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Com preço e demanda melhores que o etanol, açúcar assume protagonismo

O setor sucroenergético sofre os impactos causados pela pandemia do coronavírus e pelos efeitos negativos da queda do preço do petróleo, que deixam o etanol cada vez menos competitivo em relação à gasolina. Medidas provisórias tomadas pelo Governo Federal poderiam dar um fôlego ao segmento e elas já estão no forno à espera da aprovação do presidente Jair Bolsonaro — Atualização: Bolsonaro afirma que não aumentará a CIDE

Isso é o que afirma o deputado federal e presidente da Frente Parlamentar para Valorização do Setor Sucroenergético, Arnaldo Jardim. Segundo ele, o Ministério da Economia decidiu aumentar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) em R$ 0,20 por litro para a gasolina, passando o tributo de R$ 0,10 para R$ 0,30 por litro e taxar as importações do combustível fóssil em 15%.

Já a redução temporária da carga tributária federal aplicada ao etanol hidratado PIS/Cofins sobre o biocombustível, que é de cerca de R$ 0,24/litro hoje, também solicitada pelo setor, não foi aprovada pelo Ministério da Economia — e até aqui vetadas pelo presidente Bolsonaro. “A taxa de importação é de aplicação imediata. A CIDE valerá só em 90 dias, pois a elevação do tributo exige noventena para entrar em vigor, mas dá um sinal de preço. Tendo esse sinal de preço, as coisas evoluem e na semana que vem, vamos acertar o programa de warrantagem para armazenagem do etanol. São boas notícias que dão um fôlego para o setor”, comemora o parlamentar. Atualização: Arnaldo Jardim apresenta projeto de lei para impedir importação de combustíveis

O financiamento para warrantagem possibilitaria manter nos estoques 6 bilhões de litros do biocombustível, volume equivalente a quase 25% da produção da safra 2020/21, de acordo com Evandro Gussi, presidente da União da Indústria deCana-de-açúcar (UNICA). A estimativa para essa armazenagem é de R$ 9 bilhões e Ministérios da Economia e da Agricultura estudam linhas de crédito que seriam criadas a partir de consórcio entre bancos públicos e privados, pois o BNDES não tem recursos para fazer o empréstimo sozinho ao segmento.

Críticas

As medidas solicitadas ao Governo foram fortemente criticadas. O presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, alegou que “Não é hora de extrair lucros extraordinários às custas do consumidor, nem tampouco fazer lobby para o Governo para pedir impostos para se proteger da competição. É hora sim de trabalhar com os nossos próprios esforços, vencer essa crise e preparar nossas empresas para o longo prazo”, afirmou.

Já a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis) e os sindicatos do setor da revenda enviaram ofício ao presidente da República, Jair Bolsonaro, para solicitar que o Governo não aumente a CIDE nem mesmo a taxa de importação da gasolina. O documento ressalta que o aumento viria em um momento completamente inoportuno para a revenda de combustíveis, que também está em crise, destacam, com uma queda vertiginosa nas vendas,entre 50 e 75%, em média Brasil.

Sem ajuda, qual caminho seguir?

O açúcar retoma seu papel de “salvador da pátria”, com preços e demanda melhor que o etanol, com previsão de dois recordes neste caso no Brasil: um na produção, de 41 mi t; o outro, na exportação de açúcar próxima de 30 mi t, cerca de 10 mi t a mais que na safra passada. Sendo assim, a Índia perde seu papel de maior produtor mundial da commodity. No Centro-Sul, a produção está prevista em 37,5 milhões de toneladas, versus 26,73 milhões na temporada anterior. No caso da exportação de açúcar para a safra atual, deverá ser de 29,80 milhões de toneladas, versus 19,44 milhões de toneladas na temporada passada, segundo a JOB Economia e Planejamento Ltda. Diante dos fatos, para grupos e usinas do setor a chave estará virada para a produção da commodity.

