Pelo menos 1% do PIB agropecuário deveria ser destinado à pesquisa. Em qualquer setor da atividade econômica, a tecnologia é a alavanca da competitividade. Alguns analistas chegam a afirmar que, na moderna disputa por mercado, onde a pirataria tecnológica é uma constante, só tem sucesso empresarial quem dominar mais depressa e por mais tempo uma nova tecnologia. Se é verdade que o empreendedor lucra no curto prazo com a inovação, também é verdade que o consumidor é o maior beneficiário, no prazo longo, porque a disputa entre os produtores leva ao barateamento do produto.
Na agricultura este tema é mais do que evidente. O preço de um alimento é dado pela relação entre a oferta e a procura. A oferta é função da produção, que, por sua vez, é função da produtividade. Portanto, quem tiver uma produtividade agrícola abaixo da média (que determina os preços), acaba sendo excluído do sistema. Com isso, a média sobe, aumentando a oferta, o que derruba os preços. Esta é uma perversidade constante na economia rural, em qualquer país: quando os produtores todos incorporam uma nova tecnologia, o grande beneficiário é o consumidor, porque o produto cai de preço. Sendo assim, o produtor fica entre a cruz e a caldeirinha: se investir em inovação para melhorar sua produtividade, quem se apropria do resultado é o consumidor; e, se não investir, cai abaixo da média e é excluído. Portanto, não tem alternativa: se quiser ser eficiente e competitivo, tem que gastar em tecnologia.
O Brasil era, até 2003, o maior exportador mundial de café, açúcar, suco de laranja e tabaco. Nos últimos 4 anos, graças à excelente tecnologia tropical que hoje dominamos, alcançamos também a liderança em exportações de carne bovina, carne de frango, do complexo soja e de etanol. E estamos avançando em fruticultura, flores, orgânicos, algodão, carne suína, entre outros produtos.
A agroenergia – com o etanol e o biodiesel – surge agora como um novo paradigma da agricultura mundial, oferecendo ao Brasil uma chance de contribuir para a construção de uma nova civilização, em substituição à do petróleo, que está em seu ocaso.
Mas, sem investimentos vigorosos em tecnologia, não há liderança e nem competitividade que se agüente. E, perdendo a concorrência, o País ficará inteiramente dependente da generosidade dos vencedores, sem desenvolvimento, sem geração de emprego e, o que é pior, exportando seus cérebros, que irão em busca do financiamento da pesquisa, onde isto acontece. Em nosso País vivemos alguns problemas dramáticos nesta área.
O primeiro é a escassez de recursos financeiros para o setor. Calcula-se que um número mínimo em termos orçamentários seria a destinação de 1% do PIB agropecuário para a pesquisa. Em 2003, o orçamento era de lamentáveis 0,55% do PIB agropecuário, o que desestimulou nossos cientistas enormemente.
Hoje o número está melhorando, mas ainda longe do ideal, o que tem levado a Embrapa, por exemplo, a tentar uma espécie de Parceria Público-Privada na pesquisa, permitida pela Lei de Inovação, mas ainda cheia de amarras jurídicas e burocráticas que dificultam o avanço do projeto.
Mas o grande problema atual é a lentidão dos avanços em transgenia. Depois de anos de penosas discussões, o Brasil tem hoje uma moderna lei de biotecnologia, empurrada dentro do Congresso Nacional e até mesmo no Executivo por cientistas altamente capacitados e convencidos da importância desse tema. Nossa lei é extremamente cuidadosa no que tange à saúde – humana e animal – e ao meio ambiente. Mas, ao regulamentá-la, o Executivo deixou uma brecha para a lentidão, caracterizada pela necessidade de maioria absoluta (2/3 dos seus membros), nas decisões da CTNBio. Com tal numerologia, nada é aprovado em termos de liberação de produtos para o cultivo, e mesmo a liberação de pesquisas é extremamente burocratizada.
Dominamos hoje em dia um notável conhecimento, que é o seqüenciamento de genomas. Através deste conhecimento, a ciência pode melhorar geneticamente as plantas destinadas à alimentação, de diversas maneiras: colocando genes que confiram resistência à geada, à seca, a doenças e a pragas; melhorando a produtividade, com redução de custos; aumentando o teor protéico da alimentação; introduzindo propriedades medicinais nos alimentos; conferindo forma, tamanho, cor, aroma e paladar mais apropriados, sem falar na produção de vacinas e outros medicamentos de interesse da sociedade em geral, mas em especial do consumidor, porque terá acesso a alimentos mais baratos e de melhor qualidade.
Com o etanol em alta, podemos dobrar a produção por hectare através de novas variedades transgênicas de cana.
Acabamos de concluir o seqüenciamento genético de citros. Com isso, o IAC pode produzir novas variedades resistentes às doenças que acabam com a citricultura brasileira. Sem aprovação para pesquisas em campo, chegamos ao absurdo de receber propostas para montar os experimentos no Paraguai, e, sendo positivo o resultado, multiplicar lá mesmo os novos materiais.
Com variedades resistentes, milhões de dólares seriam economizados no combate às doenças e o meio ambiente seria muito mais bem preservado, fatores que, aliás, determinaram em anos anteriores a liberação de variedades de soja e de algodão.
Se os cientistas brasileiros tiverem mais flexibilidade para trabalhar, com todo o cuidado em relação à ecologia, eles realizariam uma grande revolução tecnológica, garantindo ao Brasil muito mais competitividade em todas as cadeias produtivas do agronegócio.