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Governo aprova medidas para dar mais R$ 7 bi ao capital do BNDES

O Ministério do Desenvolvimento anunciou ontem que o governo já definiu as medidas para adequar o capital do BNDES, hoje abaixo do necessário, para expandir suas operações de crédito. O problema será resolvido principalmente pela redução da exposição líquida do banco a riscos cambiais e pela venda de parte da sua carteira de ações. Adicionalmente, a instituição pretende obter do Banco Central a reclassificação de risco de parte de suas operações de crédito, de modo a reduzir as respectivas provisões.

Dessa forma, informou o Ministério, o banco ficaria com patrimônio suficiente para desembolsar, em 2004, R$ 47,3 bilhões em financiamentos, fluxo superior ao de 2003, previsto em 34,7 bilhões.

Somadas, as medidas “destravariam” R$ 7 bilhões do patrimônio do banco, hoje comprometidos com outros riscos, para bancar mais operações de crédito. Em tese, cada R$ 1 bilhão de patrimônio permite alavancar R$ 9,09 bilhões em crédito. Mas como o BNDES está hoje desenquadrado para a carteira já existente, a expansão não será dessa magnitude.

O Ministério não detalhou o efeito de cada medida isoladamente. Mas, segundo fontes da área econômica, só a redução da exposição cambial do banco seria capaz de liberar R$ 6 bilhões de capital. Por exclusão, o impacto restante, de R$ 1 bilhão, viria das demais medidas.

A exposição do BNDES a riscos cambiais, calculada em R$ 16,5 bilhões pelo Banco Central ao final de setembro, será reduzida de duas formas. Uma delas, não explicitada ontem na nota do Ministério, é uma mudança na regra de cálculo desta exposição, que valerá para o sistema financeiro como um todo.

Uma circular do BC permitirá que a exposição seja calculada compensando-se ativos e passivos cambiais expressos ou indexados em diferentes moedas. Hoje, a compensação só pode ser feita em cada moeda, o que impede que um ativo em dólar norte-americano compense um passivo em euro, por exemplo.

Apesar de não estar explícita na nota do Ministério, a mudança de regra foi confirmada ontem, tacitamente, pelo presidente do BC, Henrique Meirelles. Perguntado se a flexibilização do cálculo da exposição cambial valeria só para BNDES , ele respondeu que valeria para todo os bancos.

Sozinha, a medida do BC reduziria a exposição cambial do BNDES de R$ 16,5 bilhões para cerca de R$ 12 bilhões. Como o capital requerido para riscos cambiais é atualmente de metade da exposição, isso liberaria um volume de patrimônio de R$ 2,25 bilhões para alavancar novos créditos.

Mesmo reduzida pela mudança na forma de cálculo, a exposição cambial do BNDES ficaria R$ 7,5 bilhões acima do limite máximo permitido pelas normas, que é hoje de 30% do patrimônio de referência (conceito diferente de patrimônio líquido, por incorporar dívidas subordinadas e outros capitais classificados como de nível 2). Isso seria neutralizado por operações de hedge cambial a serem feitas pelo BNDES, liberando para lastrear a expansão do crédito mais R$ 3,75 bilhões de capital hoje comprometido com riscos cambiais.

A nota distribuída ontem pelo Ministério do Desenvolvimento cita claramente a solução via hedge cambial, mas não detalha quem seria a contraparte dessas operações. Como a posição cambial líquida do BNDES é passiva (liquidamente devedora em moeda estrangeira), dado o enorme volume da exposição a ser neutralizada, no BC, imagina-se que o Tesouro terá de oferecer o hedge. Buscá-lo no mercado, avaliam os técnicos, sairia muito caro para o BNDES.

A venda de parte das ações do BNDES só geraria impacto positivo no patrimônio na medida em que fosse realizada com lucro. Mas imagina-se que isso não seja problema, pois o valor contábil da carteira – em torno de R$ 10,6 bilhões, segundo fontes do BC – está abaixo do seu valor de mercado. A diferença chega a R$ 10 bilhões, segundo o Ministério do Desenvolvimento, ou seja, quase 100%. Ainda que o atual valor de mercado não fosse atingido, a operação daria lucro, que poderia ser incorporado ao patrimônio.

O Ministério não especificou quanto será vendido da carteira. Em número de ações, a pretensão é ofertar três lotes de 500 milhões de papéis cada um em 2004, segundo Carlos Lessa, presidente do BNDES. A intenção do banco é compor esses lotes de forma a reproduzir a composição do Ibovespa. A venda envolverá, segundo o Ministério, a criação de um fundo de índice.