Açúcar: demanda maior; concorrência menor

Para Jacyr Costa Filho, membro do Comitê Executivo do Grupo Tereos e presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp, as perspectivas para o setor sucroenergético são positivas e a demanda de açúcar deve aumentar no pós-crise da COVID-19. O executivo apontou dois fatores que mostram que o setor recuperará participação no mercado global de açúcar. O primeiro é o aumento na demanda de açúcar impulsionado por países, como a China, que necessitará repor seus estoques de alimentos, importando não só açúcar, mas também soja e outras commodities agrícolas. Além disso, as usinas podem recuperar o market share perdido nos últimos dois anos em virtude do maior direcionamento de cana para o etanol, prova disso é que os embarques de açúcar em março superaram os anos anteriores e em abril o ritmo continua positivo e o setor brasileiro tem muita tecnologia para potencializar a produção e outras em desenvolvimento, o que dá mais competitividade ao segmento.

O segundo motivo é a menor concorrência no mercado de açúcar devido à quebra de safra em países como a Tailândia, que teve a produção atingida pela seca. De acordo com Fabio Venturelli, presidente do Grupo São Martinho, a demanda pelo adoçante vai quase na contramão do preço. “Houve um aquecimento do mercado de açúcar no primeiro trimestre. O preço já estava definido, porque fizemos hedge (proteção de garantia de preço). E estamos com as condições necessárias para fazer a exportação nesse momento”, disse.

Venturelli comentou ainda que pode ocorrer neste primeiro trimestre uma antecipação das vendas do adoçante. A forte fixação antecipada dos preços de exportação de açúcar deve se tornar uma importante tábua de salvação neste momento, já que o dólar tem favorecido a manutenção da remuneração das usinas. Até 31 de março, mais de 17 milhões de toneladas para exporta- ção estavam com valores travados, informou a Archer Consulting.

O Grupo São Martinho também carregará boa parte da produção de etanol para a segunda metade da safra, favorecida por uma tancagem adicional nova na Usina Boa Vista, em Quirinópolis (GO). “Conseguimos [estocar] pouco mais de 70% da produção. Isso nos leva confortavelmente até setembro”, garante Venturelli.

Já a CMAA pretende segurar o etanol em seus tanques, como forma de mitigar os impactos da baixa nos preços do petróleo e da diminuição do consumo de etanol, enquanto gera caixa com venda de açúcar e energia – que, na safra passada, representou 25% de seu lucro antes de juros, impostos, de- preciação e amortização (Ebitda). “Talvez entre junho e agosto, se a demanda melhorar, podemos colocar etanol no mercado”, afirmou Carlos Santos, presidente da mineira CMAA.

Para Ricardo Mussa, presidente da Raízen, que possui uma joint venture de trading de açúcar com a asiática Wilmar, “se o Brasil consolidasse mais a comercialização, iria beneficiar o mercado inteiro”. “Tem valor enorme a ser destravado, mas é difícil achar o modelo. Em crise, empresas ficam mais abertas a discutir diferentes modelos para mudar patamar de comercialização do açúcar brasileiro”, avaliou Mussa.

Ele acredita que a gestão de risco deve ser aplicada à risca como for- ma de proteger o caixa das usinas dos reveses que estão por vir. “O que podemos aprender dessa crise é muita gestão de risco”, afirma. Apesar de ser o ativo de maior rentabilidade, o adoçante pode passar por uma crise no futuro também. “O Brasil vai produzir o maior volume de açúcar nesta safra, justamente no momento em que o mundo está reduzindo ou pratica- mente permanecendo estável no consumo, consequência da desaceleração econômica global trazida pelo coronavírus. Isso tende a provocar uma pressão negativa de preços nos próximos anos”, afirma Haroldo Torres, economista, mestre e doutor em Ciências (Economia Aplicada) pela Esalq/USP e gestor de projetos do Pecege.

Raízen foca em investimento e inaugura fábrica de biogás

“A retomada não virá pelo motor consumo, mas sim pelo motor de investimentos”, disse o presidente da Cosan, Luis Henrique Guimarães. E já mirando este momento, a companhia iniciou as atividades, em caráter experimental, em abril, de sua fábrica de Biogás. Localizada ao lado da unidade Bonfim, da Raízen, em Guariba/ SP, a fábrica é uma joint venture com a Geo Energética, anunciada em agosto de 2018, e é a primeira no mundo em escala comercial a utilizar a tecnologia de conversão da torta de filtro e vinhaça, subprodutos da cana-de-açúcar, como matérias-primas para fabricação de biogás e geração de energia elétrica, com capacidade de produzir 138 mil MWh por ano.

 

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