O governo argentino ameaça estender a outros setores do mercado o boicote que o presidente Néstor Kirchner convocou na última quinta contra a Shell, por haver aumentado os preços dos combustíveis entre 2,5% e 4%.
“Estamos estudando [se houve aumentos abusivos]. Os produtos que mais subiram são carne, chá e peixe. Nesses casos, também se podem pleitear ações coletivas”, disse a subsecretária de Defesa do Consumidor, Patricia Narvaja, ao jornal “Página 12”.
Depois que Kirchner pediu à população que não comprasse “nem uma lata de óleo” da Shell, os postos da companhia foram ocupados por militantes contra a pobreza e o desemprego. A polícia não reprimiu os protestos, liderados por um piqueteiro e deputado ligado a Kirchner.
A Presidência da República publicou ontem anúncios em jornais, incentivando boicote geral ao aumento de preços. “Digamos todos nós: se aumenta, não compro”, propõe o slogan.
O anúncio afirma que “mais uma vez, os argentinos devem enfrentar as pressões dos que sempre apostam no nosso fracasso como sociedade e como país” e oferece um número de telefone de chamada gratuita para defesa do consumidor.”[Os empresários] têm a liberdade de decidir como e quando aumentar. Nós temos o direito de dizer: aí não compro.”
Hoje, a petroleira de origem uruguaia Sol anulará o aumento de preços para o mercado argentino anunciado na última sexta, quando a Esso também realinhou suas tarifas (de 2,6% a 4,2%). A suspensão do reajuste da Sol foi determinada pelo recém-empossado presidente uruguaio, o socialista Tabaré Vázquez, depois de gestões do governo argentino.
A Sol possui 168 postos na Argentina e comercializa cerca de 2% da gasolina consumida no país. Shell e Esso detêm aproximadamente um terço do mercado, em que a líder é a espanhola Repsol. Repsol e Petrobras _que produzem na Argentina, diferentemente das demais_ descartaram aumentar preços.
O governo Kirchner anunciou que estudará sanções contra a Shell e a Esso, por seus “aumentos absolutamente injustificáveis”, na definição do ministro do Planejamento, Julio de Vido.
Para tentar evitar o desabastecimento de diesel durante a colheita _que acaba de começar e se estenderá pelos próximos três meses_, Kirchner tentará aprovar no Congresso nesta semana uma lei de isenção temporária de impostos, aplicada a uma cota de importação do produto.
A atitude de Kirchner foi criticada pela oposição e considerada por analistas políticos um “destempero” capaz de comprometer a credibilidade do país para investimentos, no momento em que a Argentina tenta tirar partido da conclusão da troca de sua dívida pública em moratória.
Ontem, o ministro do Interior, Aníbal Fernández, negou que Kirchner tenha dado orientações aos piqueteiros para sair às ruas. Segundo o ministro, o governo respalda o boicote, mas não a ocupação dos postos.