Mercado

Acesso difícil a novos mercados

O Brasil corre o risco de não obter acesso adicional aos mercados para seus principais produtos de exportação, se depender da proposta de corte tarifário em exame nas discussões agrícolas na Organização Mundial de Comércio (OMC). Simulações elaboradas pelo G-20, grupo liderado pelo Brasil, Índia e China, mostram que a fórmula “com boas probabilidades de ser aceita” implica reduzir as tarifas de países industrializados por volta de 36%.

Esse corte é altamente insuficiente para abrir mercados para produtos de interesse comercial do Brasil, como carnes, açúcar, tabaco, que são submetidos a tarifas variando de 50% a 300%, segundo negociadores.

Na mesma linha, o Abare, instituto de pesquisa agrícola, que dá peso à posição da Austrália, como líder do Grupo de Cairns, mostra que para que as exportações de carne bovina tenham maior acesso é necessária uma redução de pelo menos 45% na tarifa consolidada da União Européia e de 77% nos EUA. No caso do açúcar, um dos produtos mais protegidos e alvo de disputa na OMC, o corte teria de ser de 24% na UE e de 38% nos EUA.

O texto Derbez, base das consultas agrícolas que prosseguem amanhã para tentar reativar a Rodada de Doha, tem “sérias deficiências” em toda a parte agrícola. Mas o problema crucial está no acesso a mercado. O texto propõe uma fórmula “mista” com três enfoques de redução de tarifas, deixando ao país escolher qual produto coloca em cada categoria de corte. O primeiro prevê aplicação de uma redução linear, mas exigindo corte mínimo para cada linha tarifária, repetindo o que aconteceu na Rodada Uruguai (1985-1994). Outro grupo de produtos seria submetido à “fórmula suíça”, com corte maior para as tarifas mais altas e menor para as mais baixas. E as tarifas sobre outros produtos seriam eliminadas.

Pelas simulações do G-20, a fórmula “mista” é idêntica à estrutura tarifária dos países industrializados. Significa que os ricos cortariam menos que o exigido dos países em desenvolvimento, que têm pouca variação tarifária. O Brasil, por exemplo, tem só duas: de 35% e de 55% (esta para importação de produtos notoriamente subsidiados como trigo, arroz e lácteos).

Os países mais protecionistas têm muitas linhas tarifárias para produtos agrícolas, mas só uma pequena percentagem delas são para produtos de substancial interesse comercial. Assim, é provável que justamente esses produtos sejam submetidos a cortes mínimos, enquanto o grosso das linhas tarifárias com pouco ou nenhum interesse comercial sofram reduções maiores.

Exemplo do Abare: a União Européia tem mais de 2.000 linhas tarifárias agrícolas e, os EUA, cerca de 1.400. Mas um pequeno número de linhas tarifárias cobre importações altamente sensíveis, como açúcar e lácteos. Na UE, apenas 10% das linhas tarifárias representam 80% do valor das importações agrícolas em 2001. Resultado: menos de 1% das linhas tarifárias da UE e dos EUA precisariam ser submetidos à fórmula da Rodada Uruguai.

As simulações do G-20 indicam que o Brasil só teria acesso adicional a seus produtos agrícolas mais importantes em outros países em desenvolvimento, justamente onde já não tem problemas hoje, segundo negociadores. E conduzem países, como o Brasil, a tentar uma revisão significativa do texto Derbez, se quiserem garantir melhores oportunidades de exportação com a liberalização agrícola prevista no mandato que lançou a Rodada de Doha.

O grupo liderado pelo Brasil pediu para a própria OMC fazer outras simulações, que poderão ser utilizadas nas negociações. Para o Abare, não tem jeito: revisões no texto são necessárias nos pilares de subsídios à exportação e de apoio doméstico. Mas o elemento chave será substituir a atual fórmula “mista” de redução tarifária por um enfoque onde os cortes seriam baseados na tarifa consolidada.

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