O Brasil lidera o ranking do comércio mundial de seis dos principais produtos agropecuários: café, açúcar, suco de laranja, soja, carne de frango e celulose. Detém o maior rebanho bovino do mundo. Apresenta índice de desenvolvimento agrícola superior à média mundial, com domínio de tecnologias sofisticadas, segundo estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). E exibe ainda a maior produtividade agrícola na América Latina e Caribe, com crescimento médio de 3,6% ao ano. A eficiência do setor se reflete no desempenho econômico: o PIB (Produto Interno Bruto) do agronegócio em 2011 alcançou US$ 548,2 bilhões, correspondente a 22,51% do PIB nacional.
Resultados tão expressivos têm feito do Brasil um dos principais destinos dos recursos destinados a investimentos. O crescimento vegetativo e da renda das populações geram demanda em proporções inéditas. As projeções de crescimento da procura por alimentos fazem do comércio de produtos agrícolas um negócio com retorno garantido. Os preços das commodities mudaram de patamar e as séries históricas deixaram de ser referência para as análises de mercado.
Isso explica a presença frequente no País de gestores de capital das mais diferentes procedências. Esses profissionais circulam com desenvoltura pelas cidades brasileiras à procura de oportunidades, segundo informa o diretor técnico da Informa Economics FNP, José Vicente Ferraz. Representam, em geral, fundos de investimento ou empresas do agronegócio interessadas em se estabelecer no Brasil. Muitos já ganharam terrenos de prefeituras e constroem fábricas. O modelo adotado com maior frequência é o da associação com empresas brasileiras, conhecedoras do mercado e da nossa burocracia, explica Ferraz.
Estima-se que na década passada o investimento direto estrangeiro (IED) tenha alcançado em média 27% do valor da formação bruta de capital no setor agrícola. Mas, segundo alguns analistas, isso não se sustentou a partir de 2010. Restrições impostas à participação do capital estrangeiro na aquisição de imóveis rurais por parecer emitido em 2009 pela Advocacia Geral da União (AGU), que deu uma nova interpretação da Lei 5.709/71, reduziram o fluxo de recursos externos para essa área de atividade, informa a superintendente técnica da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rosemeire Cristina dos Santos. Segundo esse novo parecer, empresas estrangeiras ou nacionais controladas por estrangeiros não poderão adquirir imóveis com mais de 50 módulos, ou com área superior a 25% da superfície do município onde estão localizados. “A mudança na interpretação da Lei gerou insegurança jurídica”, ela afirma. “Ocorreu um esvaziamento no fluxo de recursos. Afugentou os investidores.”
A repentina freada no fluxo de capitais em direção ao agronegócio também foi notada pelo diretor técnico da FNP. José Vicente Ferraz considera o parecer da AGU totalmente injustificado. Para ele, o capital estrangeiro não representa ameaça à soberania do País. “Não tem sentido restringir a propriedade de terras ao capital nacional.” Com a nova interpretação da lei, o ritmo dos investimentos estrangeiros, que já havia sofrido um abalo com a crise financeira de 2008, perdeu velocidade, afirmou.
Mesmo assim, o interesse pelo agronegócio brasileiro permanece. Para o economista, professor do Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia da PUC-SP, Antônio Corrêa de Lacerda, países de grande população, como a China, procuram a segurança alimentar por meio de investimentos no exterior. Além de países da África, Brasil se tornou destino certo de um capital que busca elevar a segurança alimentar com a maior oferta de produtos agrícolas. A recente queda dos investimentos estrangeiros diretos no Brasil é atribuída por Lacerda ao recrudescimento da crise internacional. Segundo dados do Banco Central, entre janeiro e setembro deste ano, os investimentos estrangeiros diretos aplicados na agricultura, pecuária e serviços relacionados caíram 39,3% em relação ao mesmo período do ano passado. O professor da PUC diz que essa queda, embora representativa, não significa mudança de rumo do capital estrangeiro. “O Brasil continua sendo um oásis para os investidores estrangeiros. É o país que mais oferece garantias”, declara Lacerda.
Rosemeire concorda com a opinião de Lacerda, diante das inúmeras vantagens proporcionadas pela atividade agropecuária exercida no Brasil. Mas lembra que o impedimento legal não é o único obstáculo ao investimento estrangeiro no País. A deficiência na infraestrutura também assusta o capital externo. No entanto, permanece o interesse no agronegócio, especialmente nas atividades de ciclo longo, como a silvicultura, para a produção de celulose, ou o cultivo de cana-de-açúcar para etanol. As vantagens comparativas proporcionadas pelo clima, insolação, abundância de água e extensão territorial continuam sendo um chamariz. Do ponto de vista do interesse nacional, o capital estrangeiro é bem-vindo, diz Rosemeire. A expansão das atividades no campo com elevada tecnologia demanda recursos, explica.
Há pelo menos 70 milhões de hectares no Brasil que precisam ser mais bem aproveitados. São áreas degradadas, em geral pastos, onde podem ser adotas tecnologias de baixo carbono, como a integração lavoura-pecuária-floresta ou sistema de plantio direto. Estudo da CNA indica que medidas singelas como essas podem contribuir para elevar a produção de grãos e fibras em 136,9%, de 160 para 379 milhões de toneladas ao ano. O mesmo ocorre com a produção anual de carne, que pode passar das atuais 9,1 milhão de toneladas para 15 milhões de toneladas, apenas com o melhor aproveitamento dessa área.