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Aproveitamento total

Da polpa, rica em gordura, obteve-se o óleo. A partir do caroço, foi possível produzir etanol. A mistura desses dois materiais básicos, provenientes de uma única origem, o abacate, deu origem a um biodiesel de qualidade, segundo uma pesquisa desenvolvida na Universidade Estadual Paulista (Unesp). Os 100% de aproveitamento de uma matéria-prima proveniente do abacateiro (Persea americana), fizeram com que o experimento apresentasse um custo mais baixo, se comparado ao biodiesel da soja. Aliado a isso, ainda está o fato de o Brasil estar em terceiro lugar no ranking mundial da produção do fruto. São cerca de 500 milhões de unidades cultivadas em todas as regiões brasileiras durante o ano, sendo São Paulo um dos estados! de maior destaque.

De acordo com o estudo, o teor de óleo presente no abacate maduro pode variar de 5% a 30%, dependendo da espécie. Por esse motivo, o fruto é visto como um produtor de biodiesel em potencial. “A média na região de São Paulo, o maior estado produtor, é de 16%. A soja, que é a matéria-prima mais usada hoje, apresenta uma média de 18% de teor de óleo no grão”, explica Manoel Lima de Menezes, professor do Departamento de Química da Faculdade de Ciências da Unesp, em Bauru.

De acordo com ele, a produtividade também é considerada excelente, com possibilidades de extração de 2.200 a 2.800 litros de óleo por hectare, em média. “Com a soja, é possível obter 450 litros. Porém, ela acaba ganhando em extensão. O grande diferencial, no entanto, é que o álcool usado para a produção do nosso biodiesel é obtido a partir do caroço do abacate. Já na soja, é preciso obter a matéria-prima de outra fonte”, destaca, lembrando que o custo é um dos maiores atrativos. “O! abacate é uma matéria-prima em abundância no Brasil. Para se ter uma ideia, contei com várias doações de amigos que cultivam a planta no quintal de casa, e vários frutos se perdem ao longo do ano. No estado de São Paulo é possível encontrar o quilo por uma média de R$ 0,20”, conta.

Secador

O desafio inicial da pesquisa da Unesp era conseguir desidratar a polpa do abacate para extrair o óleo sem estragá-la. Isso porque o fruto, naturalmente hidratado, é bastante cremoso. “Consegui desenvolver um secador rotativo, que desidrata a polpa processada sem ressecá-la ou queimá-la. Para desenvolver o aparelho, utilizei materiais obtidos em ferro velho”, destaca Menezes. Depois do processo de desidratação, segundo a pesquisa, o material passou por uma prensa industrial semelhante à da soja e seguiu para o processo de extração com solvente (veja arte). “O excesso de solvente é retirado por meio de um processo de destilação simples. Com isso, obtivemos o óleo bruto, posteriormente purificado”, diz o pesquisador.

Numa segunda etapa da pesquisa, Menezes deu início ao processo de obtenção do etanol, a partir da trituração do próprio caroço do abacate. No caso do biodiesel produzido a partir da soja, por exemplo, o álcool precisa ser obtido de outras fontes, fator que encarece o preço final do produto. “Me baseei no método de Ferrari. A relação usada foi de um litro de óleo de abacate para seis litros de álcool. Em seguida, dissolvi o hidróxido de sódio no álcool (catalisador), nas proporções ideais, e mantive as duas substâncias a 60º C. Depois da ocorrência de uma reação, dei seguimento aos processos de purificação, separação e lavagem para retirada do excesso do hidróxido e sabões que se formaram. Por fim, a mistura passou por um processo de destilação a vácuo para a retirada do excesso álcool. O biodiesel ficou pronto”, explica o cientista.

De acordo com Menezes, o produto final precisa estar em conformidade com as regras de uma resolução da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que estabelece a especificação para a comercialização de biodiesel. “Nesse documento estão estabelecidos os valores a serem seguidos com relação a viscosidade, teores de éster, densidade, quantidades de resíduos, entre outros quesitos”, afirma, lembrando que o biodiesel de abacate conseguiu atender aos 23 quesitos exigidos pelo governo para produção.

Redução de custos

Segundo especialistas, o surgimento de novas fontes para obtenção do biodiesel podem contribuir para a redução de custos. O grande temor pela soja é que ela, como qualquer outra commodity de exportação, sofre diretamente as oscilações da moeda e preços internacionais, além do risco de escassez. Para o especialista Univaldo Vedana, responsável pela primeira fábrica de biodiesel do país, cada uma das regiões brasileiras oferece um leque de matérias-primas diferentes, fator que só tende a somar na produção do biodiesel. É o caso do abacate, que foi amplamente estudado pela Unesp. “Desde que haja uma escala de produção, óleos como o de abacate são excelentes para a produção desse combustível”, enfatiza.

Para o engenheiro mecânico e professor da Universidade de Brasília (UnB) Alessandro Borges, cada uma das plantas consideradas promissoras na produção do biocombustível apresentam características próprias. “A mamona, na minha opinião, oferece baixo rendimento, por conta do óleo, que é mais viscoso. Porém, se adicionada ao diesel de petróleo, oferece bons resultados”, diz. A partir de janeiro do ano que vem, entrará em vigor a mistura B5, ou seja, todo o diesel vendido no Brasil deverá conter 5% de biodiesel. “São etapas impostas pela ANP para introduzir o combustível aos poucos. O intuito é aprimorar cada vez mais a técnica”, finaliza Borges.

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