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Alguma dúvida sobre a importância de uma gestão de risco eficiente?

Uma usina que produz 100 mil toneladas de açúcar e deixou de capturar as oportunidades que o mercado ofereceu ao longo dos últimos 12 meses perdeu pelo menos R$ 40 milhões em receita potencial

top view of a wooden spoon with white sugar and brown sugar cube on black background with copy space
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O cenário atual do mercado de açúcar deveria servir como um alerta inquestionável. Uma queda acumulada superior a 80 dólares por tonelada neste ano é um movimento que impacta diretamente a receita e a sustentabilidade financeira de qualquer usina. Não é um detalhe conjuntural, mas um fato que expõe com clareza uma vulnerabilidade estrutural: a ausência de políticas consistentes de gestão de risco.

É interessante observar que, ao longo das últimas décadas, as usinas brasileiras investiram com determinação em diversas frentes: melhoria dos equipamentos, introdução de variedades mais resistentes e produtivas de cana, avanços significativos na parte industrial, modernização das práticas agrícolas. Cada um desses passos foi dado em nome da eficiência, da competitividade e da sobrevivência em um mercado cada vez mais globalizado e competitivo. Contudo, a gestão de risco, que deveria caminhar lado a lado com esses investimentos, permanece relegada a segundo plano.

O resultado é concreto e mensurável. Uma usina que produz 100 mil toneladas de açúcar e deixou de capturar as oportunidades que o mercado ofereceu ao longo dos últimos 12 meses perdeu pelo menos R$ 40 milhões em receita potencial. Esse número não é uma abstração, tampouco um cálculo hipotético: ele representa valor real que foi desperdiçado por falta de visão estratégica.

É, em termos práticos, o equivalente a abrir mão de um faturamento inteiro simplesmente porque não havia uma política de hedge estruturada.
Persistir nesse modelo é perpetuar um equívoco histórico: o de acreditar que apenas a eficiência operacional é suficiente para sustentar resultados consistentes. Não é.

A Importância da Gestão de Risco

A volatilidade dos preços internacionais, somada às incertezas políticas, cambiais e macroeconômicas, transforma a gestão de risco em um pilar indispensável da governança corporativa. Produzir bem e com eficiência é necessário, mas não garante a proteção da margem. Ignorar a gestão de risco significa expor o negócio a oscilações que podem comprometer anos de esforço e investimento.

A gestão de risco não deve ser vista como uma limitação, mas como um instrumento estratégico de proteção e de geração de valor. É ela que assegura previsibilidade de caixa, estabilidade de margens e, principalmente, a tranquilidade de atravessar períodos de turbulência sem comprometer a saúde financeira da empresa. É uma postura profissional, madura e alinhada às melhores práticas de governança.

Vale aqui uma reflexão: se uma usina investe milhões em equipamentos industriais de última geração, em tecnologia de plantio, em programas de sustentabilidade, por que continua tratando a gestão de risco como uma questão secundária, ou pior, como um custo desnecessário? Não faz sentido modernizar todos os elos da cadeia e, ao mesmo tempo, manter a área mais sensível — a que garante o resultado financeiro — dependente da sorte ou da “torcida” por altas de preços.

Mercado de Derivativos como Proteção

O mercado de derivativos oferece instrumentos capazes de estruturar estratégias de proteção sem necessariamente eliminar a possibilidade de ganhos adicionais. É possível, sim, estabelecer pisos de remuneração que assegurem viabilidade econômica mesmo em cenários adversos, ainda que isso implique eventualmente em renunciar a parte de um movimento de alta. Essa não é uma perda, mas um preço pago pela segurança — e segurança, neste caso, significa continuidade, previsibilidade e sustentabilidade do negócio.

Não há como fugir da conclusão: gestão de risco não é acessório, é essencial. A usina que continuar adiando essa decisão estratégica estará, inevitavelmente, colocando em risco não apenas seus resultados de curto prazo, mas a própria perenidade de sua operação. O futuro pertence às empresas que compreenderem que eficiência produtiva e proteção financeira precisam caminhar juntas.

Arnaldo Correa

Consultor, palestrante, técnico para arbitragens e professor de gestão de risco em commodities agrícolas