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Projeto de biossegurança do governo cria restrições a uso de transgênicos no Brasil

O governo apresentou nesta quarta-feira, depois de nove meses de discussões, seu projeto de lei para a área da biossegurança, criando restrições para o plantio e consumo de transgênicos no país – o objetivo era agradar tanto aos defensores dos produtos geneticamente modificados como às ONGs e ambientalistas contrários a eles. O projeto será recebido pelo Congreso nesta quinta.

O texto a ser discutido pelos parlamentares prevê penas de até três anos de prisão para qualquer um que plantar ou negociar transgênicos sem autorização do governo. A obtenção dessa autorização, por sua vez, foi regulamentada com uma tramitação complexa: as atividades ganharão sinal verde só depois de passar por uma comissão e um conselho em Brasília, processo que deverá ser lento.

O uso de transgênicos deverá ser aprovado primeiro pela Comissão Técnica de Biossegurança (CTNBio) e obter licenciamento ambiental. Depois, o Conselho Nacional de Biossegurança dá a palavra final. Formado por doze ministros, o Conselho tratará de questões comerciais ou de interesse nacional, e pode vetar a produção e o consumo dos produtos geneticamente modificados.

Essa mudança é um dos pontos mais polêmicos do projeto. Para alguns parlamentares e especialistas na área, a CTNBio ficará enfraquecido – na prática, terá poder apenas para vetar projetos, já que as aprovações precisarão da chancela dos ministros. Para outros, a mudança é positiva, pois as decisões não podem ser apenas técnicas – já que não há unanimidade – mas também políticas.

Comissão – O projeto do governo amplia a CTNBio, que passará a ter 8 representantes da sociedade civil entre seus 26 membros. Ambientalistas, industriais e representantes de áreas como bioética e agricultura familiar estarão na comissão. Os defensores dos transgênicos defendiam que a CTNBio tomasse as decisões finais sobre as autorizações, sem a interferência dos ministros.

Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, a presidente da Associação Nacional de Biossegurança, Leila Oda, diz que o projeto enfraquece a CTNBio e agrava as disputas entre os ministérios. “É um projeto inédito no seu absurdo, pois a CTNBio só poderá dar parecer negativo.” Mas o agrônomo Leonardo Megrejo, da UF-SC, diz que há um avanço: “Não existe unanimidade em questões técnicas. A decisão não pode ficar nas mãos apenas dos cientistas”.

Disputa – Como antecipou a reportagem de capa de VEJA desta semana, o projeto tenta prestigiar a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, mas deverá sofrer mudanças no Congresso, defendidas pelo bloco favorável ao transgênico. O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, é o maior defensor dos produtos. Antonio Palocci (Fazenda) e José Dirceu (Casa Civil) devem participar dos acertos no texto no Congresso, para que os interesses dos dois grupos sejam atendidas, ao menos parcialmente.

Se for aprovado do jeito que está, o projeto pode aprofundar o racha entre os ministros no tema – quando os pedidos de autorização chegarem às mãos deles, Marina e Rodrigues deverão manter suas posições, causando um impasse. O conselho de ministros será presidido por Dirceu, mas não está claro se ele terá nas mãos a decisão final em nome do órgão – o texto, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva logo depois da apresentação, não foi divulgado na íntegra pelo governo.

Dirceu admitiu que haverá queda-de-braço no Congresso, mas sinalizou que o governo tem pressa para aprovar o projeto – pode pedir urgência na votação. O Planalto já prevê tentativas de mudanças por parte da bancada ruralista, com 180 parlamentares, que pretende deixar o projeto com as características defendidas pelo ministro Rodrigues. O suposto enfraquecimento da CTNBio e a provável lentidão na liberação das atividades ligadas a transgênicos serão os principais alvos dos ruralistas no Congresso.

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