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Quanto é a dívida líquida do setor hoje?

Gerente sênior de relacionamento do Rabobank responde

O impacto sobre o etanol pode afetar também os preços de açúcar em reais, diz Queiróz

“Essa crise é uma crise sem precedentes e de desfecho pouco previsível, mas em geral seus impactos devem se dar no curto ou médio prazo, entre seis e quinze meses”, afirma Manoel Pereira de Queiróz, gerente sênior de relacionamento do Rabobank no Brasil, ao abordar os desafios do setor sucroenergético diante da pandemia e da guerra do petróleo, em entrevista exclusiva ao JornalCana.

Segundo Queiróz, os fundamentos de longo prazo do setor continuam bons, portanto, o importante é passar pela crise e isso deve ser feito adiando todos os investimentos que não sejam absolutamente necessários, assim como protegendo o caixa. “Nós do Rabobank, assim como nossos principais concorrentes e até o próprio Governo, estamos fazendo nossa parte, apoiando os nossos clientes para que eles consigam suportar essa travessia”, assegurou.

Confira a entrevista exclusiva:

Na sua opinião, quais os principais impactos que a crise petróleo/COVID-19 trará ao setor canavieiro?

O principal impacto é sobre o consumo de combustíveis e consequentemente sobre o preço e consumo de etanol. Alguns analistas atestam que o consumo de combustíveis de ciclo otto no Brasil caiu mais de 50% e que essa queda pode chegar a 70% no pico da infestação, esperada para ocorrer no fim desse mês ou início de maio.

Queiróz é gerente sênior de relacionamento do Rabobank no Brasil

Trabalhamos com uma expectativa de que a crise econômica gerada pela COVID-19 dure cerca de 6 meses e que a partir de então a atividade comece a se recuperar, normalizando-se até junho de 2021. É importante também lembrar, que o impacto sobre o etanol pode afetar também os preços de açúcar em reais, uma vez que todas as usinas devem alterar seu mix ao máximo, dentro das suas respectivas possibilidades, aumentando consideravelmente a oferta do produto no mercado mundial.

Esse risco, no entanto, é mitigado pela forte depreciação do real e pelo fato da grande maioria dos grupos sucroenergéticos ter aproveitado as excelentes oportunidades que tiveram até fevereiro para fixar os preços da safra 20/21 em ótimos níveis.

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Outros impactos possíveis dizem respeito à descontinuidade de negócios, ou seja, as empresas, por motivos endógenos (como por exemplo contaminação dos funcionários) ou exógenos (como parada no escoamento ou na cadeia de suprimentos), terem de suspender suas atividades, parcial ou totalmente, por algum tempo. Embora possível, ao menos até o momento, nos parece pouco provável.

 

Algumas usinas melhoraram em relação à safra 18/19

Como estava a saúde financeira das usinas brasileiras até então e como pode ficar a partir da crise?

Ainda não recebemos os balanços da safra 2019/20, que são fechados em 31 de março para a grande maioria dos grupos. Pelo que pudemos perceber pelos balancetes do terceiro trimestre, fechados em dezembro, os grupos que permanecem em atividade comercial normal (cerca de 70% das empresas) melhoraram em relação à safra 18/19. De forma geral, a crise os pegou menos endividados, com maior investimento feito nos canaviais e com melhor liquidez.

Por outro lado, a depreciação do real frente ao dólar deve prejudicar os balanços, sobretudo das empresas cuja dívida conta com maior participação de moeda estrangeira. Já a safra 2020/21, na qual estamos entrando, a tendência é de fluxo de caixa negativo e consequente aumento de dívida sobretudo para as empresas mais alcooleiras.

Qual é a dívida líquida do setor hoje?

É difícil estimar, para isso precisaríamos responder a três diferentes perguntas e consolidar as suas respostas:

– Qual o efeito que a alta do câmbio teve na dívida de cada usina, e qual seu mix de dívida dólar/real?

– Quais empresas fecharam com fluxo de caixa positivo antes dos investimentos?

– No caso das empresas com fluxo de caixa positivo, quais delas destinaram os recursos para diminuir dívida e quais os destinaram para outros fins, como pagamento de dividendos e/ou aumento dos investimentos?

Meu palpite é que na data de fechamento dos balanços, a dívida liquida deve ter permanecido estável em torno de 80 bilhões de reais, mas só saberemos de fato quando começarem a chegar os números auditados, por volta do mês de junho.

 

Dívida líquida do setor deve continuar estável, em torno de 80 bilhões de reais (Foto: Divulgação)

No final do ano passado, havia uma desigualdade no setor em relação às dividas, com um GAP no endividamento… e agora?

Há um enorme GAP, não só no endividamento, mas também em todos os demais indicadores financeiros e operacionais. As crises, quaisquer que forem, só tendem a aumentar esse GAP.

 

 

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Na sua visão, qual a saída para o setor não se afundar mais em dívidas?

Não gosto de generalizar para o setor, pois há usinas que são pouco endividadas e que mesmo nos piores momentos continuaram gerando caixa e até investindo em expansão.

O exemplo dessas empresas é claro:

– Muito capricho na operação, que significa cortar custo acima de qualquer coisa, sem descuidar do investimento em manutenção e renovação do canavial;

– Trabalhar com elevada liquidez, ou seja, manter dividas sempre em prazos semelhantes aos do ciclo da cultura (5 a 7 anos) e possuir dinheiro em caixa, idealmente o suficiente para liquidar todas as suas dívidas financeiras dos próximos 12 meses.

Quanto à segunda recomendação, obviamente não se consegue isso da noite para o dia, mas é o sentido no qual todas as empresas deviam caminhar. Há empresas, contudo, que já passaram do ponto, para essas somente a injeção de capital resolve, seja através de dinheiro dos próprios acionistas ou de um novo acionista que assuma o negócio.

 

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