectares.
Conseguimos produzir duas safras por ano e, em algumas regiões, até três. Cultivamos em uma área de 62 milhões de hectares, que, considerando as duas safras, equivale a aproximadamente 80 milhões de hectares.
Na área florestal, preservamos 6,5 milhões de hectares de mata nativa, fora outros 10 milhões de hectares de florestas plantadas, em grande parte, destinadas a atividades como produção de lenha, papel e celulose, entre outras.
Quando fazem a contabilidade para o ranking de descarbonização, não levam em conta as nossas captações de CO2, principalmente vindas do Agro, só contabilizam as nossas emissões.
Não somos vilões, somos um exemplo de sustentabilidade e preservação ambiental para o mundo.
Sei que temos ainda como melhorar, pois o aquecimento global e as mudanças climáticas são uma realidade, e estamos trabalhando para isso.
Outro aspecto relevante e que comprova o que estou argumentando é a matriz energética brasileira, que é 48% renovável, em comparação aos 15% do mundo. Isso significa que a nossa participação de energia renovável é três vezes maior do que a média global.
Embora essa informação seja amplamente conhecida, poucos sabem que aproximadamente 25% da matriz energética brasileira vem diretamente da agricultura.
Ou seja, a contribuição da agricultura para a matriz energética do Brasil é percentualmente maior do que toda a participação das fontes renováveis no mundo.
O combustível fóssil, principalmente diesel e gasolina, são os grandes vilões nessa busca por descarbonização, mas, mesmo assim, a produção de petróleo continua aumentando no mundo.
E quem acha que os carros elétricos são a solução para este problema está engando porque temos que levar em consideração qual energia está sendo utilizada para recarregar essas baterias.
São de fontes renováveis ou não?
Se a resposta for não, o problema não foi resolvido. Sem contar os problemas que evolvem o descarte dessas baterias, que é motivo para outro artigo.
Outro mito que tem que ser derrubado é a confusão em relação ao desmatamento.
O desmatamento ilegal deve ser combatido urgentemente. Ele só atrapalha e é crime.
Embora seja difícil ter dimensão exata desse problema, é evidente que práticas como desmatamento ilegal, incêndios criminosos, invasão de terras e mineração irregular precisam ser interrompidas imediatamente.
Mas o que não dá para aceitar é que, principalmente no âmbito internacional, é a associação dessas práticas ao produtor rural.
É um equívoco, uma distorção da realidade, mas de tanto falar acaba se tornando verdade dentro de alguns nichos que não conhecem de fato o trabalho do Agro Brasileiro.
Muitos consumidores globais têm dificuldade até em localizar o Brasil ou entender a complexidade da Amazônia.
Agora não dá para misturar o desmatamento ilegal com o legal. Vamos ser honestos, não existe nada no Brasil que não foi feito em terra desmatada.
Se fôssemos punir o desmatamento legal também, todas as cidades brasileiras teriam que ser erradicadas, as terras produtivas com diversas culturas também.
Por esse motivo, a implementação do Código Florestal, a mais rigorosa legislação ambiental existente no mundo, foi essencial para combater o desmatamento ilegal e fortalecer a imagem sustentável do agro brasileiro no mercado externo, mas ainda está em passos lentos. Um esforço conjunto dos governos federal e estadual é necessário para validar o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e coibir práticas ilegais, enfatizando que os estados de São Paulo e Mato Grosso estão mais avançados neste quesito.
Cabe ao governo federal intensificar a fiscalização, fazer valer de vez o Código Florestal em todas as regiões e promover a regularização fundiária em vários assentamentos de famílias que continuam sobrevivendo de forma irregular, abrindo espaço para oportunistas agirem.
Em 2000, o agronegócio brasileiro exportou US$ 20 bilhões.
No ano passado, esse valor saltou para US$ 166 bilhões, e este ano, devemos superar essa marca.
Ao fazer isso, naturalmente ocupamos espaços que antes pertenciam a outros mercados, o que desagrada concorrentes que ficaram de fora.
Eles, por sua vez, tentam barrar nosso avanço com desinformação e diversas ações, como legislações contra o desmatamento aprovadas na Europa — uma clara medida defensiva. Portanto, precisamos intensificar nossos esforços para eliminar qualquer obstáculo que possa gerar desconfiança sobre nossa agricultura e afetar a confiança dos compradores.
O Brasil está bem-posicionado com tecnologia e terra disponível para aumentar a produção de alimentos em 30% nos próximos dez anos.
A lição de casa da porteira para dentro estamos fazendo muito bem.
Da porteira para fora, vejo muita gente empenhada, mas falta um pouco de visão estratégica, principalmente na parte de comunicação e diplomacia. Os acordos comerciais com grandes consumidores precisam ser melhor amarrados.
O Governo Federal tem que se mostrar de fato parceiro do Agro, que é fundamental para o país, aproximar dos agricultores e investir em uma campanha de comunicação estratégica para valorizar este setor.
Passou da hora de descermos do palanque, de esquecermos a politização partidária e acabarmos de vez com essa polarização que só vem fazendo estragos no Agro e nos mais diversos setores da economia e da vida. Isso não constrói.
E, pelo bem da soberania nacional, quem tem que ceder é o mais forte, e o mais forte é o Governo. Afinal, valorizar o Agro, em sua essência, é valorizar o Brasil.
*Empresário, presidente do Conselho de Administração da Maubisa e membro do Cosag/Fiesp