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Além da Ipiranga, Grupo Ultra mira a ´alcoolquímica´

Presidente do Conselho do Grupo Ultra, Paulo Cunha foi o principal mentor da operação de compra do Grupo Ipiranga concretizada semana passada. Discreto, avesso a entrevistas, Cunha, apesar de a compra diversificar o grupo, acredita na especialização da indústria, descartando o modelo de empresa única forte para concorrer no exterior, como defendem alguns. É preciso definir até onde você vai, não dá para abraçar o mundo com as pernas, avalia Cunha, que admitiu estar de olho da indústria alcoolquímica. Foi o avanço do álcool, aliás, que quebrou o monopólio da Petrobrás no setor de combustíveis líquidos para automóveis no Brasil.

Aqui vão trechos da sua entrevista:

A operação de compra do Grupo Ipiranga está sendo considerada como um novo marco da história da petroquímica brasileira. O senhor concorda com isso?

Concordo, pois a operação destrava um pedaço importante da petroquímica que é o Pólo de Triunfo, no Rio Grande do Sul, permitindo um dinamismo maior daqui para a frente. Será possível integrar todo o Sul em uma operação mais eficiente do que estando ela fracionada como é hoje.

Houve uma época em que alguém levantou a bandeira de que as indústrias desse setor deveriam se unir para poder atuar no exterior. Isso procede?

A indústria petroquímica brasileira já foi muito mais fragmentada. Hoje, ela caminha para a consolidação.

São empresas fortes, especializadas, capazes de competir plenamente no mercado interno, com as importações e com as empresas multinacionais. Já a questão de ganhar o mundo é mais difícil, pois, além de ser grande, você precisa ser competente, precisa ter domínio sobre determinadas tecnologias, ter acesso a capital barato e, certamente, fazer a escolha certa do ponto de vista de alvo, de aquisição ou construção. No ano passado, quase compramos uma empresa inglesa de US$ 1 bilhão. Perdemos no último lance para uma outra empresa inglesa. O fato é que porte é importante, mas mais importante é competência. Acho que existe muita conversa fiada, muito lobby querendo fazer empresas únicas em vários setores.

A tendência então, hoje, é a especialização e não a verticalização?

É a especialização. É preciso definir até onde você vai, não dá para abraçar o mundo com as pernas. As grandes empresas químicas, por exemplo, normalmente não retrocedem até o petróleo.

Já algumas petroleiras vão até a petroquímica. Não é uma regra geral, mas uma regra de circunstância, que depende de cada mercado, da geografia. O importante é você ter acesso às matérias-primas em condições favoráveis e essa é nossa preocupação permanente. Estamos sim buscando matéria-prima no Brasil, no exterior. Fomos buscar matéria-prima no México, para expansão de especialidades. Estamos olhando com muito interesse o álcool e a produção da biomassa brasileira como alternativa de matéria-prima para produção de insumos para nossos produtos químicos. Essa é uma questão complexa, cuja solução depende de cada circunstância, de cada caso em particular. Em muitos produtos que fabricamos, somos o único produtor local. Mas em outros meus concorrentes são a Bayer, a Dow, todas as grandes estrangeiras. Para competir é preciso ser eficiente, ter bom custo, qualidade e serviço para os clientes.

Então por que um novo ramo, o de distribuição, com os postos de gasolina da Ipiranga?

Ele não é tão novo assim. Na realidade, distribuímos derivados de petróleo há 70 anos. Pense no botijão de gás GLP que está na cozinha de todos os brasileiros. A Ultragaz tem 24% desse mercado, somos líderes. Inventamos o botijão de garrafa e temos conhecimento nessa área. A expansão para a distribuição de derivados claros – gasolina, diesel, óleo combustível – é um passo natural. Somos hoje a melhor empresa de distribuição de gás no Brasil e, certamente, a mais eficiente e a mais rentável. Achamos que o nosso valor e nossa tecnologia, baseada na obsessão pelo custo baixo, na paixão pelo cliente e na obtenção de recursos humanos de melhor qualidade, vão se combinar no caso da Ipiranga, que também já tem uma base muito boa de operação, tem uma marca extraordinária, bem reputada no País.

O senhor mencionou outro dia alguma coisa sobre a indústria alcoolquímica, o que quis dizer com isso?

Na verdade acho que o álcool é uma realidade crescente no mundo e particularmente no Brasil. Já tem uma presença expressiva no consumo da indústria automobilística, mas vai crescer muito ainda. E ao crescer vai criar uma nova realidade: a Petrobrás não terá o monopólio do combustível líquido para automóveis no Brasil. Então vai ter de concorrer com as produtoras de álcool. Essa será, certamente, uma nova realidade. E, como toda nova realidade, vai desestabilizar o status quo e criar oportunidades. Estamos olhando o álcool sob vários aspectos, como o logístico e a matériaprima, coisas que, de alguma maneira, tenho convicção, vão se encontrar logo à frente.

A Petrobrás pode perder o monopólio sobre combustíveis líquidos, mas tem ainda o monopólio do transporte: está construindo um duto de US$ 1 bilhão para transportar álcool. Aí, a indústria não vai ficar de novo nas mãos da Petrobrás?

Não, esse duto da Petrobrás é para levar o álcool até São Sebastião, para exportação. Ela está querendo levar esse álcool para longe do mercado brasileiro. Mas, mesmo assim, eu acho que vai sobrar muito álcool aqui.

O Brasil tem transporte eficiente para o transporte do álcool?

O Brasil não tem transporte eficiente para coisa nenhuma. Falar de transporte no Brasil é falar de um caos.

Até o transporte aéreo, que era razoável, está ficando uma porcaria. No Grupo Ultra, estamos cuidando disso: temos a Ultracar, que é uma empresa especializada em logística, que tenta driblar esse caos e fazer o transporte da maneira mais eficiente possível. Ela transporta produtos químicos para lá e para cá, armazena os produtos no porto e fora dele e distribui para os nossos clientes. Isso virá se somar agora a uma empresa que vem junto com a Ipiranga, a Tropical, que tem uma atividade muito grande no transporte e distribuição dos combustíveis. São competências, ativos que se somam para que a gente possa fazer uma coisa inteligente.

O senhor acredita numa solução privada para a logística do álcool?

Acredito, sim. E já há alguma coisa sendo organizada, por exemplo, em torno das ferrovias. Tem uma enormidade de capital estrangeiro disponível à procura de iniciativas empresariais que organizem um pouco esse caos no transporte. Estamos apenas precisando soltar um pouco a regulamentação para que elas aconteçam.

O senhor acredita em projetos de PPP, nesse sentido?

Não sei se o seu PPP é o mesmo que o meu. O meu quer dizer Produtividade, Pontualidade e Persistência. São esses os PPPs que perseguimos. Quando se consegue juntar esses três pês, as coisas sempre funcionam.

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