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Afastar um possível gargalo energético

O governo está adotando uma tática errada neste momento quanto à possibilidade de vir faltar energia. É claro que a possibilidade de um apagão pode afetar seriamente a imagem do governo, mas só ajudaria muito ao País se as autoridades, que insistem em negar a hipótese de racionamento de energia, aceitassem a adoção de um campanha de racionalização do consumo, com medidas preventivas por parte das empresas e mobilização da população para poupança do consumo, evitando desperdícios em uma fase reconhecidamente crítica.

Tem chovido em regiões diversas do País e as análises técnicas têm mostrado que as próximas quatro semanas serão cruciais para poder dimensionar os riscos de um déficit de energia elétrica. O governo já colocou em funcionamento usinas térmicas a gás natural, cuja oferta será reforçada com a entrada em operação do gasoduto Cabiúnas-Vitória, e providências vêm sendo tomadas para adaptação de outras usinas para utilização de óleo combustível ou diesel.

Das 20 termelétricas acionadas até a semana passada, pelo menos oito não puderam operar por falta de gás, existindo outro tanto com problemas técnicos. O próprio presidente Lula, que garantiu que não haverá racionamento este ano nem em 2009, admite que será dada prioridade ao fornecimento de gás para as termelétricas, ainda que isso venha a prejudicar o abastecimento do combustível para veículos.

Faz todo sentido, portanto, a iniciativa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) de recolher o máximo de informações com vistas a poder articular uma redução ordenada e voluntária do consumo de energia, em vez de ter de fazê-lo por imposição, como ocorreu no racionamento de 2001. A contrapartida de ações como esta por parte de entidades empresariais deveria ser uma campanha de divulgação, de amplo escopo, para a poupança de energia por parte dos consumidores domésticos e uso de lâmpadas e eletrodomésticos menos gastadores.

O essencial é evitar uma situação de incerteza, que poderia atuar em prejuízo maior para o País. Não se trata apenas de prover a oferta prevista de energia para 2008 e 2009, mas de não desencorajar investimentos, internos e externos, de que o País tanto necessita para elevar a sua capacidade produtiva, de modo a poder atender a uma demanda crescente, expressa pelo volume de encomendas do setor de varejo.

Como disse o professor Roberto Piscitelli, da Universidade de Brasília, o fornecimento de energia é o maior gargalo neste momento e a dúvida é se o ambiente será seguro o bastante para os empresários investirem. A obrigação do governo é orientar o mercado por meio de informações confiáveis quanto aos riscos no curto e médio prazos.

Essa iniciativa, ao contrário do que altos funcionários imaginam, seria positiva para a imagem do governo e fortaleceria a convicção de que não estamos em uma situação parecida à de sete anos atrás. Recorde-se, bem a propósito, que o governo, ao remover obstáculos para a construção das grandes hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau no rio Madeira, ao anunciar a retomada das obras da usina nuclear de Angra 3 e ao dar prioridade à produção de gás natural no País, além dos programas de etanol e biodiesel, transmitiu confiança aos investidores no País.

Outro bom sinal têm sido a co-geração de energia pelas usinas canavieiras e as autorizações dadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para a construção de pequenas hidrelétricas (PCH), bem como a disposição de empresas em investir em fontes alternativas de energia. Afastar a possibilidade de um gargalo energético até 2010, contando com a colaboração da sociedade, fortaleceria, sem dúvida, o ânimo dos agentes econômicos.

Quanto ao impacto que o custo mais elevado de energia vai exercer sobre a inflação, ainda é cedo para um prognóstico. Muito pressionado pelo preço dos alimentos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou 2007 na marca de 4,47%, beirando o centro da meta de 4,5%.

Para este ano, a meta continua a mesma, mas é possível – e isso também vai depender, em boa parte, do regime de chuvas – que uma nova safra recorde venha a ser colhida. Se assim for, isso arrefecerá as pressões sobre os preços dos alimentos no mercado interno, o que pode contrabalançar, em boa parte, o peso de maiores preços de energia.

Sob esse aspecto, é preciso também levar em conta o efeito de um reajuste dos preços da gasolina e do diesel, não previsto por enquanto, mas que não pode ser descartado em face das elevadíssimas cotações internacionais do petróleo.

Este é um ano que começou com problemas, e não devem ser esquecidos os prováveis efeitos de uma severa retração da economia americana sobre o crescimento dos países emergentes. Mas, como a história recente tem demonstrado, também surgem surpresas no lado menos pessimista.

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