Zilmar José de Souza*
Desde a implantação em 2005, da contratação de novos projetos via leilões regulados promovidos pelo Governo Federal, o ano de 2018 foi o 3º pior ano de contratação de novos projetos para a bioeletricidade produzida a partir da biomassa advinda do setor sucroenergético.
Em 2018, a bioeletricidade sucroenergética comercializou apenas 27 MW médios de energia (garantia física), a partir de novos projetos nos leilões regulados.
Entre 2005 e 2018, apenas em 2009 e 2012 comercializou-se menos que 2018: 10 MW médios em 2009 e nada em 2012.
O recorde positivo da fonte foi o ano de 2008, quando comercializou 541 MW médios em novos projetos de cogeração sucroenergética.
Em 2019, já foi realizado o Leilão A4/2019, em 28 de junho.
O Leilão contratou apenas 81,1MW médios, provenientes de 15 empreendimentos de fonte solar, eólica, PCHs e biomassa. Os contratos são de 20 e 30 anos, para início de suprimento a partir de 2023.
Reflexo de uma revisão, para baixo, das expectativas de demanda a contratar no futuro pelas distribuidoras, o Leilão A4/2019 contratou apenas 81,1 MW médios de garantia física, bem inferior aos últimos Leilões A4, que contrataram 220 MW médios em 2017 e 300 MW médios em 2018.
O Leilão A4 deste ano acabou dominado pelas fontes PCH, solar e eólica, responsáveis por 46,1% (37,4 MW me), 26% (21,1 MW me) e 18,8% (15,2 MW me), respectivamente, do total de garantia física comercializada no leilão.
A fonte biomassa havia cadastrado 1.039 MW, totalizando 19 projetos, mas comercializou apenas um projeto, representando 9,1% (7,4 MW me) da garantia física contratada, com preço de R$ 179,87/MWh, contra o teto de R$ 311/MWh, ou seja, um deságio de 42%.
Para o ano de 2019, resta agora apenas o Leilão A-6, agendado para o dia 18 de outubro. Neste leilão poderão participar empreendimentos hidrelétricos, empreendimentos de geração eólica e solar fotovoltaica, e projetos de termoelétricas a biomassa, a carvão mineral nacional e a gás natural.
No Leilão A-6 do ano passado, a energia eólica respondeu pela maior parte do volume contratado (50,3%), seguida das termelétricas a gás natural (40,3%), das pequenas hidrelétricas (PCH e CGH) com 9,4%, e, por último, a biomassa com apenas 1%.
No A-6/2018, a biomassa concorreu no chamado Produto Disponibilidade (junto com carvão e gás natural), onde uma única térmica a gás natural levou mais de 97% da demanda alocada para aquele produto, deslocando os projetos de bioeletricidade.
Agora, para o Leilão A-6/2019, a fonte biomassa cadastrou um total de 25 projetos, totalizando 1.360 MW, mas seus concorrentes diretos cadastraram 41.718 MW (gás natural) e 1.667 MW (carvão mineral).
A biomassa representa apenas 1,3% da oferta total cadastrada para o A6/2019, enquanto gás natural e carvão mineral representam, respectivamente, 41,4% e 1,7%.
Esperança
Em 2019, mesmo restando apenas o Leilão A6, a esperança continua para que a biomassa consiga ter um desempenho, no mínimo, melhor que a média anual de contratação dos últimos 14 anos.
Mas o formato dos leilões, como o A6 em que a fonte biomassa concorre com fontes não renováveis, não tem ajudado a bioeletricidade.
E a falta do reconhecimento correto dos atributos de cada fonte para o sistema tem prejudicado a biomassa nos Leilões A4, onde participam hidrelétricas, eólica, solar e biomassa.
Além de desarticular esta importante cadeia produtiva da economia nacional, os resultados do atual formato de contratação nos leilões regulados têm sido ruins para a biomassa e também para o consumidor final, se considerarmos os atributos que esta fonte fornece ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
O modelo de contratação via leilões tem 14 anos e consideram quase que exclusivamente a produção de energia e seu preço, em detrimento dos demais atributos das diversas fontes de geração.
Está na hora de aprimorá-lo e avaliar os reais custos e benefícios de cada fonte de geração, considerando a contribuição de seus respectivos atributos para o atendimento dos diversos objetivos do suprimento de energia no SIN.
Nesta linha, em outubro de 2018, o Instituto Escolhas apresentou estudo da consultoria PSR, com o real valor e benefícios das diversas fontes de geração de energia, observando seus atributos.
Segundo o estudo, uma usina a bioeletricidade, localizada no Sudeste, é a renovável com melhor custo/benefício para os consumidores finais. O valor da energia da bioeletricidade no SE seria R$ 168/MWh, da usina hidrelétrica seria R$ 286/MWh, da eólica no NE R$ 195/MWh e R$ 244/MWh no Sul.
A PCH no SE sairia a R$ 285/MWh, a fonte solar no NE R$ 293/MWh e R$ 328/MWh no SE.
A louvável inciativa de modernização do setor elétrico, por parte do Ministério de Minas e Energia, é muito bem-vinda no aspecto de procurar valorar os atributos de cada fonte de geração.
Temos certeza que, ao fim deste processo, a bioeletricidade sairá mais competitiva, se todas as medidas prometidas forem levadas avante, de forma concatenada e organizada.
Para 2020, há diretrizes que podemos implementar até que a modernização do setor elétrico esteja plenamente conhecida, estruturada e comece a sair do papel.
Temos apenas o Leilão A6 para a bioeletricidade fechar 2019 no mercado regulado, mas temos que pensar já para frente.
Espera-se que os próximos leilões regulados consigam evoluir para, no mínimo, a criação de um produto específico para a bioeletricidade nos Leilões A-6, separando-a de fontes não comparáveis como carvão e gás natural, ou mesmo leilões regionais e específicos para esta fonte, idealmente dentro de uma política setorial de longo prazo para a bioeletricidade, com diretrizes claras e de continuidade, buscando estimular o pleno uso eficiente deste importante recurso renovável na matriz de energia do país.
*Economista, doutor em engenharia de produção e pós-doutor em economia pela FGV-SP. Atualmente, é gerente de bioeletricidade na UNICA – União da Indústria de Cana-de-Açúcar.