Não foi na reunião do Conselho da Petrobrás realizada sexta-feira que foi anunciado o reajuste dos combustíveis. Mas ele virá, talvez ainda nesta semana.
Há questões mais abrangentes que envolvem essa matéria. A mais imediata delas é o que fazer a partir de agora. A outra, uma política mais consistente para o setor de veículos.
Já não há como sustentar a existência de atraso no reajuste dos preços dos combustíveis depois que as cotações do petróleo desabaram 21% no mercado internacional em apenas quatro meses. Conforme os cálculos divulgados por analistas e consultorias, não há mais realinhamento a fazer entre preços internos e externos. Há, sim, a necessidade de recompor o caixa da Petrobrás sangrado por todos esses anos de subsídios. Trata-se de uma “conta petróleo” deficitária que poderia ser compensada de outras formas. Também se espera que o governo aproveite o fim do desalinhamento entre preços para recompor a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, a Cide, imposto hoje zerado, cuja principal função foi ajudar a dar competitividade ao setor do etanol e juntar recursos para investimentos em transporte público.
Mas, ainda nessa matéria, menos importa a recomposição dos preços, que pode ser temporária. O que de fato falta são regras claras para que os preços dos combustíveis não fiquem à mercê do humor do oficial de dia.
Outra questão a examinar são as demais distorções provocadas pelos atrasos na atuação dos preços dos combustíveis. Uma gasolina cujos preços são artificialmente achatados, na prática, funciona como incentivo extra para quem roda de automóvel particular.
O setor de veículos enfrenta uma encrenca de difícil equacionamento. A atual capacidade de produção de 3,8 milhões de unidades por ano deverá saltar para 6,0 milhões em 2017, volume excessivo para o mercado interno.
Altamente protegida por tarifas de importação de 35% e reservas de mercado, a indústria de veículos do Brasil não tem competitividade. Conseguia exportar para a Argentina, graças a acordos também protecionistas, mas essa porta está praticamente fechada, porque a Argentina passa por uma grave crise de pagamentos, cuja solução não está à vista. Mesmo se esse problema for resolvido, a questão de fundo permanecerá: as montadoras continuarão devendo competitividade e, se tudo continuar como está, não abrirão novos mercados fora do Brasil.
As vendas internas continuam sendo empurradas por medidas artificiais. Uma delas, já mencionada, foi o subsídio aos combustíveis. A outra, a redução de impostos, especialmente do IPI, que já perdura dois anos e meio. E, no entanto, o setor insiste em mais favores fiscais.
O governo precisa decidir até quando os contribuintes terão de ajudar a pagar a conta dos compradores de veículos. Este não é um setor incipiente no Brasil. Já tem mais de 60 anos. Está sempre pronto a compensar suas ineficiências com benefícios arrancados do governo.
O governo Dilma terá de definir até que ponto vai dar prioridade à mobilidade urbana e até que ponto vai continuar a subsidiar a compra de veículos.
Fonte: O Estado de S. Paulo
Celso Ming