Por muito tempo, a americana Cargill, que fatura por ano US$ 135 bilhões no mundo, foi considerada conservadora nos seus aportes em açúcar e etanol no Brasil – até 2008 a bola da vez na estratégia de muitas companhias. Mas, passados cinco anos do “boom” do biocombustível no país, a múlti não se arrepende de ter caminhado com prudência. A crise de crédito mundial, associada às políticas internas de controle do preço dos combustíveis, às cotações baixas do açúcar e a problemas climáticos, criou um ambiente altamente desfavorável para os grandes players do setor.
Em cerca de cinco anos, a Cargill investiu aproximadamente US$ 500 milhões nesse negócio no Brasil, considerando aquisições, investimentos e assunção de dívida. Em 2015/16, vai completar sua “primeira etapa” no setor ao atingir a moagem de 10 milhões de toneladas de cana nas três usinas que administra com parceiros nacionais.
As dimensões estão muito aquém das alcançadas pelas suas concorrentes, como a francesa Louis Dreyfus e a também americana Bunge, que investiram pesado nos últimos anos para deter, respectivamente, 40 milhões e 20 milhões de toneladas de capacidade de moagem no país.
Mas tamanho não é o mais importante, na visão do diretor de Açúcar e Etanol da Cargill no Brasil, Marcelo Andrade. “Devagar e sempre. Estamos chegando lá”, brinca. A companhia, com sede em Mineápolis (EUA), não divulga o balanço detalhado de suas operações, mas Andrade afirma que, já no ciclo 2014/15, que se encerra em 31 de março, o negócio vai gerar lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de R$ 50 por tonelada de cana processada. “O fluxo de caixa livre também será positivo”, assegura Andrade, sem revelar o montante.
A venda de energia elétrica garantiu o resultado do segmento na Cargill, num ciclo em que o açúcar ficou abaixo do custo operacional [e financeiro] e o etanol ficou no “zero a zero”, nas palavras do executivo.
A partir de biomassa própria (bagaço e palha de cana) e de terceiros, a americana conseguiu cogerar 575 mil megawatts/hora (MW/h) de eletricidade nas três unidades em 2014/15, 23% acima das 465 mil MW/h do ciclo anterior.
A estratégia, no entanto, fez com que, num momento de pico, o custo por MW/h produzido atingisse R$ 350. “Mas o teto do PLD [Preço de Liquidação das Diferenças, usado como referência para o preço da energia no mercado spot] estava acima de R$ 800. É o tipo de operação que não vamos repetir em 2015, agora que essa referência caiu a R$ 388”.
Mesmo com o encolhimento da cogeração, Andrade está mais otimista para 2015. Metade da produção de açúcar da empresa para entrega em 2015/16 está fixada com hedge médio de R$ 1 mil por tonelada, ante R$ 930 da safra 2014/15.
Para o etanol, o cenário ainda é nebuloso, apesar dos sinais positivos. “Tudo vai depender das cotações do petróleo, e da decisão do governo em relação à Cide e à mistura do anidro na gasolina”, diz.
Egresso da indústria de amidos, Andrade viaja toda semana para Goiás para acompanhar de perto a operação das duas unidades canavieiras da SJC Bioenergia, joint venture com o grupo USJ, seu parceiro com 50%.
Do total de 9,2 milhões de toneladas de cana processadas em 2014/15 nas três usinas na qual a americana tem participação, 6,9 milhões foram nas unidades goianas. O restante foi na Cevasa, de Patrocínio Paulista (SP), na qual a Cargill detém 63% do capital e é sócia da Canagrill, uma sociedade local de produtores de cana, que detém os 37% restantes.
O executivo orgulha-se dos ganhos de eficiência que a companhia e suas parceiras vêm alcançando. Atualmente, as plantas operam com 37% menos funcionários do que há alguns anos e a produtividade das máquinas de colheita também cresce. “Cada máquina está colhendo 600 toneladas de cana por dia, ante a média do setor de 450 toneladas”.
A segunda etapa dos investimentos da americana em cana-de-açúcar no Brasil prevê dobrar a capacidade de moagem para 20 milhões de toneladas. Mas, por ora, nenhuma decisão será tomada, até que as políticas do país para o etanol e a bioeletricidade sejam definidas, pondera Andrade. O único projeto de expansão que a multinacional está tocando nessa área é o da implantação de uma planta para processar milho na unidade de Goiás, sobre o qual a empresa ainda não revela detalhes.
De qualquer forma, quando a Cargill bater o martelo, os primeiros movimentos devem se concentrar nas duas usinas da SJC Bioenergia que foram projetadas para ser ampliadas a uma capacidade conjunta de até 12,5 milhões de toneladas. Atualmente, elas somam estrutura para moer 7,5 milhões de toneladas.
(Fonte:Valor Econômico)