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Transição energética no campo: o papel das usinas como protagonistas da bioeconomia brasileira 

Leia artigo exclusivo de Antonio Eduardo Tonielo Filho, diretor superintendente do Grupo Viralcool, para a edição 358 do JornalCana

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Artigo exclusivo para a edição 358 do JornalCana

O setor sucroenergético vive uma nova era. As usinas de açúcar e etanol vivem um novo ciclo de protagonismo. Se antes as plantas eram vistas apenas como produtoras de combustíveis e alimentos, hoje elas se posicionam como verdadeiros polos integrados de energia limpa, tecnologia e soluções para a descarbonização. No coração do interior do Brasil, elas se reinventam continuamente para responder aos desafios de uma economia cada vez mais comprometida com a redução de emissões e a diversificação de fontes renováveis. 

A decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) de elevar a mistura obrigatória de etanol na gasolina de 27% para 30% (E30), representa um marco para o setor. A medida reduz a dependência de combustíveis fósseis, deve atrair mais de R$ 10 bilhões em investimentos e pode gerar até 50 mil empregos, segundo o Ministério de Minas e Energia (MME). Mais do que números, trata-se de uma sinalização clara: o etanol é parte fundamental da transição energética brasileira. 

Esse avanço é resultado direto da capacidade de resposta das unidades produtoras. Segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (UNICA), a produção total de etanol no país atingiu 37,3 bilhões de litros na safra 2024/25. Desse volume, 8,2 bilhões de litros foram produzidos a partir do milho, número que representa um crescimento de 31% em relação ao ciclo anterior. A UNEM (União Nacional do Etanol de Milho) estima que o etanol de milho deverá ultrapassar 10 bilhões de litros em 2025, passando a representar mais de 25% da produção total no país. 

A força desse modelo é reflexo da flexibilidade, do potencial de diversificação das usinas, que hoje atuam com diferentes matérias-primas, tecnologias e estratégias. Em estados como Mato Grosso do Sul, que conta com 22 plantas em operação (19 de cana e 3 exclusivamente de milho), a participação do milho já chega a 42% da produção estadual de etanol, conforme dados da Biosul (Associação dos Produtores de Bioenergia de MS). A previsão é que o estado produza 4,7 bilhões de litros de etanol na safra 2025/26, consolidando-se como referência nacional no modelo híbrido de biorrefinarias. 

Expansão da Bioeconomia

Além do etanol, as unidades também expandem sua atuação para outras frentes da bioeconomia. A bioenergia, gerada a partir do bagaço da cana, é fonte renovável estratégica na matriz elétrica brasileira. Já o biogás e o biometano, produzidos a partir de resíduos agroindustriais, têm avançado rapidamente: o número de plantas de biogás cresceu 18% em 2024, totalizando 1.633 unidades no país, de acordo com o Panorama do Biogás 2024 do CIBiogás. O potencial de triplicar a oferta de biometano até 2026 reforça o papel das usinas como hubs energéticos. 

Outro campo promissor é o dos combustíveis sustentáveis de aviação (SAF). Em julho, a Organização de Aviação Civil Internacional (ICAO) reconheceu os benefícios ambientais da produção de SAF a partir do etanol brasileiro, especialmente com uso de culturas sequenciais como o milho safrinha. A Petrobras, por sua vez, já anunciou planos para instalar uma planta de SAF, com capacidade para produzir 10 mil barris por dia pela rota alcohol-to-jet.  

Nesse contexto, as unidades produtoras também são agentes da bioeconomia circular. Muitas aproveitam resíduos orgânicos para geração de energia ou produção de insumos agrícolas, como fertilizantes e ração animal – caso do DDG (grãos secos de destilaria), coproduto do etanol de milho com potencial de exportação para mercados como a China. 

Um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV), publicado pelo Observatório de Conhecimento e Inovação em Bioeconomia, revela que o agronegócio responde por 29% da energia usada no Brasil e por 60% da energia renovável nacional. Sem o agro, a participação de renováveis na matriz energética cairia de 49% para 20%, aproximando-se da média global de 15%, de acordo com a pesquisa. 

O Futuro da Bioenergia no Brasil

Esse desempenho não é fruto do acaso. A história da bioenergia no Brasil é marcada por ciclos de resiliência, ousadia e inovação. Desde o impulso do Proálcool nos anos 1980 até a consolidação do carro flex e a expansão da bioeletricidade nos anos 2000, as usinas vêm ampliando sua atuação, investindo em tecnologia e gerando desenvolvimento. 

Esse conjunto de transformações encontra na Fenasucro & Agrocana 2025 um ambiente privilegiado de discussão, oportunidades e projeção – ainda, para pensar o futuro mais verde e, principalmente, para construí-lo. A estreia da FenaBio, um espaço de conferência e exposição da feira, traz à tona os temas mais estratégicos do momento: biogás, hidrogênio verde, SAF, mobilidade sustentável e captura de carbono. São pautas que reforçam a relevância das usinas na transição energética global.  

A bioenergia não é apenas uma promessa: ela é uma realidade em operação, movida por plantas que aliam produtividade, inovação e compromisso ambiental. A cadeia sucroenergética já provou que é capaz de gerar energia limpa, impulsionar o desenvolvimento e contribuir para que o país seja referência mundial em sustentabilidade. 

Como representantes de um setor resiliente e inovador, temos a responsabilidade de seguir com coragem, técnica, visão e planejamento. As usinas brasileiras não são apenas parte da transição energética, elas lideram esse novo momento da economia de baixo carbono.