Etanol de milho ou de cana? Competição ou cooperação?

Artigo exclusivo para a edição 359 do JornalCana

Nos últimos dez anos, o etanol de milho ganhou destaque na produção de biocombustíveis no Brasil.  

Inicialmente, especialistas duvidavam que a produção de etanol a partir do milho fosse viável no país, comparando com a experiência dos EUA, onde a produção utilizava carvão e gás natural.  

Havia também preocupações sobre a competição do milho para biocombustíveis com sua utilização para alimentação humana e animal.  

Entretanto, a experiência americana demonstrou que a expansão do uso do milho aumentou a produtividade e garantiu renda para os produtores.  

Este aumento não fez com que os preços subissem de forma significativa.  

No Brasil, a produção de milho cresceu muito, especialmente no Centro-Oeste, devido à adoção de novas tecnologias na cultura da soja, consorciada com milho.  

Isso resultou em uma abundância de milho, superando a capacidade de armazenamento e transporte, e os preços caíram. 

Oportunidade e Logística do Etanol de Milho

Com o excesso de milho, surgiu a ideia de produzir etanol a partir desse cereal.  

A logística já existente permitiu que o Brasil aproveitasse essa oportunidade, e a produção de etanol de milho passou a ser vista como uma alternativa vantajosa.  

O custo de capital para grandes plantas de etanol era muito menor e a capacidade de produzir e estocar milho durante o ano inteiro também contribuía para essa viabilidade.  

Além disso, o uso de biomassa de florestas de eucalipto já existentes como fonte de energia se mostrou uma possibilidade atrativa.  

Embora a produtividade do etanol de milho por hectare seja inferior à da cana-de-açúcar, a análise de ciclo de vida mostrou que as emissões de carbono seriam reduzidas, principalmente para o milho segunda safra.  

O processamento do milho utiliza menos energia, e as usinas que conhecem a origem do milho têm as melhores notas ambientais, recebendo mais CBIOs.  

O etanol de milho, sendo mais barato, oferece margens melhores para comercialização, enquanto a venda de subprodutos ajuda a estabilizar os custos. 

Cana-de-Açúcar e Integração de Produções

O resultado é o crescimento exponencial da produção. 

A cana-de-açúcar, por outro lado, ainda possui grande resiliência. 

A indústria de cana no Brasil se adaptou e evoluiu com a economia, e continuará a ser produzida devido à biorefinaria da cana, que gera açúcar e etanol de forma sinérgica.  

Embora haja volatilidade nos preços do açúcar, a diversificação da produção permite enfrentar esses desafios.  

O etanol de milho, embora forte, não possui um segundo produto além do próprio etanol, o que pode ser uma desvantagem em casos de redução na demanda.  

A produção de etanol de milho por si só não resultará em queda nos preços, pois os produtores tendem a preservar suas margens.  

A questão da biomassa também é importante, pois com o aumento da produção de etanol de milho, a biomassa de eucalipto está se tornando mais escassa, enquanto a cana ainda possui amplas reservas que podem ser aproveitadas.  

O futuro parece estar na integração das produções: a cana com milho, soja, gado, etanol para SAF, biogás e biometano, biochar e fertirrigação para a lavoura, ILPF e até a energia solar. 

Esse sistema integrado pode enriquecer a produção agrícola e aumentar a eficiência.  

A cana ainda tem potencial para dobrar sua produtividade, e a competição com o milho poderá se transformar em cooperação, com ambos se beneficiando dessa integração.  

Jaime Finguerut

Diretor e membro do Conselho do Instituto de Tecnologia Canavieira (ITC)